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Brasília Online

08/08/2004

Apesar da crise Meirelles, Lula parece pinto no lixo

KENNEDY ALENCAR
Colunista da Folha Online

Em 1997, quando o então presidente dos EUA, Bill Clinton, visitou o Rio de Janeiro, ele subiu o morro da Mangueira. Ensaiou alguns passos de samba, tentou tocar tamborim e cobrou pênalti depois de Pelé pedir para o goleiro não pegar. O compositor Jamelão, lendária figura carioca, disse que Clinton parecia feliz como "pinto no lixo". A comparação sintetizou aquela visita.

Quem falou com Lula nos últimos dias ou acompanhou de perto os passos do presidente afirma que ele está se sentindo exatamente como Clinton no morro da Mangueira. O motivo do bom humor presidencial é a série de recentes notícias positivas na economia.

Registro: há sinais de uma recuperação que ainda precisa se confirmar sustentável e expressiva a ponto de elevar a renda dos trabalhadores, gerar empregos para valer e dar a empresas cenário futuro seguro para investimentos.

No entanto, do ponto de vista político, a recuperação já é suficiente para Lula enxergar uma nova fase em seu governo.

E é papel de um presidente difundir otimismo. Alimentar expectativas positivas fundamentadas contribui para estimular o crescimento, aumentando a confiança dos agentes econômicos, mas exagerá-las é arriscado. Lula já recebeu conselhos para evitar isso. Apesar de o Brasil estar enfrentando bem as dificuldades externas (alta do petróleo, uma eleição americana ainda bastante indefinida), certa cautela é recomendável.




Travessia dura

Quando ganhou a Presidência, no final de outubro de 2002, Lula se preparou para enfrentar dois primeiros anos muito complicados. Então chefe da equipe de transição e futuro ministro da Fazenda, Antonio Palocci Filho, disse ao presidente eleito que a "travessia" seria dura. E apresentou até uma alternativa mais light. Lula preferiu o caminho mais doloroso, habilmente vendido por Palocci como o mais curto.

O ano de 2003 se fez duro para o petista. Mas deixou saudade na comparação com 2004, que tem sido bem mais difícil.

A dureza do ajuste fiscal (corte de gastos no Orçamento federal) e a rigidez da política monetária (juros altos) foram criticadas desde o primeiro dia, da oposição ao próprio PT. Até hoje é questionável a intensidade dessa dureza e rigidez.

Este ano apresentou dificuldades que Lula não esperava. Janeiro foi gasto numa lenta reforma ministerial. Em fevereiro, explodiu o caso Waldomiro Diniz. Março foi o mês da intensa repercussão do mais grave caso de corrupção de um membro importante do governo. O "abril vermelho" entrou maio adentro. Em junho, começaram a pipocar alguns sinais positivos na economia. No mês de julho, eles aumentaram.

Apesar de agosto estar sendo o mês da crise dos presidentes do Banco Central, Henrique Meirelles, e do Banco do Brasil, Cássio Casseb, bons resultados da economia têm deixado as notícias negativas em segundo plano. Fora um dia ou outro, o mercado se abalou pouco.

A sensação de que a economia lhe dá uma blindagem para começar a superar um ano difícil, vitaminando de quebra candidaturas petistas nas eleições municipais de 3 de outubro, faz Lula parecer um "pinto no lixo" --expressão de Jamelão agora lembrada por um sagaz interlocutor presidencial.




Pesquisa

Depois de perder popularidade ao longo de pouco mais de 19 meses de mandato, Lula recebeu pesquisas, uma delas sobre São Paulo, mostrando que pode recuperar parte do cacife. Houve melhora, ainda pequena. Coisa em torno de cinco pontos percentuais.

No final de maio deste ano, a reprovação ao presidente na cidade de São Paulo foi a maior já registrada durante o seu governo, revelou pesquisa Datafolha.

De acordo com o Datafolha, 45% julgaram seu desempenho regular e 29% o consideraram ruim ou péssimo. Uma fatia de 25% julgou ótimo ou bom.

Em abril de 2003, os números eram outros: 42% de regular, apenas 12% de ruim ou péssimo e 38% de ótimo ou bom. Que diferença!
Kennedy Alencar, 42, colunista da Folha Online e repórter especial da Folha em Brasília. Escreve para Pensata às sextas e para a coluna Brasília Online, sobre bastidores do poder, aos domingos. É comentarista do telejornal "RedeTVNews", de segunda a sábado às 21h10, e apresentador do programa de entrevistas "É Notícia", aos domingos à meia-noite.

E-mail: kennedy.alencar@grupofolha.com.br

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