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15/09/2002 - 00h24

Trajetória expõe falhas de sistema no país

da Folha de S.Paulo

"Sem paletó não entra. E a senhora, vai vestir uma saia. Calça comprida não se permite", diz o agente a familiares de presos na entrada da Casa de Detenção. Os parentes saem e alugam roupas em bares vizinhos do presídio.

O diálogo foi reproduzido em jornal da capital, em 1975, no período em que o então diretor da unidade, o coronel Fernão Guedes, regulamentou por portaria que roupas as visitas deveriam usar.

Duas décadas depois, era por meio de bares ao redor do Carandiru que os presos recebiam telefones celulares: o parente colocava o aparelho sobre o balcão, com R$ 500 para que o balconista guardasse a encomenda até a vinda do funcionário "contratado". A história da Casa de Detenção expõe as várias falhas do sistema prisional do país.

Uma delas é a superlotação. O primeiro pavilhão da Detenção funcionou com 500 presos, até precisar ser aumentado. Sua capacidade cresceu ao longo dos anos para as atuais 3.500 vagas. "Cresceu como um câncer", diz o ex-secretário nacional de Justiça João Benedicto de Azevedo Marques, 63, que tentou desativar o presídio no primeiro mandato do governo Mário Covas.

Quadrilhas
Trezentos de dia e pouco mais de 70 funcionários à noite faziam a vigilância da cidade-prisão quando Marques era secretário da Administração Penitenciária em São Paulo (95 a 99). Se todos trabalhassem ao mesmo tempo, daria uma relação de um agente para 21,6 presos. Existiram plantões com cinco funcionários por pavilhão _um para 480 detentos.

"É impossível acreditar que se possa ter política penal eficiente em uma unidade com 7.000 presos em condições precárias", afirma o sociólogo Sergio Adorno, 50, coordenador do Núcleo de Estudos da Violência da USP (Universidade de São Paulo).

Sem controle do Estado, os líderes de quadrilhas expandiram seus poderes. Relatório da Corregedoria dos Presídios, de 86, diz que 70% dos presos da Detenção estavam sob o domínio de "quadrilhas". Essas organizações, segundo o documento, estariam explorando a prostituição, provendo a venda ilegal de bebidas e desviando alimentos para vendas internas, fora outros crimes.

Menos de uma década depois, a unidade estava tomada pelo PCC, a facção criminosa que parou 29 prisões ao mesmo tempo em fevereiro de 2001, e que agora se diz associada ao Comando Vermelho, do traficante Fernandinho Beira-Mar, do Rio de Janeiro.

"Se existe inferno, o inferno é aqui dentro. Tem de ter muito jogo de cintura para não morrer", afirma o preso P.S.S., 30, condenado a oito anos por tráfico de drogas, há dois na Detenção.

Do lado dos funcionários, a regra que pode salvar a vida é "distinguir o que está certo do errado", diz Chaves, 45, há dez anos trabalhando no temido pavilhão 9, local do massacre dos 111 detentos de outubro de 92.

"A palavra aqui conta muito. É preciso ver bem quando alguém comete algo de errado, antes de tomar alguma medida", afirma. Há na cadeia uma tradição de se assassinar alguém e arrumar um "laranja" para assumir a autoria.

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