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12/12/2005
-
10h58
CLÁUDIA COLLUCCI
da Folha de S.Paulo
O Brasil registra um aumento de casos de doenças da tireóide e a causa é o excesso de iodo no sal. A afirmação é de um dos maiores especialistas em tireóide no Brasil, o endocrinologista Geraldo Medeiros Neto, professor da Faculdade de Medicina da USP e consultor do Ministério da Saúde.
O problema, diz, foi detonado em 1998, quando uma resolução da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) aumentou a proporção de iodo no sal. Passou de 40-60 g/kg (microgramas por quilo) para 40-100 g/kg. Em 2003, após estudos comprovarem que havia excesso de iodo na urina da população, os índices foram reduzidos para 20-60 g/kg.
O Ministério da Saúde alega que a mudança em 1998 foi em razão de pressões da indústria salineira. "O setor teria reclamado que o limite mínimo de 40 e máximo de 60 g/kg de sal eram muito próximos, o que levava a erros de dosagens e, conseqüentemente, a multas", afirma Juliana Amorim, da coordenação de políticas de alimentação e nutrição.
O professor Medeiros Neto, que já era consultor do ministério da época, confirma. "A alteração foi feita sem o aval dos assessores técnicos. Foi decidida pelo pessoal do segundo e terceiro escalões." A indústria salineira nega.
Segundo Medeiros Neto, a ingestão de iodo em excesso durante um período prolongado --acima de três anos-- pode provocar o aumento da tireoidite crônica (tireoidite de Hashimoto) entre as pessoas que têm predisposição genética a doenças auto-imunes --15% da população, em média.
Pesquisas recentes feitas no país mostram incidência de até 20% de casos dessa doença, tipo mais comum de hipotireoidismo que atinge as mulheres e leva o organismo a produzir anticorpos contra a glândula tireóide, levando a uma inflamação crônica. O padrão internacional é de 7%.
"Não tenho dúvidas. [O excesso de iodo] é o gatilho que deflagrou esse aumento. As conseqüências aparecem mais tarde", diz ele.
Mas muitos médicos, como os endocrinologistas Mário Vaisman (UFRJ), Eder Quintão (USP) e Antonio Roberto Chacra (Unifesp), acreditam que o aumento dos casos esteja relacionado ao crescimento do diagnóstico da doença. "Ainda não há estudos suficientes", diz Quintão.
Não há um padrão internacional para o nível de iodo no sal. Cada país tem sua norma, mas em geral varia de 20 a 100 g/ kg.
Outro lado
O secretário-executivo da Abersal (Associação Brasileira dos Extratores e Refinadores de Sal), Afrânio Barreto, nega que tenha havido pressão do setor salineiro para a mudança dos teores de sal entre 1998 e 2003.
Segundo ele, na época, houve reclamações das indústrias sobre a margem estreita de iodo permitida (40 a 60 microgramas por quilo de sal), dificultando a adição correta do micronutriente.
"Ou havia excesso ou havia falta. Por isso, muitas indústrias começaram a ser multadas. Pedimos ao ministério para aumentar a margem, a exemplo do que tinha acontecido nos EUA."
Procurado, Gonçalo Vecina Neto, presidente da Anvisa em 1998, não foi encontrado para comentar o assunto.
Barreto diz que a mudança não foi à revelia do Ministério da Saúde, mas sim baseada em estudos feitos pela pasta durante um ano. Nem o ministério nem a Abersal souberam informar onde estariam esses estudos.
"Há muito folclore sobre a indústria salineira. O setor não tem esse poder", diz.
Para ele, também é "folclore" a hipótese de que o excesso de iodo está levando ao aumento de casos de hipotireoidismo. "Não há estatísticas confiáveis sobre isso que justifiquem esse temor."
Ele diz que, para estudar a real influência do sal na saúde das pessoas, o país deveria investir em pesquisas. "Ninguém sabe ao certo o consumo por pessoa. Além do sal utilizado no preparo dos alimentos, há o sal dos produtos industrializados."
O sal, diz, garante vários nutrientes à população. Além do iodo, ele diz que há países que estão adicionando flúor e ferro ao sal.
Especial
Leia o que já foi publicado sobre doenças da tireóide
Sal com excesso de iodo provoca tireoidite
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da Folha de S.Paulo
O Brasil registra um aumento de casos de doenças da tireóide e a causa é o excesso de iodo no sal. A afirmação é de um dos maiores especialistas em tireóide no Brasil, o endocrinologista Geraldo Medeiros Neto, professor da Faculdade de Medicina da USP e consultor do Ministério da Saúde.
O problema, diz, foi detonado em 1998, quando uma resolução da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) aumentou a proporção de iodo no sal. Passou de 40-60 g/kg (microgramas por quilo) para 40-100 g/kg. Em 2003, após estudos comprovarem que havia excesso de iodo na urina da população, os índices foram reduzidos para 20-60 g/kg.
O Ministério da Saúde alega que a mudança em 1998 foi em razão de pressões da indústria salineira. "O setor teria reclamado que o limite mínimo de 40 e máximo de 60 g/kg de sal eram muito próximos, o que levava a erros de dosagens e, conseqüentemente, a multas", afirma Juliana Amorim, da coordenação de políticas de alimentação e nutrição.
O professor Medeiros Neto, que já era consultor do ministério da época, confirma. "A alteração foi feita sem o aval dos assessores técnicos. Foi decidida pelo pessoal do segundo e terceiro escalões." A indústria salineira nega.
Segundo Medeiros Neto, a ingestão de iodo em excesso durante um período prolongado --acima de três anos-- pode provocar o aumento da tireoidite crônica (tireoidite de Hashimoto) entre as pessoas que têm predisposição genética a doenças auto-imunes --15% da população, em média.
Pesquisas recentes feitas no país mostram incidência de até 20% de casos dessa doença, tipo mais comum de hipotireoidismo que atinge as mulheres e leva o organismo a produzir anticorpos contra a glândula tireóide, levando a uma inflamação crônica. O padrão internacional é de 7%.
"Não tenho dúvidas. [O excesso de iodo] é o gatilho que deflagrou esse aumento. As conseqüências aparecem mais tarde", diz ele.
Mas muitos médicos, como os endocrinologistas Mário Vaisman (UFRJ), Eder Quintão (USP) e Antonio Roberto Chacra (Unifesp), acreditam que o aumento dos casos esteja relacionado ao crescimento do diagnóstico da doença. "Ainda não há estudos suficientes", diz Quintão.
Não há um padrão internacional para o nível de iodo no sal. Cada país tem sua norma, mas em geral varia de 20 a 100 g/ kg.
Outro lado
O secretário-executivo da Abersal (Associação Brasileira dos Extratores e Refinadores de Sal), Afrânio Barreto, nega que tenha havido pressão do setor salineiro para a mudança dos teores de sal entre 1998 e 2003.
Segundo ele, na época, houve reclamações das indústrias sobre a margem estreita de iodo permitida (40 a 60 microgramas por quilo de sal), dificultando a adição correta do micronutriente.
"Ou havia excesso ou havia falta. Por isso, muitas indústrias começaram a ser multadas. Pedimos ao ministério para aumentar a margem, a exemplo do que tinha acontecido nos EUA."
Procurado, Gonçalo Vecina Neto, presidente da Anvisa em 1998, não foi encontrado para comentar o assunto.
Barreto diz que a mudança não foi à revelia do Ministério da Saúde, mas sim baseada em estudos feitos pela pasta durante um ano. Nem o ministério nem a Abersal souberam informar onde estariam esses estudos.
"Há muito folclore sobre a indústria salineira. O setor não tem esse poder", diz.
Para ele, também é "folclore" a hipótese de que o excesso de iodo está levando ao aumento de casos de hipotireoidismo. "Não há estatísticas confiáveis sobre isso que justifiquem esse temor."
Ele diz que, para estudar a real influência do sal na saúde das pessoas, o país deveria investir em pesquisas. "Ninguém sabe ao certo o consumo por pessoa. Além do sal utilizado no preparo dos alimentos, há o sal dos produtos industrializados."
O sal, diz, garante vários nutrientes à população. Além do iodo, ele diz que há países que estão adicionando flúor e ferro ao sal.
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