Colunas

Regra 10

27/03/2009

Antes um Coalhada que um Ortigoza

EDUARDO VIEIRA DA COSTA
Editor de Esporte da Folha Online

Pelé, Garrincha, Viola, Careca, Manga, Vampeta, Cocada, Cafezinho, Batata, Pinga, Pramps, Baré, Tangerina, Alfinete, Aranha, Biro-Biro, Catatau, Dunga. O que une todos esses jogadores? Somente um fato: todos são ou foram conhecidos por seus apelidos.

Mas o apelido, uma marca registrada do futebol brasileiro, está, aos poucos, acabando. O que é uma pena. Pode parecer bobagem, mas não é. Os jogadores conhecidos unicamente por apelidos distinguem o futebol brasileiro do de todos os outros países do mundo.

Principalmente os de apelidos "puros", como os citados acima, ou seja, sem contar os aumentativos e diminutivos (Pedrinhos e Chicões da vida) e os apelidos-gentílicos, como Marcelinho Carioca, Marquinhos Capixaba etc.

Em qualquer país europeu, e até mesmo nos nossos vizinhos sul-americanos, jogador de futebol sempre teve nome e sobrenome. O Brasil foge (ou fugia) do padrão. O melhor jogador de todos os tempos é o Pelé porque ele é brasileiro. Se fosse argentino, alemão ou italiano, seria Edison Nascimento, ou só Nascimento. Muito chato.

No Brasil, futebol sempre foi sinônimo de brincadeira, de molecagem. Isso diferencia a escola brasileira de futebol. E é muito mais fácil um Garrincha ser o rei do drible do que um Manoel dos Santos.

Mas uma boa evidência de que esses tempos estão acabando pode ser vista na escalação dos quatro maiores times de São Paulo.

O São Paulo por exemplo, joga sem nenhum atleta com apelido. O time-base, mais ou menos, tem: Rogério Ceni; Miranda, André Dias, Rodrigo e Junior Cesar; Zé Luis, Jean, Hernanes e Jorge Wagner; Borges e Washington.

Praticamente uma lista de bacharéis.

O mesmo acontece com o Santos: Fábio Costa; Luizinho, Fabiano Eller, Fabão e Léo; Roberto Brum, Rodrigo Souto e Madson e Paulo Henrique; Neymar e Kléber Pereira. Poderia colocar o Triguinho na lateral-esquerda para dar uma quebrada nesta monotonia.

No Palmeiras, o apelido também perdeu espaço. O Fabinho Capixaba até escapa na linha dos apelidos-gentílicos, mas é só: Marcos; Fabinho Capixaba, Danilo e Marcão; Sandro Silva, Jumar, Cleiton Xavier, Diego Souza e Armero; Willians e Keirrison.

O Corinthians tem algumas gratas exceções. Dentinho resistiu bravamente à pressão dos cartolas, que queriam que ele fosse chamado de Bruno Bonfim, e honra a tradição nacional. Boquita é outro. E ainda tem o Chicão, que não se chama Francisco. E mais o Saci, no banco.

Mas ainda é pouco: Felipe; Alessandro, Chicão, William e André Santos; Cristian, Elias, Boquita e Douglas; Dentinho e Ronaldo.

A seleção de Dunga (esse sim um apelido de respeito) também reflete esta realidade. Ninguém que tem vestido a camisa amarela tem apelido. A exceção é Kaká.

Nesta semana, o atacante palmeirense Ortigoza esbravejou contra o apelido que os colegas arranjaram para ele. Devido à semelhança com o personagem boleiro de Chico Anysio, virou o Coalhada. Mas ele não quer ser chamado assim.

Pior para ele e para o Palmeiras. O time seria muito mais interessante com Coalhada e K9 no ataque, e ele ainda podia aproveitar para pegar mais um jeitinho brasileiro.

E, no final das contas, ele é mesmo a cara do Coalhada.

*

Falando em apelidos, uma linha bacana é a dos jogadores com nome seguido de apelido, como se fosse nome e sobrenome. Serginho Fraldinha, Luciano Bebê, Serginho Chulapa, Paulinho McLaren, Juca Baleia, Mauro Shampoo, Beto Fuscão, Adriano Chuva, Valdir Papel, Ademir Sopa e por aí vai.

*

Mais estranho ainda é quando não parece um apelido, mas é. Caso de Pedrão, do Barueri, que na verdade se chama Cristiano. Vale a explicação. Quando criança, estava brincando na rua e foi atropelado por um caminhão de gás, o Gás do Pedrão. Ganhou uma perna e um braço quebrados e um novo "nome" para o resto da vida.

Chicão, do Corinthians, como explicado acima, está no mesmo barco. Seu nome é Anderson Sebastião Cardoso. Segundo o leitor Luiz Fabiano Luz, o apelido é por causa do Chicão que jogou a Copa de 1978.

*

Apelido com gentílico não conta, como eu disse acima. Mas conta em casos como o do volante Mineiro, que na verdade é gaúcho. O atacante Fernando Baiano também não é baiano --nasceu em São Paulo.

*

Dica de blog: Dois vezes Um

Eduardo Vieira da Costa foi repórter do diário "Lance" e da Folha Online, onde atualmente é editor de Esporte. Escreve a coluna Regra 10, semanalmente, às sextas-feiras, além de comentar futebol em podcast neste mesmo dia.

FolhaShop

Digite produto
ou marca