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Noutras Palavras

03/07/2006

O carrasco e a frustração

THAÍS NICOLETI DE CAMARGO
Colunista da Folha Online

"Zidane é um dos principais carrascos da história do futebol brasileiro. O meia, que 'ganhou' a final da Copa de 1998, mais uma vez brilhou e foi o grande responsável pela vitória por 1 a 0 da França, placar que eliminou a seleção brasileira nas quartas-de-final. O jogador foi o autor do cruzamento que resultou no gol de Henry e na queda do Brasil, que viu ruir seu favoritismo incontestável de forma melancólica."

Foi assim que teve início um texto do canal de esportes do UOL. O jornalista captou o sentimento comum à maioria dos brasileiros, esse misto de frustração com o desempenho da seleção brasileira e admiração pela atuação do grande craque francês. Que Zidane deu o "show de bola" não há dúvida.

A questão de hoje é o uso da palavra "carrasco". A bem da verdade, o termo, de conotação tão negativa, foi usado para elogiar o craque. Paradoxalmente, ser chamado de "carrasco" nesse contexto é ter suas qualidades de grande jogador enaltecidas.

Carrasco, na origem, é um nome próprio; é o último sobrenome de Belchior Nunes, um algoz que ficou conhecido em Lisboa antes do século 17. De nome próprio passou a substantivo comum e hoje é sinônimo de verdugo ou algoz, ou seja, carrasco é o executor de pena de morte.

Esse processo lingüístico, segundo o qual uma palavra muda de classe gramatical, é chamado derivação imprópria. Carrasco era nome próprio e tornou-se nome comum; o movimento inverso também foi comum no passado da língua. Sobrenomes como Monteiro, Lavrador, Velho, Gordo, Leal, entre muitos outros, vieram dos nomes de profissões ou de características pessoais (físicas ou psicológicas).

Vale a pena lembrar que a palavra "carrasco" não tem feminino. É comum ouvirmos pessoas dizerem que "fulana é uma carrasca". Cuidado: essa palavra não existe. Por pior que seja a mulher, ela não poderá ser chamada de "carrasca". O que é possível dizer é que a tal fulana é um verdadeiro carrasco, sempre no masculino.

Agora, é esperar por mais quatro anos!...

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    Thaís Nicoleti de Camargo, consultora de língua portuguesa, é autora de "Redação Linha a Linha" (Publifolha), "Uso da Vírgula"(Manole) e "Manual Graciliano Ramos de Uso do Português" (Secom-AL) e colunista do caderno "Fovest" da Folha.

    E-mail: mailto:thaisncamargo@uol.com.br

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