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Futebol na Rede

25/03/2008

Mais que rivais

HUMBERTO PERON
Colaboração para a Folha Online

No futebol, a rivalidade é saudável. Os grandes times do planeta não seriam tão fortes se a cada dia não pensassem em armar elencos fortes para bater nos seus rivais. O Internacional não seria tão forte se não existisse o Grêmio. E vice-versa. O mesmo acontece com Atlético-MG e Cruzeiro, em Minas Gerais, e os grandes do Rio de Janeiro e São Paulo. Ou em qualquer parte do planeta.

Mas a relação entre Palmeiras e São Paulo, não é de rivalidade. Os dois times são inimigos. E essa inimizade não está apenas em brigas de diretoria ou entre torcedores (cada vez mais violentas e não restritas apenas a dias de jogos, mas em confrontos marcados aleatoriamente via internet), até os jogadores estão entrando nesse clima de guerra. Basta ver os últimos jogos entre os dois clubes. Nos confrontos entre Palmeiras e São Paulo. a polêmica se prolonga (alimentada pelos dois clubes) por muito tempo.

O último jogo entre os dois times, por exemplo, ainda não acabou. No começo dessa semana, tivemos o julgamento do atacante Kleber (Palmeiras), denunciado pelas câmeras de TV (e pressão do São Paulo), e o jogo só vai terminar quando o meia Jorge Wagner (São Paulo) for julgado, após também ser flagrado pelo vídeo (e pressão do Palmeiras).

Isso sem falar nos confrontos do ano passado. No primeiro turno do Brasileiro, o São Paulo conseguiu que o atacante Edmundo fosse suspenso (outra vez pelas imagens de TV) após uma entrada no zagueiro Miranda. Na fase final, mais problemas. O Palmeiras conseguiu levar o jogo para o seu estádio, contra a vontade do São Paulo. Os palmeirenses ficaram dias reclamando da violência dos são-paulinos que teriam batido no meia Valdívia até tirar o jogador de campo, além de um gol anulado.

Esse jogo ficou também marcado por duas ocorrências com o goleiro Bosco, do São Paulo. O eterno reserva de Rogério Ceni foi flagrado ao simular que havia sido atingido por uma pilha e dizer que foi agredido após a partida na saída do vestiário.

Vocês podem argumentar que a rivalidade entre esses times e o Corinthians, por exemplo, também é grande. Concordo, mas palmeirense e são-paulinos não tratam um jogo contra o Corinthians como uma partida de vida ou morte. Palmeirenses e corintianos se respeitam, até porque, por muito tempo famílias eram divididas na paixão pelos dois times. Depois das partidas, havia as gozações, mas as reuniões familiares acabavam com qualquer clima de guerra.

Falando em história, o ódio entre palmeirenses e são-paulinos vem de muito tempo, mais precisamente do final da década de 1930. Os dirigentes do São Paulo, quando o time tentava ganhar títulos e ser tornar tão grande quanto os dois, não gostavam que os diretores do Corinthians e do então Palestra Itália espalhassem uma história que ofendia os são-paulinos.

Como o Palestra Itália e o Corinthians dominavam o futebol paulista na época, os dois times decidiam antes do torneio quem seria campeão na base do cara e coroa. Os dirigentes dos dois times, principalmente os palestrinos, diziam que o São Paulo só seria campeão se a moeda caísse de pé. Por isso, o São Paulo, nos seus primeiros títulos paulistas, comemorava a conquista com um carro alegórico que tinha como decoração uma moeda em pé.

Logo no início da década de 1940, mais um momento de tensão entre palestrinos e são-paulinos. Os palmeirenses mais antigos, até hoje, acusam os são-paulinos de fazerem pressão para que o Palestra Itália (já que o Brasil havia declarado guerra aos países do Eixo, que eram Alemanha, Itália e Japão) mudasse de nome.

Naquela época, os palestrinos relatam que os são-paulinos tentaram invadir e tomar o Palestra Itália. Para piorar a situação, pouco tempo depois, com o nome de Palmeiras, o time ganharia o título Paulista de 1942, contra o São Paulo, numa partida que o rival abandonou o gramado antes do final da partida. O clima tenso continuava, pois na mesma década os times decidiram vários títulos paulistas.

O clima de guerra diminuiu entre as décadas de 1950 (quando o Palmeiras ficou um bom tempo sem ganhar títulos) e 1960 (quando o São Paulo construía o Morumbi). Mas, já na decisão do Paulistão de 1971 o tom amistoso acabou.

Os palmeirenses, inconformados com um gol anulado do atacante Leivinha,(o árbitro Armando Marques alegou que o gol foi feito com a mão), não tiveram dúvidas em afirmar que o São Paulo era beneficiado por influência política, já que o então governador do Estado, Laudo Natel (um dos são-paulinos mais ilustres da história do clube), intimidava os árbitros entrando no gramado ou assistindo as partidas no banco do tricolor.

É lógico, que o troco do Palmeiras, com as conquistas do Paulista de 1972 e do Brasileiro de 1973, em cima do São Paulo, com dois empates sem gols, acirrou a briga.

Na década de 1990, mais batalhas, inclusive campais. Turbinado com os dólares da Parmalat, o Palmeiras montou um time que tirou do São Paulo a hegemonia do futebol nacional. Nessa época não faltaram acusações de esquemas de ambos os lados, brigas campais entre os jogadores (até Telê Santana teve uma ríspida discussão com Edmundo em uma das partidas), agressões entre jogadores e a briga entre as torcidas, na final da Supercopa São Paulo de Juniores em 1995.

Palmeirenses e são-paulinos se odeiam tanto que não se importam em declarar que torcem pelo Corinthians em jogos contra os inimigos.

Até a próxima.

Promete ser muito acirrada a luta pelas quatro vagas para as semifinais do Campeonato Paulista. O Guaratinguetá, que tinha um lagar quase garantido, perdeu fôlego nas últimas rodadas e pode ficar de fora. Já o Santos, que parecia eliminado, tem dois confrontos diretos contra Corinthians e Ponte Preta, times estão na sua frente na classificação, e também tem boas chances de estar na fase final do campeonato. Isso, sem esquecer de Palmeiras e São Paulo.

A Lei Pelé completa dez anos. Não acho que ela seja a grande responsável pelo estado de penúria dos nossos clubes. Antes de a lei entrar em vigor, os nossos clubes já passavam por péssima situação financeira. O que mais me deixa perplexo é como os jogadores não souberam usar a liberdade que a lei os deu. Mesmo com o fim do passe, a maioria dos jogadores continuam presos a empresários e agentes, que se aproveitaram da incompetência dos clubes e dos atletas em se adaptarem aos novos tempos.

Humberto Luiz Peron é jornalista esportivo, especializado na cobertura de futebol, editor da revista "Monet" e colaborador do diário "Lance". Escreve para a
Folha Online às terças-feiras.

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