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Futebol na Rede

30/10/2003

Artigo: Dinheiro perdido

HUMBERTO PERON
Colunista da Folha Online

Não é novidade nenhuma que a grande maioria dos nossos clubes estão em situação pré-falimentar. O que me deixa chocado são as inúmeras possibilidades de ganhos que os times têm, mas que poucos aproveitam. Atualmente, grande parte do dinheiro arrecadado com o futebol não chega aos clubes.

Está certo que a principal fonte de arrecadação dos clubes é o dinheiro vindo da televisão. Mas hoje a relação entre agremiações e TVs não é de parceria. Os times ficaram reféns da televisão. Como muitos já anteciparam suas cotas do próximo ano, as emissoras se tornam suas credoras. Nesta situação, não têm a mínima condição de negociar os contratos e são obrigados a aceitar o que é oferecido. Nem a opção de procurar uma concorrente os clubes podem ter, pois, como já disse, eles já gastaram a verba do próximo ano e estão comprometidos.

Os pacotes de pay-per-view, outra grande fonte de recursos para clubes de vários países, têm rendimento pífio para os nossos times. Não consigo entender como os clubes aceitam que as emissoras vendam um pacote de jogos de todo o campeonato, e não de um time específico. Se o pacote fosse por clube, eles poderiam negociar direto o valor da transmissão e, no mínimo, saberiam quanto é sua participação na vendas dos jogos. Pelo sistema atual, isso é impossível de se saber.

Com a dependência cada vez maior do dinheiro da TV, os clubes pouco investem no público que vai aos estádios. Nossos dirigentes pouco fizeram para combater a violência nos estádios e em suas cercanias, não se importam com o conforto do torcedor, marcam jogos em horários absurdos para se adequar às grades de programação e não têm nenhuma iniciativa de modernizar os nossos arcaicos estádios.

Pela pouca capacidade de administração dos nossos dirigentes, o dinheiro vindo das bilheterias se perde, o que é uma absurdo. A renda das partidas é o único dinheiro que os times recebem sem precisar fazer quase nenhum investimento. Talvez seja o único recurso que os clubes recebem sem nenhum intermediário.

Eles esqueçam que com mais pessoas indo aos estádios eles poderiam ganhar dinheiro explorando, por exemplo, lanchonetes. Não posso entender como os dirigentes possam aceitar que empresas, ditas de alimentação, prestem um serviço tão ruim e ao mesmo tempo com um preço exorbitante dentro de seus estádios. Os clubes acabam perdendo dinheiro para as barraquinhas de ambulantes.

A mesma coisa acontece com o estacionamento. Os clubes não são capazes de criar áreas, ou parcerias com estacionamentos perto de seus estádios, e perdem renda para os famosos "flanelinhas" (guardadores de carro).

Nas vendas de camisas, os clubes também perdem muito dinheiro. Leio, e não posso acreditar, que não acham viável a fabricação de camisas mais baratas. Ou seja, eles preferem deixar todo o ramo de camisas populares nas mãos de "piratas". Parece mentira, mas é verdade.

Deixam de ganhar dinheiro quando se unem a empresários e perdem dinheiro pagando comissões na venda de jogadores. Isso sem falar nas contratações de jogadores de qualidades técnicas questionáveis, feitas por indicação dos mesmos empresários, que se transformam em grandes prejuízos.

O pior caso é quando os clubes loteiam suas categorias de base com empresários. Parece que não perceberam que a única maneira de obter receitas com jogadores é investindo em jovens. Com a associação com empresários, os clubes são obrigados a se desfasarem dos atletas no momento em que os intermediários querem. Em caso de rompimento do empresário, o clube, muitas vezes, perde o jogador sem poder fazer nada.

Como foi mostrado existe muito dinheiro circulando no nosso futebol. A única coisa é que os nossos dirigentes precisam achar uma maneira fazer todo esse valor beneficiar os clubes. Mas eu não sei se eles têm interesse nisso. Com o dinheiro entrando nos caixas dos clubes, com certeza, muitos dirigentes não se tornariam milionários de um dia para o outro.

Até a próxima.

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O destaque   O que deveria ser destaque
A reta de chegada do Campeonato Brasileiro. O Cruzeiro, continua como maior favorito para a conquista do título, mas tem que ter cuidado para administrar a reação do Santos. Mais do que nunca será necessário que a equipe de Wanderley Luxemburgo consiga ter nesse final de campeonato sua maior virtude em todo torneio: a regularidade. Além da disputa do título, a luta para chegar à Libertadores promete esquentar o final da competição. Segundo a CBF nada menos do que 791 jogadores deixaram o país até o dia 10 de outubro. Para se ter idéia do tamanho do êxodo, ele equivale a 24 elencos com 32 jogadores cada um, ou seja, o número de atletas que disputam o Campeonato Brasileiro da Série A. Está certo que no futebol brasileiro surgem jogadores a cada momento, mas com essa saída tão grande para o exterior haverá um momento que os clubes terão sérias dificuldades para formar um time.

Humberto Luiz Peron é jornalista esportivo, especializado na cobertura de futebol, editor da revista "Monet" e colaborador do diário "Lance". Escreve para a
Folha Online às terças-feiras.

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