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Brasília Online

07/10/2007

Lacerda quer acabar com "grampolândia" na Abin

KENNEDY ALENCAR
Colunista da Folha Online

O novo diretor-geral da Abin (Agência Brasileira de Inteligência), Paulo Lacerda, tem um plano para renovar a mentalidade do serviço de informação da Presidência da República. Esse projeto já é de conhecimento do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

Primeiro passo: modificações para acabar com métodos herdados do antigo SNI (Serviço Nacional de Informações), um dos organismos do aparato de repressão da ditadura militar de 1964.

Nesse sentido, são esperadas mudanças nas formas de investigação. Exemplo: combate a grampos ilegais e agentes que se dedicam a serviços "extras" na área de espionagem, a chamada "grampolândia".

A idéia é repetir um pouco o trabalho feito na Polícia Federal ao longo do primeiro mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, quando Lacerda dirigia a PF e o ministro da Justiça era o advogado Márcio Thomaz Bastos.

Em conversas reservadas, Lula se queixa da pouca inteligência dos serviços de inteligência do governo. Está insatisfeito com o trabalho da Abin. Acredita que é hora de uma renovação não só de nomes, mas de métodos.

Na tarde de 13 de julho, na abertura dos Jogos Pan-Americanos, Lula foi vaiado. Tempos depois, o presidente foi informado de que a Abin mapeara suposto plano para vaiar o petista. Esse plano, de acordo com o apurado pela Abin, teria sido elaborado por grupos que foram ao evento a convite da Prefeitura do Rio, comandada pelo oposicionista César Maia (DEM).

Maia nega ter armado contra o presidente. Mas é fato que a Abin produziu um relatório nesse sentido e ele não chegou ao conhecimento do presidente. Esse episódio foi decisivo para Lula decidir mudar a direção da Abin.

É positivo o saldo da gestão de Lacerda na Polícia Federal. Se ele conseguir reformar a Abin, prestará um serviço ao país.

É importante focar em investigações científicas, com grupos de profissionais das mais diversas áreas do conhecimento, do meio ambiente à economia e da política à matemática, por exemplo.

Em 2005, quando estava na PF, Lacerda apresentou a Lula algumas sugestões para melhorar a Abin. Ele, que assumirá nesta semana o cargo, tem agora um plano mais ambicioso. A conferir.

*

Muito barulho

A decisão do STF (Supremo Tribunal Federal) de restringir a possibilidade de troca-troca partidário tem mais aspectos negativos do que positivos. Como princípio, a fidelidade partidária é boa.

Nesse sentido, reafirmar o princípio gera efeito positivo, pois inibe mudanças partidárias escandalosas.

Mas a decisão do Supremo ficou num improdutivo meio-termo. Na prática, deve punir poucos políticos que trocaram de partido. A decisão prevê exceções para a mudança de sigla: hipóteses de perseguição política ou de infidelidade da legenda ao seu próprio programa. Os partidos que perderam filiados devem fazer reclamação ao TSE (Tribunal Superior Eleitoral), e o processo pode demorar mais de um ano.

Há ainda a possibilidade de injustiças serem cometidas. Um parlamentar que não sofra perseguição política e que integre um partido que se mantenha fiel ao seu programa pode ter justificativas razoáveis para querer mudar de legenda.

Situações concretas que fujam ao tradicional figurino do político malandro que migra em busca de vantagens pessoais podem ser pensadas às dezenas. E caberá ao TSE decidir caso a caso.

Desde 1989, há decisões do Supremo que permitiam a farra partidária. A reforma política é um tema debatido por mais de uma década no Congresso. Esse assunto deveria ser da alçada do Legislativo, mas a sua omissão levou o TSE e o STF a fazer o serviço por deputados e senadores. Na quinta-feira (04/10), foi tomada uma decisão sobre um aspecto de nossas mazelas políticas.

Mas o ideal seria o Congresso realizar uma reforma política mais ampla antes que a Justiça realize por ele. Essa reforma deveria incluir mudanças que democratizassem os partidos (prévias, por exemplo, para escolha de candidatos a cargos majoritários). Deveria avaliar a pertinência do voto em lista, do sistema distrital misto e do financiamento público.

O ideal seria um pacote de regras que começasse a valer a partir das próximas eleições. Se não há tempo para fazer a reforma até os pleitos municipais do ano que vem, que se mire nas eleições de 2010.

*

Armadilha?

Há um aspecto que parece negativo a respeito da decisão do Supremo e para o qual as legendas que provocaram a decisão, PSDB, DEM e PPS, parecem não estar atentas. Esses partidos, de oposição hoje, apresentaram consulta ao TSE. E o caso foi parar no STF para palavra final.

PSDB, DEM e PPS correm o risco de ver o feitiço se voltar contra o feiticeiro.

A Constituição de 1988 nos legou um presidencialismo meio parlamentarista. O partido que elege o presidente não elege maioria no Congresso, algo essencial para governar.

O presidente eleito monta, então, uma operação para garantir sua governabilidade. No Brasil, tem sido assim: a coalizão governista reúne os partidos que elegeram o presidente e legendas fisiológicas que apóiam o poderoso de plantão. Na outra ponta, ficam os partidos que perderam a eleição presidencial e que, normalmente, vêem quadros seus migrarem para a coalizão governista.

A decisão do STF terá pouco efeito sobre o governo Lula. A coalizão lulista já está formatada. No entanto, o próximo presidente conviverá com uma realidade mais adversa para montar sua base de sustentação congressual caso não haja uma reforma política.

Lembrança: o tucano José Serra, governador de São Paulo e presidenciável mais bem posicionado nas pesquisas sobre a sucessão de 2010, aposta numa aliança com DEM e PPS para conquistar o Palácio do Planalto. Se for eleito, terá de lidar com outra realidade na hora de montar a coalizão congressual.

Kennedy Alencar, 42, colunista da Folha Online e repórter especial da Folha em Brasília. Escreve para Pensata às sextas e para a coluna Brasília Online, sobre bastidores do poder, aos domingos. É comentarista do telejornal "RedeTVNews", de segunda a sábado às 21h10, e apresentador do programa de entrevistas "É Notícia", aos domingos à meia-noite.

E-mail: kennedy.alencar@grupofolha.com.br

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