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Brasília Online

27/02/2005

Severino vai com muita sede ao pote

KENNEDY ALENCAR
Colunista da Folha Online

Se fosse um bobo ou um político inexperiente, Severino Cavalcanti (PP-PE) não teria chegado à presidência da Câmara. Mas fisiológico, conservador e atrasado Severino é. Isso não é preconceito da imprensa, como tem reclamado o presidente da Câmara, seus familiares e aliados políticos. São conceitos constatados no acompanhamento de sua longa carreira política.

Severino, porém, tem demonstrado outra característica preocupante, a falta de compreensão de que ocupa posição institucional importante na república e não mais a liderança corporativa de parlamentares que sempre se sentiram alijados do poder real no Legislativo.

Quando o governador do Rio Grande do Sul, Germano Rigotto (PMDB-RS), fez polidamente um pedido para que Severino reconsiderasse a conveniência de aprovar o projeto de aumento do salário dos deputados federais, pelo efeito dominó nas finanças dos Estados, o presidente da Câmara reagiu assim: "É problema do Rio Grande do Sul".

Ora, um problema do Rio Grande do Sul é também um problema do presidente da Câmara dos Deputados. Dizer que a sociedade aprova o aumento dos deputados, uma indecente elevação de 67%, é mentir descaradamente.

Na semana passada, não fosse a desastrada declaração do presidente Luiz Inácio Lula da Silva sobre corrupção no governo FHC, o assunto principal do país seria a repercussão da eventual aprovação do projeto que eleva o teto do funcionalismo público federal para R$ 21.500. Em reportagem na Folha, Ranier Bragon revelou que tal medida podia gerar, no mínimo, um gasto extra anual de R$ 1,44 bilhão para as finanças da União, Estados e municípios.

O efeito dominó é, sim, um problema de Severino. Ignorá-lo será um erro. Quem vai com muita sede ao pote corre o risco de quebrá-lo.




Reação nacional

Governadores e prefeitos deram início a uma articulação com o governo federal e o Senado para tentar barrar a proposta de Severino, curiosamente também encampada pelo presidente do STF (Supremo Tribunal Federal), Nelson Jobim. O aumento dos deputados seria também o dos ministros do STF, todos ganhando R$ 21.500 por mês.

Aécio Neves (PSDB-MG), governador de Minas, já conversou por telefone com os ministros Antonio Palocci Filho (Fazenda) e Aldo Rebelo (Coordenação Política), dizendo-se preocupado com a eventual aprovação do aumento do teto salarial do funcionalismo público federal. Aécio acha que toda a economia obtida com a reforma previdenciária feita em 2003 pode ser perdida.

"Esse projeto traz um efeito cascata que vai arrebentar as finanças dos Estados. Há vinculações de carreiras de servidores estaduais, como desembargadores e membros do Ministério Público, ao valor pago aos ministros do Supremo", alertou o governador mineiro.

O prefeito de Aracaju, Marcelo Déda (PT-SE), também fez uma lúcida advertência: "Acenderão um rastilho de pólvora em Brasília que vai explodir as finanças dos Estados e municípios do Brasil".

Com uma articulação política e a reação negativa da opinião pública, há chance de o projeto não passar na Câmara. Ainda que passe, no Senado tende a ser derrubado. E Severino não poderá dizer que foi por preconceito. Se disser, será apenas um problema dele.
Kennedy Alencar, 42, colunista da Folha Online e repórter especial da Folha em Brasília. Escreve para Pensata às sextas e para a coluna Brasília Online, sobre bastidores do poder, aos domingos. É comentarista do telejornal "RedeTVNews", de segunda a sábado às 21h10, e apresentador do programa de entrevistas "É Notícia", aos domingos à meia-noite.

E-mail: kennedy.alencar@grupofolha.com.br

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