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Brasília Online

23/01/2007

Os lados bom e ruim do PAC

KENNEDY ALENCAR
Colunista da Folha Online

Anunciado com pompa em uma cerimônia de muito peso político, na qual estiveram presentes as maiores autoridades da República, o PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) tem medidas positivas e outras negativas. Se cumprirá seu objetivo, só o tempo dirá. Uma primeira análise, porém, recomenda cautela em relação às audaciosas metas apresentadas pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva neste começo de fato do segundo mandato.

Entre as medidas positivas, a de maior destaque foi o teor político do discurso de Lula. O presidente deixou claro que não vai embarcar na onda "chavista" que anda na moda na América Latina.

"Crescer de forma correta é crescer mantendo e ampliando as liberdades civis e os direitos democráticos", disse o presidente logo no início do discurso. Mais à frente, emendou: "A democracia é um ambiente mais saudável para o crescimento. Pouco me interessaria um aumento expressivo do PIB [Produto Interno Bruto, a soma de todas as riquezas geradas no país no período de um ano] se isso implicasse, o mínimo que fosse, redução das liberdades democráticas".

Essa foi a grande novidade do lançamento, já que todas as medidas foram antecipadas em conta-gotas à imprensa. Mais: foi um recado claro para a comunidade internacional de distanciamento e reprovação em relação a Hugo Chávez, o autocrático presidente da Venezuela. Essas palavras deverão render a Lula um reforço da imagem responsável e confiável ao capital internacional que o petista cultivou no primeiro mandato. Uma mensagem política acertada e feita no momento necessário.

A chamada desoneração para investimentos (redução de impostos para determinados setores da economia) é também uma medida positiva. Melhor seria uma redução geral da carga tributária, racionalizando o sistema. No entanto, uma desoneração por setor, como defendem os entusiastas de uma política industrial ativa, estimulará áreas importantes da economia real. Os setores beneficiados, informática e construção civil, entre outros, parecem boas escolhas.

Voltar a priorizar a melhoria do ambiente de negócios, reduzindo burocracia e estabelecendo regras estáveis (marcos regulatórios), é uma decisão sempre bem-vinda.

Também parece acertada a reunião de Fazenda, Planejamento e Casa Civil no grupo gestor dos investimentos de infra-estrutura. No primeiro mandato, a Casa Civil e a Fazenda travaram batalhas. A primeira pedia mais recursos para obras. A segunda freava as liberações. Agora, com os três ministros no grupo gestor, dificilmente faltarão recursos para a conclusão das obras priorizadas no PAC. Lula, portanto, tem grande chance de entregar um razoável pacote de obras. E, obviamente, isso estimulará o crescimento da economia.




Aspectos negativos

O ministro Guido Mantega (Fazenda) criou uma armadilha ao estabelecer expectativas ambiciosas de crescimento do PIB nos próximos quatro anos como precondição para o êxito das chamadas medidas fiscais de longo prazo.

Nesse sentido, a perna fiscal do PAC é manca. Para que as contas públicas não se deteriorem, será necessário que o PIB cresça 4,5% em 2007 e 5% nos próximos três anos. Empresários e políticos presentes à cerimônia de lançamento do pacote foram unânimes ao avaliar que dificilmente a economia crescerá tão vigorosamente como previu o ministro da Fazenda.

Quando fizer as contas, o mercado ficará com uma pulga atrás da orelha em relação à consistência fiscal das contas públicas do Brasil no segundo governo do petista.

Lula optou por fugir de uma problema. Como de costume, escolheu o meio-termo. Se é uma boa notícia que os gastos públicos não terão expansão superior à do crescimento do PIB nos próximos anos, é uma má notícia não enfrentar a questão fiscal com maior vigor.

O presidente fez uma aposta. Acredita que a fórmula de rigor fiscal e monetário do primeiro mandato está esgotada. Queixa-se de que a equipe econômica de Palocci não entregou o crescimento prometido. E avalia que precisa afrouxar levemente as contas públicas para produzir resultados concretos no segundo governo. Como já dito, é uma aposta. Pode dar certo. Pode dar errado.

Resumo da ópera: é bom que Lula tenha apresentado propostas para tentar acelerar o crescimento da economia e que venda otimismo. Seu plano, porém, poderia ser mais consistente do ponto de vista fiscal.




Oportunidade perdida

O discurso lido de Lula teve momentos terríveis, de puro chavão, como "romper barreiras e superar obstáculos", e outros bastante pertinentes, como marcar diferenças com Chávez.

Pena foi o presidente ter perdido uma boa oportunidade de melhorar sua relação com a oposição. Diante de governadores do PSDB que tiveram a delicadeza de comparecer à sua festa política, poderia ter feito de improviso um aceno mais claro e amigável para um entendimento nacional em torno de uma agenda congressual de interesse de todos.




Tem razão

Apesar de ter dito que viu algumas medidas elogiáveis no PAC, Aécio Neves disse que "deve ter sido brincadeira" a inclusão do pacote de criação de 700 vagas de estacionamento no Aeroporto de Confins.

O governador mineiro afirmou que uma avaliação mais profunda sobre o pacote deveria ser feita nos próximos dias. Usou as palavras "cautela" e "muita expectativa" ao responder se julgava que o PAC cumpriria o objetivo de acelerar o crescimento da economia.




Mantega e Dilma

Os dois ministros mais poderosos do segundo mandato cometeram algumas gafes na cerimônia. Guido Mantega (Fazenda) pareceu dar um pito no presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, ao dizer que usava em sua exposição previsão do mercado financeiro de queda dos juros básicos nos próximos anos. "Viu, Meirelles?"

Mantega também não foi elegante ao dizer aos governadores que dependeria da "boa vontade deles" o êxito da implantação do Sistema Público de Escrituração Digital.

Dilma Rousseff (Casa Civil) afirmou que os investimentos em infra-estrutura eram "sobretudo de interesse dos governadores". Ora, não são de interesse de todos?

Aécio lembrava ao final da cerimônia que o governo não consultara os Estados ao definir seus investimentos em infra-estrutura. Se tivesse feito tal "gentileza", os governadores poderiam, argumentou o mineiro, tentar casar os Orçamentos dos Estados com o da União.

Dilma abusou da equivocada visão inaugural que o governo tem a seu respeito. Repetiu algumas vezes "pela primeira vez" no Brasil...

O PAC lembra muito o "Brasil em Ação", plano que o tucano Fernando Henrique Cardoso criou para melhorar a infra-estrutura do país e acelerar o crescimento.
Kennedy Alencar, 42, colunista da Folha Online e repórter especial da Folha em Brasília. Escreve para Pensata às sextas e para a coluna Brasília Online, sobre bastidores do poder, aos domingos. É comentarista do telejornal "RedeTVNews", de segunda a sábado às 21h10, e apresentador do programa de entrevistas "É Notícia", aos domingos à meia-noite.

E-mail: kennedy.alencar@grupofolha.com.br

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