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Diário, Depressão e Fama

22/08/2005

Lula é sub

"Você é deprimido porque é feio, jovem. Que neurotransmissores (endorfinas, serotoninas etc.) que nada! Seu problema é feiura. E se além de horroroso ainda tiver mau hálito e caspa ... Além de feio é burro, mistura alhos com bugalhos ... Vai se tratar, assombração ... LULINHA 2006, LULINHA 2006 FOREVER ... sorry, feioso, vá procurar quem lhe ame." (JGSN)

Esse não foi o único leitor indignado com a última coluna, mas sua mensagem foi a mais sincera e singela, como a resposta de uma criança, que não podendo argumentar, expõe a emoção. Outros leitores contra-atacaram mais racionalmente.

"Talvez a falta de educação neste país seja mais grave no caso de pessoas com curso superior, capazes de defender posições um pouco curiosas (e um tanto perigosas) como a sua, sobre o problema de se ter um presidente semi-analfabeto. Sugiro-lhe com entusiasmo cursos de antropologia, lingüística e outras mais que possam ajudar num dos aprendizados mais difíceis de nossa civilização, a superação dos milhares de preconceitos que abundam entre as pessoas." (JP)

Esse outro leitor, que contesta minha suposta tese de que "o fracasso de um governo tem a ver com o grau de educação do estadista", sugere que eu me eduque mais. O melhor remédio para um colunista prevenir-se de defender teses curiosas e perigosas, segundo ele, seria estudar muito. Mas um presidente, para governar um país, não precisaria disso.

Embora eu não tenha defendido tal tese, assim como não comparei Lula com FHC, o argumento mais usado pelos defensores de Lula é que o governo do diplomado FHC também foi um fracasso. Entretanto, parece que para os defensores petistas, como para Lula, FHC se tornou finalmente uma referência positiva. Pela campanha petista, eu tinha entendido que FHC era uma referência negativa, ou seja, Lula faria tudo diferente dele. No entanto, hoje, diante de qualquer crítica, petistas respondem automaticamente que FHC também fez assim ou até pior. Há uma falta de lógica nisso, além do simples senso comum de que um erro não justifica outro: FHC, que não servia como modelo para o bem, serve agora para justificar o mal. Ou talvez haja esta lógica: FHC é bom, se ele fez, eu também posso fazer.

A tese que defendi explicitamente foi a de que o fracasso de Lula servirá como elogio à educação, justamente porque ele alardeou sua própria falta de educação formal. Mas havia realmente algo de não dito no texto que pode induzir à relação entre falta de formação do presidente e seu fracasso. Um leitor me alertou para isso com a observação: "fiquei com a sensação do 'não-dito'."(JD)

Eu deveria ter dito que o discurso mal formado de Lula me serviu como um alerta, um sintoma pelo qual vi o problema maior, o de que ele é uma pessoa subdesenvolvida. Eu me orgulho de ter intuído isso na eleições. Não votei nele (embora o tenha feito contra Collor) pelo mesmo motivo pelo qual não me casaria com uma mulher que se expressasse como ele, ou pelo qual faria objeções a que minha filha se casasse com alguém que falasse como ele. Se prezo meu país, não vou por na presidência alguém que eu não poria na minha casa. Seu discurso, entre outros sintomas, revela essa falta de desenvolvimento pessoal, mais grave que falta de cultura.

Estes outros sintomas:

- O gosto, o prazer em culpar o outro e a crença de que a culpa é realmente do outro;

- O tom que ele usa para culpar o outro;

- O desgosto extremo em assumir seus erros;

- O tom, bem mais baixo, que ele usa quando, obrigado, assume (nunca individualmente) erros;

- A onipotência e a arrogância em crer-se o sal da terra. É aqui que o provérbio "o semi-analfabeto é pior que o analfabeto" se aplica à perfeição. Um semi-analfabeto se acha;

- A distância entre o discurso e a prática. Lula prometeu ética como ninguém prometera e seu governo é o mais porcalhão da história. Isso eu não previ. Quem poderia?

- A necessidade de ter uma ideologia.

Se Deus quiser, na semana que vem, não necessitarei mais tratar desse assunto. Necessidade interna mesmo (não condicionada por leitores) de escrever "Lula é sub 2", 3, 4 etc. Embora muitos tenham manifestado apoio, já há quem dê toques: "ai, Neder, vira o disco, tá caindo no vazio, seus argumentos estão pobres em relação aos fatos, é melhor escrever sobre as conseqüências que desabarão sobre nossas cabeças ou sobre as mesmices políticas ou sobre a mentira do que fazer julgamentos tolos a respeito do Lula, das suas amigas, sogra etc. Vamos ser mais amplos e menos rasos. Francamente, amigo." (F).

OK, me deixe pelo menos finalizar como comecei, com uma mensagem engraçada.

"Na minha cidade, Itaúna, Minas Gerais, as eleições do ano passado tiveram um resultado espantoso. Eram apenas dois candidatos. Um do PL, médico, segunda tentativa de se eleger prefeito. Um cara bom, conhecido na cidade por nunca deixar de atender ninguém por causa de dinheiro. O segundo, semi-alfabetizado, do PT, Eugênio Pinto. O sobrenome Pinto deu-lhe muitos votos porque uma Kombi começou a gritar pela cidade 'ajuda o Pinto entrar, gente', 'o Pinto tá entrando', 'O Pinto tá crescendo'... coisas do nível. Acredita que ele venceu e venceu muito bem?" (G)

Acredito. Mas a gente merece? A gente é tudo sub?

Eu sou feio?

Que depressão!
Hermelino Neder é compositor e professor de música. Venceu vários prêmios nacionais e internacionais por suas trilhas sonoras para cinema. É doutor em Comunicação e Semiótica pela PUC/SP. Tem canções gravadas por Cássia Eller e Arrigo Barnabé, entre outros.

E-mail: nederman@that.com.br

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