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Brasília Online

27/08/2005

Para Lula, só economia pode salvá-lo

KENNEDY ALENCAR
Colunista da Folha Online

Quando o "fator Buratti" abalou para valer Antonio Palocci Filho, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva não hesitou um segundo quando lhe propuseram uma eventual substituição: respondeu que, se tirasse o atual ministro da Fazenda do cargo, seu governo acabaria.

Foi, digamos assim, um episódio para amarrá-lo de vez aos resultados da política econômica. Ironia do destino, o presidente acha que só poderá ser salvo por uma política com a qual convive mal.

Nesse contexto, não seria surpresa o aprofundamento do rigor fiscal, com uma elevação da meta de superávit primário deste ano de 4,25% para 5% do PIB (Produto Interno Bruto). O superávit primário é a economia de todo o setor público para pagar os juros de sua dívida.

Essa meta é o pilar da política econômica. Com ela, o governo sinaliza aos investidores que, faça sol ou chova canivete, o Brasil continuará a honrar os seus compromissos externos. Isso explica a proteção que a economia tem obtido mesmo num quadro de grave crise política.

De janeiro a julho deste ano, o superávit primário acumulado ficou em 6,27% do PIB. Uma monstruosidade que se explica pelos obstáculos que a equipe econômica impõe para liberar recursos, mas também pela ineficiência de muitos ministros.

Reservadamente, a equipe econômica já busca um superávit de 5%. Não se esforçará muito fazê-lo na prática. No segundo semestre, a chamada execução orçamentária sempre se acelera. No entanto, com 6,27% de superávit acumulado até julho, não haverá torneira aberta que o faça chegar à meta de 4,25% até o final de dezembro. E torneira aberta não é com Palocci.

A oficialização de uma elevação do superávit primário neste ano poderia ajudar o governo a trabalhar para que o Banco Central reduza mais rapidamente a taxa de juros. Esse movimento foi tentado, sem sucesso, em 2004.

No ano passado, Palocci convenceu Lula a aumentar a meta de superávit de 4,25% para 4,5% do PIB. Argumentou que ajudaria a evitar uma elevação maior dos juros. Isso não aconteceu. Naquele momento, o BC já dava sinais de que seu movimento seria de alta e não de manutenção da taxa num patamar mais baixo.

Agora, avaliam Palocci e alguns aliados no governo, haveria condições para dar certo a operação que fracassou em 2004. O Banco Central já sinalizou que deverá começar a baixar os juros em setembro. A taxa básica de juros da economia, a Selic, que é fixada mensalmente pelo Banco Central, está em 19,75% ao ano desde maio.

Uma elevação do superávit primário para 5% viria num momento favorável para o BC diminuir os juros sem pressão política. Mais: tal medida poderia facilitar a esperada retomada do crescimento na virada deste ano para o próximo num ritmo muito forte.

Na avaliação de Lula, se não ficar provado nada contra ele ou Palocci nas três CPIs que enfrentam, se houver uma expansão da economia que possa ser sentida de verdade pelas pessoas e se puder entregar um pacote de obras significativo em 2006, ele poderá voltar a sonhar com a reeleição.

Do contrário, sabe que isso será muito difícil, como revelam as últimas pesquisas. Os levantamentos mostraram que ele não seria reeleito se a eleição fosse hoje. Perderia para o tucano José Serra, prefeito de São Paulo.

Uma candidatura Lula num cenário pessimista para o governo só se justificaria para tentar manter o PT vivo, pois ele ainda é o petista com melhor desempenho nas pesquisas, e para defender os números de sua administração.

Esse é o resumo das análises que Lula fez nos últimos dias sobre a sucessão presidencial, que acontecerá daqui a 14 meses --o primeiro turno será exatamente no dia 1° de outubro do ano que vem.
Kennedy Alencar, 42, colunista da Folha Online e repórter especial da Folha em Brasília. Escreve para Pensata às sextas e para a coluna Brasília Online, sobre bastidores do poder, aos domingos. É comentarista do telejornal "RedeTVNews", de segunda a sábado às 21h10, e apresentador do programa de entrevistas "É Notícia", aos domingos à meia-noite.

E-mail: kennedy.alencar@grupofolha.com.br

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