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Brasília Online

04/07/2007

Para Planalto, Renan erra na estratégia

KENNEDY ALENCAR
Colunista da Folha Online

Na avaliação da cúpula do governo, o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), cometeu um grave erro político ao tentar enterrar a investigação no Conselho de Ética da Casa e remetê-la ao STF (Supremo Tribunal Federal). Teria sido melhor, na visão do Palácio do Planalto, que Renan enfrentasse todas as suspeitas no conselho desde o começo de sua crise.

O presidente do Senado tentou uma jogada de altíssimo risco com Leomar Quintanilha (PMDB-TO), senador sob suspeita de desvio de recursos públicos e um apagado sabujo que Renan colocou no comando do conselho com apoio do PT. Quintanilha remeteu o processo do conselho de ética para a Mesa do Senado na esperança de que ela encaminhasse o caso para o STF. Se tomada tal decisão, ela seria submetida a confirmação no plenário do Senado. O peemedebista contava com eventual votação secreta e solidariedade da maioria da Casa para escapar.

Renan sabia que essa estratégia trazia o risco de perda do apoio envergonhado do PSDB, sobretudo do líder do partido na Casa, Arthur Virgílio (AM). E poderia afastar de vez figuras do campo governista, como os senadores Renato Casagrande (PSB-ES) e Eduardo Suplicy (PT-SP). No entanto, se tivesse dado certo, valeria a pena. Desgastado, Renan supôs que conseguiria se arrastar no comando do Senado. Apostaria na lentidão da Justiça e na falta de coragem da maioria dos senadores para afastá-lo do posto.

Como o tiro saiu pela culatra, ele perdeu o suporte do PSDB e de parte da base governista. Sua situação política piorou. Nesse contexto, o Planalto avalia que, se tivesse conduzido tudo no conselho sem apostar em manobras protelatórias, a situação de Renan seria melhor. Mas aí aparece outro nó.

No conselho, Renan já não teria de responder apenas pela ligação com o lobista da empreiteira Mendes Júnior, Cláudio Gontijo, mas também pela documentação sobre suas transações com gado.

Por ora, não há prova de que Renan usou dinheiro do lobista ou da construtora para quitar suas despesas pessoais. Essa suspeita não seria suficiente, com os dados de hoje, para justificar uma cassação. No máximo, resultaria numa advertência pela impropriedade de um presidente de poder recorrer a um lobista.

Já as transações com gado são o calcanhar-de-aquiles de Renan. A perícia inicial da PF (Polícia Federal) apontou furos na documentação que o peemedebista apresentou para justificar que teria renda suficiente a fim de pagar despesas de natureza pessoal. Uma análise mais detida da polícia tende a encontrar verdadeiros rombos nessa documentação.

A partir de agora, a estratégia de sobrevivência do presidente do Senado deverá se concentrar na tentativa de impedir a análise dos documentos das transações com gado. Problema: a "trapalhada Quintanilha" elevou o grau de impaciência do Senado com o seu comandante. Dificilmente, o Conselho de Ética se limitará a analisar a relação de Renan com Gontijo, objeto do requerimento que o PSOL apresentou ao órgão.

Mesmo assim, o Palácio do Planalto acredita que a única chance de salvação de Renan é esclarecer tudo no conselho, sem trapaças no Congresso, sem chicanas na Justiça. Mais: não haverá operação política do governo para salvá-lo. No Planalto, diz-se que a solidariedade de Lula e dos ministros a Renan se dá "no plano da pessoa física".

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Opinião pública e licença

No biorritmo de Brasília, as crises crescem de terça para quinta-feira. Arrefecem na sexta. Ficam mornas até segunda, se o noticiário do final de semana não for "caliente". E voltam a ganhar temperatura na terça.

Assim tem sido no Renangate. No entanto, há uma piora gradual da saúde política do presidente do Senado. Um dos motivos é sua descrença na existência de uma opinião pública no país. Para Renan, existe "opinião publicada" (artigos opinativos e reportagens da imprensa que julga tendenciosas). Está errado.

Se enfrentasse abertamente todos os questionamentos à lisura de seu patrimônio, teria mais chance de sobreviver. Falar em "terceiro turno" das eleições de 2006 soa a desespero. Faz poucos dias Lula esteve com os governadores José Serra (SP) e Aécio Neves (MG), presidenciáveis do PSDB, no maior entrosamento político. Lembrança: Lula, aliados e oposicionistas já acenaram com uma saída honrosa duas semanas atrás: licença da presidência em troca de um pouco de água na fervura _até o DEM topava isso. Renan, porém, não acreditou na sinceridade da articulação. Avaliou que, se abrisse mão de um centímetro de poder, estaria perdido. A amigos tem dito ultimamente que o Senado que assuma o ônus de derrubar um presidente da Casa sem provas de quebra de decoro parlamentar.

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Se correr o bicho pega...

Renan tem presidido as sessões do Senado para mostrar que há normalidade institucional na Casa. Como presidente do Congresso, teria de comandar na semana que vem uma sessão conjunta do Senado e da Câmara para deliberar sobre a LDO (Lei de Diretrizes Orçamentárias) de 2008.

Se presidir a sessão, sofrerá forte ataque dos deputados, o que poderá miná-lo politicamente ainda mais. Se faltar, confessará falta de condição para cumprir suas atribuições.

Kennedy Alencar, 42, colunista da Folha Online e repórter especial da Folha em Brasília. Escreve para Pensata às sextas e para a coluna Brasília Online, sobre bastidores do poder, aos domingos. É comentarista do telejornal "RedeTVNews", de segunda a sábado às 21h10, e apresentador do programa de entrevistas "É Notícia", aos domingos à meia-noite.

E-mail: kennedy.alencar@grupofolha.com.br

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