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Regra 10

03/04/2009

Era brasileira na Libertadores?

EDUARDO VIEIRA DA COSTA
Editor de Esporte da Folha Online

Na contagem geral histórica, o Brasil leva uma sonora goleada. São 21 títulos de clubes da Argentina na Libertadores em todos os tempos contra 13 dos brasileiros. E o Uruguai não fica muito atrás, com oito.

Mas, assim como a Europa vê uma "era inglesa" em sua Copa dos Campeões, com os times do país dominando a competição nas últimas edições, uma "era brasileira" pode se iniciar na Libertadores. Pelo menos na visão do colunista Tim Vickery, da BBC.

Em seu blog, há alguns dias, ele discorreu sobre os motivos que o levam a acreditar que o país pentacampeão mundial deverá dominar o interclubes sul-americano nos próximos tempos.

Pode ser. A argumentação de Vickery é bastante convincente --e de fato é possível constatar um melhor desempenho brasileiro nas últimas duas décadas--, mas pelo menos um ponto, ao meu ver crucial, não foi analisado com devida isenção.

Vickery usa uma das explicações mais correntes para justificar os poucos títulos do Brasil no passado. É a visão de que os clubes brasileiros não se interessavam muito por essa competição. Isso, no entanto, é para lá de duvidoso.

Em primeiro lugar, pelo mais óbvio dos motivos. Todo mundo quer ser campeão. E o brasileiro, com todo seu complexo de vira-latas tão evocado por Nelson Rodrigues, sempre teve a necessidade de autoafirmação. Nada melhor do que títulos internacionais para ter essa sensação.

Pelo que me consta o Santos, vencedor da Libertadores em 1962 e 1963, que nestes mesmos anos conquistou seus dois Mundiais interclubes, sempre se orgulhou destes feitos como alguns dos mais heroicos da história do futebol brasileiro.

O mesmo ocorre com as dobradinhas Libertadores-Mundial de Flamengo, em 1981, e Grêmio, em 1983. São exemplos que tornam difícil compreender como outras equipes, nesta época, poderiam desprezar a tentativa de atingir tais glórias.

Em segundo lugar, é necessário levar em consideração que, além dos 13 títulos, o Brasil acumula 12 vice-campeonatos, sem contar os vices de finais brasileiras. Ou seja, fez outras 12 finais de Libertadores contra estrangeiros. E não é possível que os times que jogaram estas finais não tivessem motivação para ser campeões continentais --e, eventualmente, mundiais. Eles perderam porque perderam.

Se essas 12 finais tivessem sido vencidas pelos brasileiros, o placar geral apontaria 25 títulos para o Brasil. E mais: como oito destas decisões foram contra argentinos, o número de conquistas dos hermanos cairia para apenas 13. Daí conclui-se que não é por desprezo que os times nacionais estão tão atrás no placar, e sim porque perderam em campo.

É claro que isso tudo leva a discussão para o campo hipotético, mas prever uma "era brasileira" também não passa de conjectura.

Mesmo porque, apesar de revelar jogadores como em nenhuma outra parte do mundo, falta aos clubes brasileiros o poderio econômico que permitiu aos ingleses manter seus times em tão alto nível a ponto de praticamente transformar a competição continental em um nacional.

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Pesa a favor da teoria de Tim Vickery o fato de o Brasil ter estado em 14 finais nos últimos 17 anos na Libertadores --com oito títulos e seis vices. Desde 1992, a competição só não teve brasileiros na decisão em 1996, 2001 e 2004. E cabe dizer, ainda, que em 2005 e 2006 as finais foram totalmente brasileiras.

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Com o próprio Vickery lembra, no entanto, o fato de os times sul-americanos sempre venderem seus principais jogadores, o que impede grandes sequências de bons resultados, abre espaço para surpresas, como a LDU, atual campeã. E como o Once Caldas, em 2004.

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Dos cinco brasileiros na Libertadores-2009, três lideram seus grupos até agora: São Paulo, Cruzeiro e Grêmio. O Sport está em segundo em sua chave, mas com a mesma pontuação do líder e um jogo a menos. Só o Palmeiras vai mal. Se passar de fase, no entanto, é tão favorito quanto os outros quatro. Grandes chances de 2009 ajudar a teoria de Vickery. Tomara.

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Dica de blog: Dois Vezes Um

Eduardo Vieira da Costa foi repórter do diário "Lance" e da Folha Online, onde atualmente é editor de Esporte. Escreve a coluna Regra 10, semanalmente, às sextas-feiras, além de comentar futebol em podcast neste mesmo dia.

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