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Regra 10

12/06/2009

Uma seleção com a cara do Dunga

EDUARDO VIEIRA DA COSTA
Editor de Esporte da Folha Online

Se existe um momento para elogiar o Dunga, é agora. Líder isolado das eliminatórias, time praticamente classificado para a Copa-2010. Os números falam por si, como já disse o próprio técnico. No triunfo por 2 a 1 sobre o Paraguai, ele chegou a 40 jogos pelo time principal, com 26 vitórias, dez empates e quatro derrotas. Respeitável.

Mas eu vou deixar um pouco de lado a frieza dos números. E vou abrir mão da oportunidade de elogiar, sob risco de parecer ser um daqueles tipos que só reclama da seleção e que chegam até a torcer contra --não sou, quem me conhece sabe.

O time e o estilo de Dunga têm dado certo, sem dúvida. Mas, para mim, falta alguma coisa na seleção que a faça ter algum atrativo. O futebol de resultados, como o nome diz, busca em primeiro lugar a vitória. Mas alcançar esse objetivo e parar por aí, quando se trata de seleção, é pouco.

Em uma crônica de 2007 chamada "Seleção sem povo", o escritor Ruy Castro explica os motivos por que acha que "a seleção se divorciou do povo". Para ele, a seleção "reduziu-se a uma legião estrangeira que, mecanicamente, canta o hino antes do jogo".

Eu acho que esse divórcio passa também pelo problema da falta de ousadia. Ou o Brasil precisa mesmo jogar com Gilberto Silva, Felipe Melo e Elano? Será que é mesmo necessário usar três volantes? E ainda mais sendo que nenhum deles justifica sua presença ali?

Gilberto Silva atua hoje no fraco futebol da Grécia, no Panathinaikos. Já devia ter encerrado sua carreira na seleção faz tempo --e, no entanto, vai para sua terceira Copa seguida, privilégio que muitos craques não tiveram.

Felipe Melo não teria nem como provar muita coisa atuando pela Fiorentina, apesar do bom desempenho do clube na última temporada. E, estranhamente, chegou de surpresa numa convocação, assumiu de cara o posto de titular e não saiu mais.

Elano, por sua vez, é reserva de um time de segundo escalão, o Manchester City. E nem dá para contestar muito essa posição no clube, o problema é seu status na seleção.

Será mesmo que são três jogadores para ser titulares da seleção?

No fim das contas, o time funciona com os três --os números falam por si, como disse o Dunga. A equipe fica combativa, competitiva. Ganha jogos. Lidera as eliminatórias. Pode ser campeã da Copa dos Confederações jogando assim. Pode ser até vencedora da Copa do Mundo. A Itália foi campeã jogando mais defensivamente ainda.

Mas, historicamente, essa é uma característica do futebol italiano. Não era, até então, do futebol brasileiro.

Luís Fernando Veríssimo já disse em um artigo que todo time precisa de um dunga --assim mesmo, com letra minúscula, já que no texto o nome do jogador vira substantivo comum, sinônimo de jogador de destruição.

Precisa. Mas basta um. No máximo dois, no caso de no banco já haver outro como técnico.

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O clima atual é de romance, já que o time vem de vitórias sobre o Paraguai e o Uruguai, nesta rodada dupla, e já havia vencido também o Peru na partida anterior. Mas cabe lembrar que a lua de mel é coisa bem recente. Em 2008, o Brasil empatou três jogos seguidos em casa por 0 a 0, contra Argentina, Bolívia e Colômbia. E, nas arquibancadas, a torcida cantava sem parar "Adeeeeeus, Dungaaaaa".

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Foi Dunga também o responsável pela histórica derrota para a Venezuela por 2 a 0, nos Estados Unidos, a primeira para o país vizinho em todos os tempos. E logo em seguida veio outra derrota, para o Paraguai, nas eliminatórias. A coisa estava bem feia naquela época.

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Sem contar a derrota para a Argentina na Olimpíada de Pequim, que impediu a busca pelo ainda inédito ouro. Só para lembrar o nível de indignação, o jornal "O Globo" chegou a dar capa do caderno de Esportes em que decretava a "morte" da seleção de Dunga.

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Para não falar apenas mal do Dunga, lembro que é muito melhor um time com a cara dele que se mantenha digno do que ter o Maradona no comando e não conseguir um time nem com cara de Dunga, nem de Maradona, nem de nada.

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Eduardo Vieira da Costa foi repórter do diário "Lance" e da Folha Online, onde atualmente é editor de Esporte. Escreve a coluna Regra 10, semanalmente, às sextas-feiras, além de comentar futebol em podcast neste mesmo dia.

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