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Futebol & Cia.

22/08/2002

Imbróglio à italiana

MÁRCIO SENNE DE MORAES
Colunista da Folha Online

Para quem acha que, no quesito organização, o futebol brasileiro está no fundo do poço, eis uma historinha interessante sobre baderna no "calcio", que me contou o amigo Massimo Gentile, italiano, torcedor da Roma e editor de arte da Folha.

Até o momento em que escrevo estas linhas, está decidido que o Campeonato Italiano começará com duas semanas de atraso por conta de uma disputa que envolve os direitos de transmissão dos jogos pela televisão.

Acontece que os clubes considerados pequenos crêem que a proposta da RAI não lhes dê o que é de direito. Segundo a proposta, Juventus, Milan, Inter de Milão e Roma deverão ser as equipes mais bem pagas porque atraem mais público.

Ora, seguindo uma lógica exclusivamente mercadológica e levando em conta a "nova realidade" do futebol mundial (que, salvo exceções, não permite mais gastos descabidos), os dirigentes da rede estatal de TV estariam com a razão nessa queda-de-braço.

Todavia, como me explicou o amigo italiano, o buraco é mais embaixo. A Itália é governada por Silvio Berlusconi, um magnata da mídia que, entre outras coisas, controla a equipe do Milan. Mas, como é primeiro-ministro, ele foi obrigado a colocar um testa-de-ferro na presidência do clube milanês.

O títere, chamado Adriano Galliani, logo foi catapultado ao posto de presidente da Fedecalcio, a federação italiana de futebol. Nessa condição, é o responsável pela negociação com as TVs. Oito equipes continuam sem contrato e, ante os ainda altos custos do futebol atual, correm sério risco.

A rede estatal de TV também é controlada por um próximo de Berlusconi, que alega que a televisão não pode mais bancar os caprichos de jogadores caríssimos, como Ronaldo e Vieri. Assim, quer reduzir em 42% o que paga pela transmissão dos jogos.

Mais uma vez, do ponto de vista mercadológico, os dirigentes da RAI têm razão. O único problema é que ainda há a Mediaset nessa história. Trata-se do maior grupo de mídia privado italiano, que, como por encanto, também pertence a Berlusconi.

Como o grupo não tem como pagar as altas quantias que a TV estatal pagava, nada melhor do que "moralizar" os gastos da concorrente, buscando diminuir os custos das redes de televisão. Com um títere no controle da TV estatal e com um aliado político no comando do Ministério das Comunicações, a tarefa não foi muito difícil para Berlusconi.

Para completar essa ópera-bufa, não podemos esquecer que o "faça o que eu digo, mas não faça o que eu faço" também tem seu lugar no imbróglio. Afinal, embora os aliados de Berlusconi que controlam a RAI aleguem que não podem bancar os salários estratosféricos dos jogadores, o Milan acaba de contratar Rivaldo por valores altíssimos.

O resumo da ópera seria mais ou menos assim: Ricardo Teixeira (ou Eurico Miranda ou Ciro Gomes!) seria presidente da República e proprietário da Rede Globo, colocaria um testa-de-ferro na CBF, outro no Ministério das Comunicações e, finalmente, faria de sua equipe de predileção a maior favorecida.

É verdade que não parece fácil de entender, mas quem disse que um embrulho desses é algo simples? Enquanto isso, os tifosi têm de esperar duas semanas suplementares antes do início do Italiano.

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Em alta
O jovem meia Kaká, do São Paulo. Ainda é cedo para dizer que se trata de um craque completo, porém contra fatos não há argumentos. Com ele chamando o jogo e criando jogadas, o time do Morumbi venceu as três primeiras partidas do Brasileiro. Sem ele, mostrou-se pouco criativo e perdeu para o Juventude em casa.
Em baixa
O que acontece com Romário fora do Maracanã? No maior "templo do futebol", o atacante só falta fazer chover, marcando gols e decidindo partidas. Quando o Fluminense joga fora de casa, ele não pega na bola. Foi assim na derrota para o São Caetano na última semana e no empate contra o Atlético-MG ontem.

No mundo
Destaque para a ressaca da Copa do Mundo. Ela fez com que algumas das maiores seleções do planeta apresentassem um futebolzinho deplorável ontem. O Brasil perdeu para o Paraguai. A Alemanha empatou com a Bulgária; a França, com a Tunísia. A Espanha também tropeçou, e a Itália perdeu em casa para a Eslovênia.
Nos EUA
Destaque para os preparativos para o US Open de tênis, que começa na semana que vem. Guga pegou uma chave duríssima e enfrenta o francês Julien Boutter na primeira rodada. Se passar, pode pegar Marat Safin na segunda rodada. Entre os favoritos ao título estão o incansável Andre Agassi e o australiano Lleyton Hewitt.

Márcio Senne de Moraes é formado em administração de empresas, pós-graduado em ciência política pelo Instituto de Estudos Políticos de Paris, redator e analista do caderno Mundo da Folha de São Paulo e escreve para a Folha Online às quintas-feiras

E-mail: futebolecia@folha.com.br

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