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Futebol na Rede

28/08/2006

Vida de jogador: o contundido

HUMBERTO PERON
Colaboração para a Folha Online

Não existe nada pior para um jogador que uma contusão séria. Além de elas acontecerem, geralmente, nos momentos em que o jogador vive um excelente momento, todos os atletas ficam extremamente preocupados, apesar de todo avanço da medicina esportiva, se vão voltar a ter a mesmo rendimento de antes da parada. Todos sabem que uma contusão que deixa o atleta por longo tempo afastado marca definitivamente a carreira dele.

Sempre haverá a desconfiança de companheiros, torcida e imprensa sobre as condições do recuperado e, em cada transferência, ele sabe que deverá passar por uma interminável série de testes físicos, para provar sua total recuperação. Além do temor de ser taxado pelo meio futebolístico de 'bichado'.

A situação é tão aterrorizante para os profissionais, que vou descrever para os leitores de Futebol na Rede uma conversa que tive com um jogador contundido há alguns anos. De muletas, logo após uma séria contusão no joelho, ele olhava para o nada, enquanto seus companheiros treinavam em campo. Fui em sua direção para perguntar como estava sua recuperação, quando separados por uma grade ele começou a falar.

"Você vê, o azar que eu tive. Estava tudo indo muito bem. Em poucos meses saí dos juniores para os profissionais, vinha jogando bem e marcando muito gols. Consegui renovar meu contrato e se continuasse jogando como eu estava com certeza seria convocado para a seleção e, lógico seria vendido para um time da Europa.

Hoje, me recuperando vejo que poderia ter evitado essa situação. O meu problema começou numa pequena torção que eu tive ao pisar em um buraco durante um jogo. Com a seqüência de jogos eu não conseguia fazer o tratamento de maneira adequada. Depois da terceira partida o meu joelho inchou de uma maneira descomunal e eu comecei a sentir várias dores no local. Fui medicado, e na base de muito gelo meu joelho voltou ao normal.

Até que chegou o dia da minha contusão. Os médicos não queriam que jogasse. Como o jogo era no sábado, eu deveria fazer exames mais detalhados na segunda. Mas como o jogo era decisivo, o treinador me pediu para jogar. Eu tentei explicar que os médicos tinham me vetado, mas ele me convenceu a jogar. Na hora pensei em tudo que ele tinha feito por mim e assumi o risco de jogar. Fui para a partida, mas logo aos cinco minutos, ao dominar uma bola e tentar um giro senti uma dor incrível no joelho. Não conseguia ficar de pé.

Lá fui eu para a maca. Fui deixado por alguns minutos no vestiário sozinho. Com uma dor insuportável, olhava para o teto e a única coisa que pensava é que minha carreira tinha terminado. De ambulância me levaram para o hospital, e lá foram feitos alguns exames, mas o diagnóstico só sairia na segunda-feira. Passei um péssimo domingo, parecia que as horas não passavam. O meu corpo estava dolorido, e qualquer movimento fazia eu sentir dor no joelho. O treinador me ligou várias vezes, como me pedindo desculpa por ter pedido para eu jogar. Mas sinceramente, eu não posso culpá-lo de nada. Eu queria jogar. Acho que todo atleta se acha um herói e pensa que pode passar por qualquer dificuldade. Boleiro pensa que é só aquecer que as dores passam.

Na segunda recebi a notícia. Os exames indicaram que eu deveria operar o joelho. Para ser sincero nem sei o que me aconteceu. A única palavra que eu me lembro era ligamento.

Dois dias depois eu já estava na sala de operação. Foi tudo muito rápido, quinze dias de repouso e eu já estava liberado para fazer fisioterapia. Por sorte nesse período pude contar com a minha mãe e meu pai que vieram me ajudar. Se fiquei feliz por voltar ao clube e rever meus companheiros, me sinto triste por não poder estar no campo. Não consigo pensar que nos próximos seis meses, se nada acontecer de errado, estarei aqui sozinho nesta sala de musculação. Vai ser uma rotina longa, sei lá como vou agüentar isso. Mas não posso desistir, futebol e a única coisa que eu sei fazer na vida.

Mas o meu pior pesadelo é não conseguir fazer o que eu realizava antes de me machucar. Já vi muito jogador que nunca voltou a ser o mesmo. Mas espero me recuperar, pois eu sou muito novo para cair no esquecimento e parar de jogar.

Agora deixa eu voltar para a "tortura" (fisioterapia)."


Por sorte o jogador se recuperou. Foram mais de dez meses para recuperação, ele voltou a jogar conseguiu sua transferência para a Europa.

Até a próxima.

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Para a boa campanha de Vasco e Grêmio no Campeonato Brasileiro. Se antes do torneio, muitos achavam que essas equipes brigariam para não cair, atualmente elas se encontram entre os times que conseguiriam vagas na próxima Taça Libertadores. Muito bom o trabalho dos dois treinadores, Mano Menezes (Grêmio) e Renato (Vasco), que estão conseguindo tirar o máximo de seus elencos limitados. No campeonato da Série B vale ressaltar as grandes campanhas de Coritiba e Náutico, que terminaram o primeiro turno da competição nas duas primeiras colocações e surgem como favoritos para conseguirem uma das vagas na principal divisão do Campeonato Brasileiro em 2007. Por outro lado, decepcionam as campanhas de Ceará, Remo e Lusa, que agora só lutam para não cair para a terceira divisão.

Humberto Luiz Peron é jornalista esportivo, especializado na cobertura de futebol, editor da revista "Monet" e colaborador do diário "Lance". Escreve para a
Folha Online às terças-feiras.

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