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Brasília Online

30/01/2005

Lula, FHC e a "urucubaca" dos juros

KENNEDY ALENCAR
Colunista da Folha Online

Não acho que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva esteja fazendo um governo ruim. Pelo contrário. Feita a ressalva, convém examinar atitudes recentes do presidente da República que despertam preocupação.

A primeira delas é a versão difundida em Brasília de que Lula divide seus ministros em dois grupos: os que só apresentam problemas, o que ele detesta, e aqueles que trazem o problema com a solução, o que ele adora.

Isso preocupa porque lidar com problemas é a principal tarefa de um presidente da República. Impaciência em relação a quem só traz problemas demonstra certa intolerância em lidar com a vida real, cheia de dificuldades.

Esse negócio de ministro chegar com problema e solução ao mesmo tempo cheira a conversa de auxiliar esperto que diz que providenciou tudo e que o chefe não precisa mais queimar neurônios com aquele assunto chato.

No meio dessas soluções, tremo só de imaginar o que deve passar de contrabando de alguns lobbies, basta ver como o presidente é surpreendido vez ou outra por decisões incluídas em suas medidas provisórias.




"Urucubaca" x "fracassomaníacos"

Nas duas últimas semanas, o presidente adotou um comportamento extremamente defensivo ao partir para o ataque. Não economizou expressões como "urucubaca" e "madonas choronas" para dizer que seus críticos, na verdade, torcem contra ele e o país.

Em primeiro lugar, torcida é torcida. O PT e Lula torceram muito contra outras forças políticas. É democrático, até mesmo se contrária ao país --o que acredito seja uma torcida daquelas que cabem num Fusquinha.

Ao tentar desqualificar críticos e críticas, Lula repete um comportamento típico de presidentes que consideram estar certíssimos enquanto o resto da humanidade não enxerga um palmo à frente do nariz.

O tucano Fernando Henrique Cardoso, por exemplo, cansou de tachar de "neobobos" e de "fracassomaníacos" os que ousavam apontar o irrealismo de sua política cambial sobrevalorizada. Deu no que deu, naquela megadesvalorização do real no início de 1999.

Embevecido com o resultado de sua política econômica, correta e necessária por um determinado período, FHC se tornou prisioneiro dela. Lula corre o mesmo risco em relação à sua política econômica. Se ela deu certo até agora, vai continuar dando certo, reza uma certa lógica de botequim.

O rigor fiscal e monetário do ministro Antonio Palocci Filho (Fazenda) foi aplicado porque Lula dizia que encontrou o país na UTI. Ora, se o país saiu da UTI como fala agora o presidente, por que continuar com o mesmo tratamento médico? Pelo menos a dosagem não deveria ser alterada?




Feitiço econômico

Na quinta-feira (27/01), o Banco Central divulgou uma ata sobre taxa de juros de assustar o conde Drácula --aquele que gosta de sangue quase tanto como Wall Street. De acordo com o BC, novas elevações virão, e os juros permanecerão altos por "um período suficientemente longo". Quem vai pagar o pato será a economia real, aquela que o governo diz estar às mil maravilhas.

Quer saber? Acho que Lula tem certa razão. Fizeram alguma urucubaca brava lá no Banco Central.
Kennedy Alencar, 42, colunista da Folha Online e repórter especial da Folha em Brasília. Escreve para Pensata às sextas e para a coluna Brasília Online, sobre bastidores do poder, aos domingos. É comentarista do telejornal "RedeTVNews", de segunda a sábado às 21h10, e apresentador do programa de entrevistas "É Notícia", aos domingos à meia-noite.

E-mail: kennedy.alencar@grupofolha.com.br

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