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Nutrição é Saúde

25/08/2005

Dieta milagrosa?

Li em uma revista feminina sobre uma nova dieta, que promete, é claro, emagrecimento e felicidade. O mais interessante nessa dieta é que ela tem um aval acima de qualquer suspeita ou protesto, o aval de Jesus. Pois é, a dieta de Jesus.

Entrar no mérito de mais essa dieta seria mais uma vez uma enfadonha lista de argumentos que pregam o que todos já sabem: mesmo com a dieta de Jesus, não existem milagres. É preciso uma alimentação balanceada e atividade física para alcançar o paraíso do corpo perfeito.

O que, então, nos leva a procurar o tal milagre, se já se sabe que o necessário é a mudança do comportamento alimentar? Talvez seja o fato de o nosso comportamento alimentar estar relacionado aos nossos sentimentos mais profundos.

Por mais que o raciocínio humano saiba que a gordura saturada faz mal para as artérias e mil e outras coisas, é difícil controlar o impulso do desejo pela gordura. Nossos genes pedem por ela. É árdua essa luta. E o chocolate? Doces em geral? Parecem que essas guloseimas perseguem nossos pensamentos, estão no topo da preferência alimentar. Parece que esse paladar foi moldado há muito mais tempo do que podemos lembrar. Estudos mostram que a placenta é levemente adocicada, e que o feto já apresenta predileção pelo sabor doce.

E a confusão a respeito de alimentação e dieta? Quantas "peças" nos pregam? Será que se eu comer só brócolis ficarei magérrima? A solução é essa? Com certeza é um grande engodo!

As conseqüências de dietas e dietas para emagrecimento são previsíveis: o comportamento alimentar passa a dar lugar ao transtorno alimentar. Não quero com isso dizer que os transtornos alimentares se resumem às noções errôneas sobre alimentação que perambulam por aí. Mas me pergunto se aquela menina de 14 anos incomodada com seus 4 quilos a mais, de repente, se depara com o milagre da dieta, por exemplo, a de Jesus, começa a segui-la com uma fé inabalável e emagrece. Aos poucos vai dando uma ajudinha aos céus e passa a cortar mais alimentos, para a dieta ser mais eficaz. E mais alimentos, por fim só um tratamento médico e Deus poderão salvá-la da anorexia.

Parece uma ficção tola. Mas não é. Nos Estados Unidos os transtornos alimentares representam o terceiro grupo de doenças crônicas incidentes em adolescentes. No Brasil ainda não foram relatados os números, mas parecem não diferirem muito do modelo americano.

Em suma, não sabemos ainda ao certo como trabalhar o comportamento alimentar. Mas temos certeza da gravidade dessas dietas de moda que não se resumem a mais um errinho que a gente pode contornar. Tem gente que não pode contornar e morre por isso. Morre sim: cerca de 20% das pacientes que buscam tratamento para a anorexia nervosa não conseguem sucesso. É por isso que essa profusão de dietas milagrosas tem que ser combatida principalmente por quem sabe, ou pelo menos deveriam saber, da sua periculosidade: nutricionistas, médicos, profissionais da área de saúde.

Caro leitor, cuidado. Forte abraço e boa semana
Andrea Galante é mestre e doutora em Nutrição Humana Aplicada pela Universidade de São Paulo, e presidente da Associação Brasileira de Nutrição. Escreve quinzenalmente na Folha Online, às terças-feiras.

E-mail: andrea.galante@uol.com.br

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