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Pai é Pai

30/11/2008

O segundo

Semana passada reencontrei uns amigos do interior que há tempos não via. Todos com dois filhos, com três ou quatro anos de diferença entre um e outro. A mesma diferença do João e do Pedro. E o papo, claro, depois das agruras do outrora glorioso Botafogo de Ribeirão Preto, não poderia acabar caindo em outro assunto que não fosse os filhos, mas especificamente o segundo filho.

E, mais detalhadamente ainda, como eles são diferentes dos primeiros e ainda mais "manhosos", "terríveis", "espertos". Bom, o fato é que todos tinham essa mesma opinião, inclusive eu mesmo, mas ninguém conseguia avançar muito nas razões disso. Na viagem de volta, com a turma toda apagada no carro, fiquei matutando sobre isso. E cheguei, arrisco, a algumas conclusões que, se não servem como um tratado de psicologia infantil, ao menos me ajudaram a entender um pouco o Pedro, nosso "enfant terrible". Acompanhem.

1 - O segundo filho é mais manhoso: tenho de ser sincero e dizer que não lembro se o João era ou não manhoso. A Mãe, dona de uma memória prodigiosa, diz que sim. Não sei. O que tenho certeza é que o Pedro às vezes abusa. Se não consegue o seu objetivo logo de cara, abre a boca. Verdade que isso vem melhorando, mas ainda tem chão pra entrar nos eixos.

Acho que isso tem a ver mais com a gente de que com ele. O segundo filho, como se sabe, tem um "rival" natural dentro de casa, coisa que o primeiro jamais teve. Sua sina é conquistar a qualquer preço a atenção da Mãe (digo mãe, porque o Pedro, do alto de seus dois anos e nove meses, ainda está descobrindo o pai, mas isso é assunto pra um outro dia). E é aí que entra o "irmão-rival", que, apesar de mais velho, também quer a sua justa porção de colo.

E o que nós fazemos? Tentamos nos dividir para satisfazer os dois. Às vezes dá certo, outras não. E quando a coisa encrenca pro seu lado, o Pedro usa a mais preciosa arma: o berreiro. Resumindo: não se trata de manha, mas do uso justificável de armas não-letais para a conquista de um objetivo mais do que legítimo.

2 - O segundo filho é terrível: Antes de mais nada, para evitar mal-entendidos, é bom definir "terrível", que aqui tem o significado de "travesso". Assim, vamos em frente. Bem, desse tópico eu lembro bem e posso afirmar: sim, o Pedro é mais travesso que o João.

Mas não acho que isso seja um mal. Pelo contrário, a meu ver esse seu jeito de ser demonstra que ele é um garoto atento e bastante ativo. Digo atento porque é impressionante como o Pedro imita o João em praticamente tudo. Nas brincadeiras, nas atitudes, nas musiquinhas e até no gosto pelos programas de TV e na adoção do peculiar vocabulário dos meninos de seis anos de idade, onde não faltam "cocô, xixi e pum".

Ora, se agora ele tem um "mestre", é natural, imagino, que seu desenvolvimento ocorra de forma mais acelerada. Não que isso nos exima de adotar alguns filtros, sobretudo em relação a certos desenhos animados e pragas musicais. "Cléu, cléu, cléu, papai!" É, pois é, então. Duro, né? Mas o fato é que o segundo é sim mais travesso. E nisso todos os amigos pais de família concordam enfaticamente.

3 - O segundo é mais esperto. De novo, "esperto" aqui quer dizer mais "safo", "descolado". Claro que isso tem a ver com o exemplo do mestre Jedi João, mas também com o fato de nós, pais, estarmos muito, mas muito mais relaxados com o segundo o filho.

Ainda que tudo seja igual e completamente diferente, é bem mais tranqüilo quando temos alguma experiência acumulada. Afinal, há muito deixamos de ser "pais de primeira viagem". Isso significa menos ansiedade, mais tolerância, mais sabedoria e, vá lá, vou ser sincero, um pouco mais de "preguiça" na hora de exercer aquele controle obsessivo ao qual nos obrigávamos com o primeirão.

O resultado é que o Pedro se vira muito, mas muito bem para a sua idade. Demonstra independência, firmeza de opinião e um estado de espírito incríveis para a sua idade. Não que não reconheça os limites impostos por nós, adultos, apenas sabe, digamos, como "esticá-los". E essa, meus amigos, é a parte que mais gosto nessa história toda.

Enfim, são apenas algumas observações. Afinal, como diz meu amigo Zé Renato, lá de Ribeirão Preto: "Essa molecada é tudo igual, só muda o endereço". Pode até ser, mas o mais bacana é a gente poder ver como esses meninos são tão únicos dentro dessa suposta igualdade. Ainda bem.

Luiz Rivoiro é pai de João, 8, e de Pedro, 3. Jornalista, trabalhou na "Folha de S.Paulo" por 14 anos. É editor da revista "Playboy" e autor do livro "Pai É Pai - Diário de um Aprendiz". Escreve quinzenalmente para a Folha Online.

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