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13/08/2001 - 09h23

Sem advogado, preso manda carta ao STF

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SILVANA DE FREITAS
da Folha de S.Paulo, em Brasília

Presos sem dinheiro para contratar advogado recorrem a um instrumento inusitado para tentar se livrar da prisão ou conquistar benefícios, como o direito ao regime semi-aberto: eles mandam cartas diretamente ao STF (Supremo Tribunal Federal).

Na correspondência, os presos empregam termos jurídicos, como "data venia" (expressão respeitosa com que se principia uma argumentação, ou opinião, divergente da de outra pessoa) e "douta Justiça", citam o artigo do Código Penal em que foram enquadrados, cometem erros de ortografia e afirmam que estão arrependidos do crime, na tentativa de obter perdão.

Eles utilizam esse expediente porque não têm a assistência de defensores públicos -advogados do serviço público que têm a missão de defender judicialmente pessoas sem recursos financeiros.

Há cerca de 2.500 defensores públicos e 223.220 presos no país, de acordo com dados de abril deste ano. Desse total de detentos, 149.355 são condenados. Os demais aguardam julgamento.

Não há estimativa referente ao número de presos com direito a deixar a cela por já terem cumprido o período de condenação ou por já terem atingido a fase de obter benefícios como a transferência para o regime semi-aberto.

Cartas

O STF recebeu 26 cartas só em junho, o primeiro mês do mandato do ministro Marco Aurélio de Mello na presidência do tribunal.

Agora, segundo a assessoria do presidente do tribunal, o ministro recebe de oito a dez cartas por dia. Todas as correspondências foram lidas por ele, encaminhadas à assessoria para verificar se havia recursos pendentes no próprio STF e, em seguida, remetidas ao fórum, que tem o poder para decidir esses casos.

Por falta de orientação profissional, as cartas são em geral uma espécie de recurso impróprio no foro errado. Quase todos os casos que chegam ao Supremo dependem da Justiça dos Estados.

Há inúmeros equívocos. Algumas correspondências têm o STF como destinatário no envelope, mas o texto é dirigido ao ministro da Justiça, José Gregori.

Outras são para o suposto juiz-corregedor do STF. Essa figura é inexistente na cúpula do Judiciário, mas está presente no imaginário dos presos porque é a responsável, na Justiça dos Estados, por corrigir falhas de outros magistrados. Nessa condição, caberia a esse juiz reparar erros, como injustiças contra condenados.

Um dos autores de uma carta ao STF apelou para o "senço de úmor e justiça (sic)" dos ministros: "Pesso ao senhor uma solução para os meus problemas e na esperança de poder contar com o senço de úmor e justiça dos senhores (sic)", escreveu Reginaldo Faria da Cruz, do Acre.

Genésio Mendes dos Santos, de Passos (RS), pediu permissão para cumprir a pena "na rua para a comunidade", referindo-se à prestação de serviços à comunidade, uma pena alternativa.

Manoel Reis Siqueira, de Bangu (RJ), começou a correspondência com três parágrafos de saudações e elogios, extensivos a todos os familiares e amigos do "senhor doutor ministro": "Em primeiro lugar, quero lhe desejar tudo de bom. Muita paz, saúde e projeção divina..." No final, pede o livramento condicional.

Manuscritos

A maioria das cartas é manuscrita. Alguns presos, como Edio Alves de Aquino, 61, assinam o texto com dificuldade e aparentemente dependem que outra pessoa o escreva. Além de apelos emocionais, também usam pelo menos um instrumento de pressão política, o abaixo-assinado.

Um grupo de 28 presidiárias da cadeia pública feminina de Pradópolis (SC), por exemplo, assinou uma carta ao "excelentíssimo ministro da Justiça, José Gregori", em que pedem a libertação de Valdirene Santos Zogo.

A moradora de Pirassununga (SP) Creuza de Lima Conceição enviou carta sustentando a inocência do filho Rodrigo Antonio da Conceição.

O motivo da condenação só é citado por alguns. Quando eles revelam, o fazem por meio da citação do artigo da legislação penal no qual foram enquadrados. Há casos de estelionato, tráfico de drogas e roubo, entre outros.


 

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