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Pai é Pai

06/12/2009

Festa de arromba

Outro dia fomos à casa de uns amigos para uma festinha. Ainda que não tenham filhos, eles costumam chamar aqueles que os têm para eventos diversos, como almoços, jantares e, claro, festas. Coisa rara, ouso dizer. Por experiência própria, vi amigos que não saíam de casa na época em que não tínhamos filhos desaparecerem quando o primeiro choro ecoou pela sala. Num primeiro momento, me senti triste. Afinal, tratavam-se de amigos próximos que de uma hora para outra simplesmente deixaram de aparecer, convidar para sair ou até mesmo ligar. Pensando bem, hoje, quase oito anos depois, talvez não fossem assim tão amigos. Ou, quem sabe, estivessem num outro momento da vida, curtindo ao máximo a solterice aos 35 anos temendo se contaminar com o temido "vírus" da procriação que assolava todos os seus colegas. Ou, ainda, tratava-se de algum trauma de infância, sei lá. Bom, mas não é disso que vou falar.

Voltando à tal festinha na casa dos tais amigos-sem-filhos-que-adoram-os-filhos-dos-amigos, neste dia o evento começou à tarde, num típico almoço de sábado sem hora para acabar. Como estava calor, eles montaram uma piscina no quintal e espalharam pufes pelo gramado. O Pedro e o João logo arrancaram a roupa e se mandaram para dentro d'água. E ali ficaram por muito tempo, brincando com outras crianças, sem dar a mínima, mas a mínima, bola pra mim ou para a Mãe. Até que veio a hora de comer, o sol começou a baixar e, plim, de repente a piscina já não parecia mais tão atrativa. Foi aí que o João teve a primeira grande ideia do dia.

Xereta, ele havia se esgueirado pelo escritório da dona da casa com apenas um obtivo em mente: conseguir uma folhas de papel sufite. Quando achou o que queria, voltou correndo: "Papai, vamos fazer uns aviões?". E lá fomos nós, ou melhor, ele, construir aviõezinhos de papel em diversos modelos que havia aprendido na escola. Logo, tinha uma esquadrilha nas mãos e começamos a disparar pelo quintal. Vendo as descolagens, o Pedro colou no João pedindo que ele lhe fizesse um que "voasse bastante". Orgulhoso, o João pôs-se a preparar novos aeroplanos numa verdadeira linha de montagem, visto que as demais crianças também haviam se juntado a nós. Não demorou muito e aviões de todos os tamanhos e tipos cruzavam o céu alcançando o telhado, a piscina, potes de guacamole, cabeças, ombros, joelhos e pés dos convidados. E eu ali, dando a maior força.

Quando luz sumiu por completo, no entanto, a brincadeira foi murchando. Afinal, ficava difícil acompanhar os loopings e aterrissagens no escuro. Foi aí que eu tive a segunda melhor ideia do dia e perguntei aos donos da casa: "Vocês não teriam, por acaso, uma lanterna aí?" E eles tinham. Com a lanterna na mão e o som rolando alto na sala mezzo escura, comecei a projetar efeitos de luz e sombras nas paredes. As crianças piraram! Não sei se era o efeito alucinógeno fruto de altas doses do açúcar concentrado no bolo de chocolate, mas o fato é que eles adoraram a brincadeira e logo estavamo se arriscando a produzir suas imagens na parede, teto e piso da sala em meio aos adultos que se balançavam ao som de Tim Maia e Roberto Carlos em ritmo de aventura.

Nesse pique, a brincadeira até que foi longe, até que saímos deixando a festa entregue aos adultos, que, pelo que soube depois, se acabaram na pista até as 5 da matina. No carro, de volta pra casa, os meninos não estavam muito a fim de falar muito. Apagaram em menos de cinco minutos. Mas tenho certeza de que curtiram bastante essa festa de arromba.

Luiz Rivoiro é pai de João, 8, e de Pedro, 3. Jornalista, trabalhou na "Folha de S.Paulo" por 14 anos. É editor da revista "Playboy" e autor do livro "Pai É Pai - Diário de um Aprendiz". Escreve quinzenalmente para a Folha Online.

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