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19/07/2001 - 04h10

Especialistas vêem mal crônico nas polícias

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ALESSANDRO SILVA
da Folha de S.Paulo

A polícia brasileira sofre de uma doença, como um resfriado. Em vez de espirrar e tossir, tem greve e aquartelamento. O pior é que ela não tomou remédio, mas apenas um chá qualquer que não cura e ainda pode agravar sua saúde.

É assim que especialistas em polícia analisam o cenário de seguidas paralisações no país. O quadro não é novo. Segue o roteiro de 97, ano em que 12 Estados tiveram movimentos semelhantes.

A vírus dessa moléstia descrita por estudiosos tem nome: insatisfação. Revolta contra os baixos salários, em relação às diferenças hierárquicas dentro da tropa, o regulamento disciplinar ultrapassado e a divisão de tempo entre o ""bico" e o emprego oficial, para citar apenas alguns dos motivos.

Dar o aumento salarial, no caso, é considerado um curativo e não um remédio definitivo. Mas a realidade não justifica o tipo de campanha salarial escolhida. ""É inaceitável ter trabalhadores armados, fazendo reivindicações", diz o cientista político Luiz Eduardo Soares, 47,
assessor de segurança da prefeitura de Porto Alegre e ex-coordenador de segurança pública do Rio de Janeiro.

Segundo ele, o país perdeu uma grande oportunidade de mudar a base da polícia após a greve de 97, quando apareceram no Congresso diversos projetos de reforma.

Falou-se na unificação das polícias -Civil e Militar-, na criação de um piso salarial nacional e em mudanças na estrutura, mexendo principalmente nos regulamentos disciplinares internos. Nada saiu do papel.

"A instituição policial toda está em crise", afirma o sociólogo José Vicente Tavares dos Santos, 52, do Grupo de Pesquisas da Violência e Cidadania da Universidade Federal do Rio Grande do Sul.

O policial de hoje, em geral, entra na tropa mais instruído, com o ensino médio, diferentemente do que ocorria no passado. Seu perfil mudou. Ele agora está mais perto de entidades associativas, de acordo com o sociólogo, utilizando inclusive técnicas de articulação de movimentos sociais, como levar mulheres e filhos para o aquartelamento nos batalhões.

Parte do problema vem do impacto na tropa da política de direitos humanos que chega ao país com o fim do regime autoritário, na década de 80. O mesmo policial que é cobrado para ter respeito pelo criminoso pode ser detido internamente, sem chance de defesa, caso se apresente ao quartel com o sapato sujo ou se atrase.

A greve em cadeia de 97 começou primeiro nos Estados onde a polícia era mais militarizada -Minas Gerais, Rio Grande do Sul e Pernambuco-, segundo especialistas ouvidos pela Folha.

"Militarismo exagerado, em vez de controle, incentiva ressentimento e revolta", afirma o coronel reformado da PM paulista José Vicente da Silva, 55, coordenador de pesquisas de segurança pública do Instituto Fernand Braudel de Economia Mundial.

É que polícia é polícia e Exército é Exército, segundo os estudiosos, com funções distintas, apesar de a Constituição considerar a primeira "força auxiliar" do segundo.

Para o coronel, a insubordinação vista nos últimos acontecimentos têm ligação com as disparidades na hierarquia das corporações. ""Quanto mais se foge do policiamento, há menos risco e mais salário", afirma, ao contar que um PM de São Paulo ganha mais com gratificação por trabalhar no Tribunal de Justiça do que com seu salário -o das ruas.

Por fim, os pesquisadores defendem a criação de uma única polícia, o que na prática significaria reduzir gastos e poderia ajudar a melhorar salários. Hoje, as polícias Civil e Militar têm tudo em dobro: duas academias de treinamento, duas centrais de rádio, duas bases para helicópteros, dois comandos, por exemplo.
 

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