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Brasília Online

22/10/2006

A hora de baixar as armas

KENNEDY ALENCAR
Colunista da Folha Online

A última semana da disputa presidencial será naturalmente tensa. O tucano Geraldo Alckmin, em desvantagem nas pesquisas, terá a sua última chance de virar o jogo. E o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, novamente a um passo da recondução, contará os dias para o final da campanha, na esperança de que o dossiegate não ponha tudo a perder.

Haverá dois debates, Record e Globo, muitas entrevistas, comícios, rumores sobre a origem do dinheiro, cobranças da oposição, eventuais novos tropeços do PT.

O segundo turno acontecerá no próximo domingo, dia 29. No dia 30, o Brasil continuará a existir. Seria importante que os políticos, especialmente os do PT e do PSDB, se dedicassem a uma reflexão: É acertado manter o atual clima de guerra ao estilo "judeus x palestinos", no qual o ato de um lado é respondido com outro mais forte, numa escalada que dificulta cada vez mais uma solução?

Faz 16 meses que o país discute escândalos de corrupção. Terminada a eleição, o tema será a prioridade nos próximos anos? Ou será possível discutir avanços concretos na educação, a conveniência e a necessidade de novo ajuste fiscal e políticas mais eficientes de crescimento econômico?

No cenário mais provável, Lula tende a ser reeleito com muita força política --cerca de 60% dos votos válidos. É um tremendo cacife para quem passou o que ele passou.

O presidente poderá se ver tentado a acreditar que foi absolvido pelas urnas. Cometerá um erro. A sua administração terá sido aprovada apesar dos escândalos de corrupção.

Na hipótese menos provável, Alckmin vira o jogo, surpreendendo mais uma vez. Derrotaria um presidente popular. Encontraria um PT ferido, propenso a embarcar em teorias conspiratórias. Talvez até a adotar um viés chavista na oposição.

Nenhum dos dois cenários seria benéfico ao país. Mesmo reeleito com expressiva votação, Lula poderá perder o poder legalmente. Se tiver cometido crime de responsabilidade (impeachment) ou crime eleitoral (nulidade da candidatura), paciência. Que se cumpra a Constituição.

Tampouco será prudente a oposição ignorar a importância da eventual reeleição de Lula no atual contexto. No plano político, seria complicado dar seguimento a processo para apeá-lo do poder baseado em indícios e suspeições. Mas ela terá a obrigação moral de tocar essa empreitada se tiver prova de crime de responsabilidade ou crime eleitoral. É bobagem tachar isso de golpismo.

No entanto, a oposição deverá ter a grandeza, se derrotada, de compreender que não pode ultrapassar os marcos legais para derrubar Lula. Por ora, não há prova de que o presidente tenha praticado crime de responsabilidade ou delito eleitoral.

Para o país, seria muito bom que ambos os lados baixassem suas armas após o próximo domingo. E que tratassem suas desavenças com mais civilidade.

PT e PSDB, os dois partidos políticos que disputam o poder central desde 1994, têm mais características comuns do que diferenças. A política econômica é parecida. O diagnóstico de ações sociais com foco nos mais pobres é comum. E ambas as legendas avaliam ser preciso reduzir a carga tributária e cortar gastos públicos --estes em maior ou menor grau.

Petistas e tucanos deveriam liderar os entendimentos para uma agenda nacional que faça o país avançar social, política e economicamente. Seria um equívoco desprezar a oportunidade que uma eleição naturalmente cria para um acordo assim.
Kennedy Alencar, 42, colunista da Folha Online e repórter especial da Folha em Brasília. Escreve para Pensata às sextas e para a coluna Brasília Online, sobre bastidores do poder, aos domingos. É comentarista do telejornal "RedeTVNews", de segunda a sábado às 21h10, e apresentador do programa de entrevistas "É Notícia", aos domingos à meia-noite.

E-mail: kennedy.alencar@grupofolha.com.br

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