Colunas

Diário, Depressão e Fama

30/05/2005

Avisos aos que navegam para Diário, Depressão e Fama

HERMELINO NEDER
Colaboração para a Folha Online

Depois de dois meses escrevendo a coluna Diário, Depressão e Fama, entendi algumas características de seu veículo digital, a Folha Online. E que a relação estabelecida por uma coluna envolve três partes, os leitores, o autor e o jornal; e o jornal não é um mero veículo, inanimado, mas, sim, construído, conservado, perturbado e reparado por pessoas. Sempre demoro para entender o óbvio. Mas divido aqui, com as outras duas partes, leitores e jornal, minhas percepções sobre essa relação triangular.

Quando a oportunidade da coluna surgiu, considerei "menor" escrever para a Folha Online, em vez de para a Folha de papel. Fui mudando de idéia à medida que entendia as diferenças entre o jornal digital e o convencional:

1. O jornal digital oferece link imediato entre leitor e colunista. O leitor acaba de ler e pode, num click, no mesmo lance, mandar uma mensagem para o colunista. No jornal de papel, a conexão precisa bem mais do que um lance. Levantar do lugar, ligar o computador, copiar o e-mail do colunista, escrever. Um deprimido poderia parar no meio do caminho. Eu só receberia mensagens de leitores cheios de energia, e os deprimidos me interessam.

2. O leitor pode mandar a coluna para outro leitor, também muito praticamente.

3. O jornal digital armazena as colunas anteriores. Isso é utilíssimo para quem não quer cansar os leitores com textos longos, pois o autor pode dividi-los em partes e remeter a elas por meio do botão no final do texto. No jornal de papel, sempre me incomodaram os artigos em duas ou mais partes. Se tinha perdido a primeira, a coisa ficava sem graça. Além disso, quando há algum problema, como a não atualização da coluna (quando a Online "esquece" de avisar que há texto novo), ainda posso despertar interesse para o texto esquecido num próximo artigo. Enfim, os textos "conversam" entre si, como capítulos de um livro bem articulado.

4. Brasileiros que moram em outras partes do mundo lêem a coluna.

5. E ainda posso linkar músicas. Para um compositor e professor de música, esse é um recurso inestimável.

São diferenças que apontam para a criação de vínculos.

Leitores reclamam quando não encontram a coluna na segunda-feira. Isso me gratifica, pois me sinto importante para eles. Eu também ficava ansioso por a coluna atrasar ou não ser anunciada no padrão da Folha Online (em Canais da página principal, e em Colunistas, nos canais Ilustrada e Equilíbrio). Atualmente, estou mais tranqüilo com isso; meu editor me explicou que colunas são matéria fria, diferente do material quente das noticias, que têm prioridade e prazo de validade. E as colunas ficam armazenadas no site, podem ser lidas na terça, quarta etc.

Minha mulher e um leitor assíduo (Guilherme, grande comentador de colunas) descobriram um jeito criativo de localizar textos novos. Eles entram na coluna "velha" em Ilustrada ou Equilíbrio e procuram em Colunas Anteriores. Se o texto novo já foi inserido no site, eles o encontram ao lado dos antigos, mesmo que não tenha sido anunciado. Parece brincadeira: quer ler o texto novo? Procure nos antigos. Mas funciona.

Dividir minhas percepções sobre o veículo online realiza, em parte, a vocação de diário e blog da coluna. Tanto quanto fazer circular mensagens de leitores, como nas colunas anteriores "O que você me diz". Falando em blog, a colunista Cláudia Collucci (Equilíbrio) despediu-se na semana passada de sua coluna e anunciou que pilotará um blog, fora da online. Não poderia ser dentro? Talvez esta seja uma possibilidade ou uma tendência para jornais online: abrigar blogs. A troca pode ser interessante para o jornal, que interagiria em tempo real com leitores, e para os colunistas, pela chancela do jornal. Afinal, é difícil se fazer visível no oceano de blogs individuais. E a empresa Folha poderia experimentar, como num laboratório, as colunas-blog da online, justamente por serem meio fora de padrão, influenciadas e condicionadas pelo tempo real, pela dinâmica blog e pelo armazenamento.

Gastei oito anos numa caverna acadêmica (da qual saí doutor; devagar se vai longe). Eu não atinava, mas estava com fome de contato com o público, o qual tinha experimentado na época de minha banda Football Music. Quando a coluna estreou, senti-me entusiasmado, "faminto", como Bob Woodward e Carl Bernstein no início de suas carreiras (ver no filmão "Todos os homens do presidente").

As mensagens de leitores sobre a coluna passada, "Que doença triste é a depressão", me fizeram reconsiderar minha falta de vontade de coordenar um blog em que deprimidos pudessem trocar experiências, chorar pitangas e contar piadas (deprimido adora piada). As mensagens são tão bacanas e emocionantes, que talvez as edite num novo "O que você me diz". Num blog, seria legal contar com especialistas, para não ficar no disse-que-disse. Ainda preciso me consultar para ver se tenho energia para tanto.

Uma leitora estranhou que eu apareça rindo na foto aí embaixo. Ué, deprimido não ri? Na próxima coluna, vou contar uma piada.
Hermelino Neder é compositor e professor de música. Venceu vários prêmios nacionais e internacionais por suas trilhas sonoras para cinema. É doutor em Comunicação e Semiótica pela PUC/SP. Tem canções gravadas por Cássia Eller e Arrigo Barnabé, entre outros.

E-mail: nederman@that.com.br

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