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14/08/2003 - 04h08

Sem controle, hospitais reutilizam material

CLÁUDIA COLLUCCI
da Folha de S.Paulo

O Brasil não tem controle sobre a reutilização de materiais descartáveis usados em procedimentos médicos e cirúrgicos. Cateteres cardíacos, pinças de biopsias e drenos são exemplos de produtos que só têm garantia do fabricante quando utilizados uma única vez, mas que são usados pelos hospitais até o desgaste total.

Hoje não há fiscalização do número de vezes que esses materiais são reutilizados e nem das circunstâncias em que são feitas a sua limpeza e esterilização. Cada hospital tem a sua própria conduta e é o seu próprio fiscal.

Proibido

Em tese, uma portaria do Ministério da Saúde de 1986 proíbe a reutilização de qualquer tipo de material descartável. Mas, na prática, isso é rotina nos hospitais.

"Sabemos que a reutilização está disseminada tanto nos hospitais públicos como nos privados", afirma o diretor-presidente da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), Cláudio Maierovitch Henriques, 42.

O presidente da Federação Brasileira de Hospitais, Eduardo de Oliveira, 52, confirma: "Sem a reutilização, alguns procedimentos seriam inviáveis pelo alto custo dos materiais". Ele cita o exemplo de cateteres cardíacos, que chegam a custar R$ 5.000.

Há três anos a Anvisa tenta regularizar essa situação com a elaboração de uma portaria que estabeleça quais produtos serão de uso único e quais poderão ser reprocessados para outra utilização, desde que os hospitais apresentem um protocolo informando seus procedimentos para limpeza, esterilização, teste de funcionalidade e reembalagem.

Em 2001, a agência fez uma consulta pública para saber a opinião de todos os setores envolvidos na questão, mas a repercussão foi tamanha que até hoje não houve um consenso. De acordo com o diretor-presidente da Anvisa, a nova portaria deve se publicada até o final deste ano.

Regulamentação

Entre as propostas está a obrigatoriedade de que todos os materiais de uso único tragam em suas embalagens a seguinte expressão: "Uso único - proibido reprocessar". Pelo menos 30 produtos não poderão ser reutilizados --agulhas com componentes plásticos, bisturis descartáveis, bolsas de sangue, drenos, seringas, coletores de urina, dispositivos intra-uterinos, entre outros.

Conforme a nova proposta, fica proibida a comercialização de materiais reprocessados, prática adotada por alguns hospitais, conforme a Folha apurou. Ou seja, só as unidades de saúde que realizam ou solicitam o serviço de reprocessamento poderão utilizar o produto.

Henriques diz que a segurança dos materiais será de responsabilidade do estabelecimento que irá utilizá-lo ainda que o reprocessamento seja terceirizado. As penalidades em casos de desobediência vão de multas --de R$ 2.000 a R$ 1,5 milhão-- à interdição e fechamento do local.

Na opinião de Oliveira, devido à grande variedade de materiais utilizados, é quase impossível a Anvisa determinar regras fixas para as reutilizações porque isso depende do tipo de artigo empregado. "As comissões internas de controle de qualidade de cada hospital têm condições de decidir a melhor opção."

Para Marilsa Basso, presidente interina da associação paulista de controle da infecção hospitalar, é preciso adequar o tipo de material à possibilidade de limpeza. "Há certos equipamentos que contêm parafusos, engates, reentrâncias em que a limpeza é dificultada", explica Basso.

Por isso, na sua opinião, os hospitais deveriam questionar se realmente vale a pena reprocessar o material comparando o seu custo com o de um artigo novo.

Um dos maiores estudos realizados no país sobre a reutilização de materiais foi coordenado pelo infectologista Jorge Amarante, do Hospital Samaritano, com o apoio dos CDC (Centros de Controle e Prevenção de Doenças) dos Estados Unidos.

O trabalho, que avaliou a reutilização de cateteres de hemodinâmica e de angioplastia em 252 hospitais brasileiros, está servindo de base para a portaria que a Anvisa está elaborando.

Um dos pontos importantes foram os critérios adotados pelos hospitais para jogar fora o cateter (podem ocorrer vários problemas simultaneamente no instrumento): 92% dos casos de descarte foram por deformidade, 84,1% por oclusão do lúmen (luz), 69,8% por dificuldade de inserção, 63,5% pela presença de sangue ou matéria orgânica e 41,3% pelo número de reutilizações.

Critérios

Na opinião de Amarante, desde que se garantam os critérios de esterilidade e funcionalidade, a reutilização é uma prática que deve ser regulamentada no país.

Para a enfermeira Kazuko Graziano, 52, professora da Escola de Enfermagem da USP, hoje já existem processos protocolados que garantem a segurança dos artigos reprocessados. "Só não podemos continuar no piloto automático."
 

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