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Brasília Online

24/12/2006

"Delubização" de "aloprados" derrota PF

KENNEDY ALENCAR
Colunista da Folha Online

Apesar da convicção de que Ricardo Berzoini deu a ordem de compra do dossiê contra os tucanos, a PF (Polícia Federal) não conseguiu provar a "culpa subjetiva" do presidente licenciado do PT , segundo as palavras de um dos responsáveis pela investigação.

Em 26 de novembro, este jornalista revelou que os envolvidos na apuração do dossiegate tinham firmado a convicção de que Berzoini ordenara a petistas que comprassem do chefe da máfia das ambulâncias, o empresário Luiz Antonio Vedoin, supostas informações que envolveriam os tucanos e ex-ministros da Saúde José Serra e Barjas Negri no escândalo dos sanguessugas.

Essa convicção era baseada numa série de evidências da investigação. Todas negadas por Berzoini. A Polícia Federal e o Ministério Público Federal haviam recebido relato dando conta de que o presidente do PT fora procurado em agosto pelo deputado federal Carlos Abicalil (PT). O parlamentar petista disse a Berzoini que o governador do Mato Grosso, Blairo Maggi, pagara a Vedoin para que ele acusasse um adversário político. Maggi nega. Abicalil contou ainda que o chefe da máfia das ambulâncias teria informações contra tucanos e sugeriu que a campanha nacional procurasse Vedoin.

O presidente do PT, então coordenador-geral da campanha à reeleição do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, pediu ao seu "núcleo de inteligência", formado então pelos petistas Jorge Lorenzetti, Osvaldo Bargas e Expedito Afonso Veloso, que averiguasse a consistência de eventuais acusações de Vedoin.

A princípio, Bargas e Expedito, que se reuniram com Vedoin, não quiseram pagar pelas informações. Mas acabaram acertando o preço de R$ 2 milhões. A PF apreenderia R$ 1,7 milhão com petistas em 15 de setembro. Esses recursos seriam destinados à quitação do dossiê.

O senador Aloizio Mercadante, então candidato a governador de São Paulo e que agora paga uma conta que não é apenas sua, chegou a hesitar quando Vedoin pediu dinheiro em troca de informação.

Bargas consultou Berzoini antes de levar a cabo a compra. Nesse ponto, surgiu o presidente do PT paulista, Paulo Frateschi, que teria centralizado a arrecadação de recursos para a compra do dossiê. Frateschi também negou participação. De acordo com Bargas, Berzoini teve ciência de um encontro seu com uma revista, com o qual o PT tentou sem sucesso um acordo para a publicação do dossiê Vedoin. O auxiliar disse, porém, que o chefe não sabia do assunto.

Apesar da convicção da PF, a investigação final não reuniu elementos suficientes para a responsabilização penal do presidente do PT. No direito criminal, é preciso provar a "culpa subjetiva". Ou seja, é preciso prova de que o sujeito realmente desejou cometer o crime. No caso, os subordinados não o acusaram.

No dossiegate, houve uma "delubização" dos "aloprados", segundo as palavras de um dos responsáveis pela investigação do caso e que acompanhou toda a apuração em detalhes.

Trocando em miúdos: Lorenzetti, Bargas e Expedito seguiram a mesma estratégia usada no mensalão por Delúbio Soares, ex-tesoureiro do PT. Auxiliares diretos de Berzoini, mataram no peito e não acusaram o chefe.

Agora, a investigação do caso segue para responsabilidade exclusiva do Ministério Público Federal e da Justiça Federal. Será difícil avançar mais do que a da PF, pois a polícia acredita que sem a confissão de um dos "aloprados" dificilmente esclarecerá a origem dos recursos e o mandante da compra. Para a PF, houve uma combinação de versões entre suspeitos para evitar indiciamento criminal deles e de superiores.

Até mesmo um eventual crime de lavagem de dinheiro poderá nunca ser provado. Não é crime carregar o R$ 1,7 milhão. É necessário que um crime anterior para que se configure a lavagem de dinheiro, diz um dos responsáveis pela investigação. Nem Lorenzetti, antes apontado como articulador da compra do dossiê em âmbito nacional pôde ser indiciado penalmente. Apesar de terem dado um susto em Lula, que chegou a pensar que poderia não se reeleger por causa do dossiegate, os "aloprados" e seu chefe escaparam, pelo menos por ora, graças a uma estratégia jurídica e política que limitou a investigação federal.

Conclusão: apesar de seu esforço, a PF não conseguiu elucidar o caso, que poderá continuar a ser uma sombra sobre o segundo mandato de Lula.
Kennedy Alencar, 42, colunista da Folha Online e repórter especial da Folha em Brasília. Escreve para Pensata às sextas e para a coluna Brasília Online, sobre bastidores do poder, aos domingos. É comentarista do telejornal "RedeTVNews", de segunda a sábado às 21h10, e apresentador do programa de entrevistas "É Notícia", aos domingos à meia-noite.

E-mail: kennedy.alencar@grupofolha.com.br

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