"Homem
de paz" manda soterrar centenas de civis
Cristina
Veiga
Equipe GD
Chamar
o primeiro-ministro de Israel, Ariel Sharon, de "homem
de paz" foi demais. Podia ter sido até um outro
tipo de elogio, mas "homem de paz" só mesmo
na cabeça do presidente do Estados Unidos, George W.
Bush. Como pode ser considerado uma pessoa de paz quem manda
matar centenas e centenas de civis. Que paz é essa
que invade cidades, bombardeia pessoas e destrói prédios
lotados de pessoas?
"É
como se tivesse havido um terremoto. É inaceitável,
um horror que supera o entendimento humano", descreveu
o enviado das Nações Unidas para o Oriente Médio,
Terje Roed-Larsen, ao deixar o campo de refugiados palestinos
de Jenin. "Os meios usados aqui são ilegítimos
e moralmente repugnantes", arrematou ele. Como podem
ser tão conflitantes duas opiniões sobre o mesmo
episódio? Que homem de paz é capaz de forçar
as pessoas a cavarem com as mãos a procura de seus
mortos?
Israel
justificou o cerco à cidade da Cisjordânia como
o esforço para prender cinco palestinos acusados do
assassinar, em outubro, o ministro do Turismo israelense,
o ultradireitista Reshavan Zeevi. Mas não precisava
fazer um estrago tão desproporcional. As organizações
de direitos humanos falam em 300 mortos. A situação
em Jenin é tão terrível que parece capaz
de reverter até mesmo o apoio da maioria da população
israelense à ofensiva comandada pelo primeiro-ministro
Ariel Sharon.
Leia
mais
- Para Bush, "Sharon é um homem de
paz"
- Bush
se diz 'satisfeito' com ações de Sharon
- ONU critica Israel por Jenin
- Enviado da ONU em Jenin: 'Parece terremoto'
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Para
Bush, "Sharon é um homem de paz"
"Sharon
é um homem de paz", disse ontem o presidente dos
EUA, George W. Bush, sobre o primeiro-ministro de Israel,
Ariel Sharon.
A declaração
contrastou com a posição do secretário-geral
da ONU, Kofi Annan, que pediu o envio de forças internacionais
armadas ao Oriente Médio para conter a escalada de
violência, e de seu enviado à região,
que chamou a ação israelense na Cisjordânia
de "episódio triste" na história de
Israel.
Autoridades
palestinas condenaram as declarações de Bush,
feitas após reunião com seu secretário
de Estado, Colin Powell, para ouvir seu relato sobre sua missão
ao Oriente Médio, encerrada anteontem, sem obter um
cessar-fogo.
Para os
palestinos, o presidente recompensou os "crimes de guerra
de Sharon"
"Bush apóia o terrorismo de Estado ao classificar
Sharon como um homem de paz, enquanto ele (o premiê)
segue com suas atividades terroristas contra os palestinos",
disse Saeb Erekat, principal negociador palestino.
Já
a posição de Annan foi elogiada pelas autoridades
palestinas. O secretário-geral da ONU fez as declarações
após receber relatório do enviado da ONU ao
Oriente Médio, Terje Roed-Larsen, sobre a situação
nas cidades palestinas ocupadas por Israel.
Para Bush,
Israel está cumprindo o combinado e está se
retirando dos territórios ocupados dentro do prazo
previsto.
Em 4 de
abril, no entanto, o presidente dos EUA já havia pedido
para os israelenses desocuparem "sem demora" as
cidades palestinas ocupadas.
O ministro
da Defesa de Israel, Benjamin Ben Eliezer, afirmou ontem que
a retirada de Jenin, Nablus e partes de Ramallah e Belém
deve acontecer até domingo.
Porém
Israel disse que continuará mantendo o cerco ao QG
do presidente da Autoridade Nacional Palestina, Iasser Arafat,
em Ramallah, iniciado no dia 29, até que ele entregue
acusados de matar ministro israelense, que estariam no local.
E também o cerco à Basílica da Natividade,
em Belém, onde cerca de 200 palestinos, muitos deles
armados, e clérigos estão refugiados desde o
início do mês.
O presidente
dos EUA demonstrou compreensão pela decisão
de Israel de continuar ocupando partes de Ramallah. "Eles
têm o direito de levar à Justiça esses
homens que mataram uma pessoa a sangue frio", afirmou
Bush, referindo-se ao ministro israelense.
Sobre
Arafat, o presidente insistiu mais uma vez que o líder
palestino pode fazer mais para combater o terrorismo. Porém
afirmou que "levará em conta" a recente declaração
de Arafat condenando os atentados contra Israel.
Segundo
analistas, o renovado apoio de Bush a Israel, quando o país
sofre críticas quase unânimes da comunidade internacional
pela devastação causada por sua ofensiva contra
o terrorismo palestino na Cisjordânia, iniciada no dia
29, estaria sendo motivado por pressões da direita
conservadora americana, que é contrária a qualquer
forma de negociação com Arafat e criticou os
encontros do secretário de Estado com o líder
palestino nos últimos dias.
Mas o
apoio dos EUA a Israel tem seu preço. O governo Bush
admitiu ontem que há uma erosão da imagem do
país no mundo árabe, mesmo em países
aliados, como Egito e Jordânia.
Bush viu
avanços na mediação de Powell, e negociações
prosseguem na região mediadas por enviados dos EUA.
O terrorista
saudita Osama bin Laden, que assumiu em vídeo seu envolvimento
nos atentados de 11 de setembro nos EUA, afirmou em fita divulgada
ontem, cuja data de produção não foi
determinada, que os EUA não terão segurança
enquanto os palestinos não tiverem paz.
(Folha
de S. Paulo - 19/04/02)
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ONU
critica Israel por Jenin
As críticas
sobre a atuação de Israel em Jenin se ampliaram
ontem. O enviado das Nações Unidas para o Oriente
Médio, Terje Roed-Larsen, da Noruega, esteve no que
restou do campo de refugiados e fez duras críticas
ao que chamou de ''métodos moralmente repugnantes''
usados pelo Exército para lutar contra o terror. Cedendo
ao volume de testemunhos que apontam para ações
violentas na cidade e no campo de refugiados anexo, o Conselho
de Segurança da ONU já estuda a possibilidade
de se pronunciar sobre o assunto - ao que os EUA se opõem.
''Esse
é um capítulo triste e desgraçado da
história do Estado de Israel'', disse Roed-Larsen.
''Não é só o que você vê,
é o que você cheira. Sente-se o cheiro de corpos
apodrecendo. O odor fétido está em toda parte''.
Lembrando que a operação deixou muitos sem comida
e abrigo, o norueguês afirmou: ''O que vou dizer a vocês
é o mesmo que já disse sobre o terrorismo: por
mais justa que a causa seja, os meios não o são.
Os meios usados aqui são ilegítimos e moralmente
repugnantes.''
Imediatamente
após a visita do enviado ao campo, porta-vozes do Exército
israelense reuniram dezenas de repórteres num palanque
improvisado, mostrando fotos aéreas e mapas para provar
que não houve um massacre no local, mas sim uma encarniçada
batalha. O alto comando defende que a operação
representou um duro golpe contra o que era tido como um dos
principais centros do terror palestino. As forças de
Israel se retiraram da cidade, mas ainda a mantêm cercada.
''A ofensiva
contra Jenin foi um sucesso retumbante para combater os atentados
que têm nos atingido de forma tão brutal. Capturamos
10 terroristas prontos para se suicidar. Já haviam
até gravado seus videotestamentos'', afirmou o coronel
Adir Haruvi. Segundo ele, suas tropas pagaram caro pelo cuidado
que tiveram com os civis palestinos: ''Perdi 23 dos meus homens.''
Roed-Larsen
refutou a lógica israelense, afirmando que a operação
- defendida como um ataque às infra-estruturas terroristas
- não diminuirá a violência. ''Tudo o
que foi feito não é do interesse da segurança
de Israel, pelo contrário'', disse ele. ''A infra-estrutura
terrorista mais importante é psicológica. Na
verdade, o que se produziu aqui foi uma forte infra-estrutura
terrorista, porque o ódio e a agressão chegaram
a um novo pico.''
A situação
em Jenin parece capaz de reverter até o apoio da maioria
da população israelense à ofensiva comandada
pelo primeiro-ministro Ariel Sharon. Diversos grupos pró-direitos
humanos israelenses já começaram a pressionar
a Suprema Corte para que investigue a atuação
do Exército. Analistas dizem que, se o episódio
se revelar algo similar ao massacre de palestinos em Sabra
e Chatila, no Líbano, a coalizão de Sharon perderia
o apoio dos trabalhistas e também o da população.
Ontem
o Conselho de Segurança da ONU iniciou seu debate sobre
o Oriente Médio com um aviso prévio. Os EUA
já anunciaram que usarão seu poder de veto caso
se proponha uma investigação dos acontecimentos
em Jenin.
O campo
de refugiados de tinha aproximadamente 1km e era habitado
por 13 mil pessoas. O Exército usou buldôzeres
para demolir diversos prédios, soterrando dezenas de
pessoas, segundo testemunhas. Não se sabe ainda o número
de mortos. Israel afirma serem pouco mais que 70, enquanto
as autoridades médicas locais estimam um número
entre 200 a 400. Até agora, 36 corpos já foram
recuperados, mas muitas famílias cavam com as próprias
mãos e retiram partes apodrecidas de cadáveres
dos escombros das casas.
(Jornal
do Brasil - 19/04/02)
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Enviado
da ONU em Jenin: 'Parece terremoto'
Um cenário
de terremoto. Foi assim que o enviado especial da ONU, Terje
Roed-Larsen, descreveu ontem o campo de refugiados de Jenin
em sua primeira visita ao lugar após a invasão
israelense na Cisjordânia. O relatório sobre
a destruição alarmou o secretário-geral
da ONU, Kofi Annan, que numa sessão privada do Conselho
de Segurança pediu o envio de tropas de paz para o
Oriente Médio com poder de intervenção,
idéia a que Israel imediatamente se opôs.
O campo
de refugiados foi cenário da mais violenta batalha
entre as forças israelenses e os combatentes palestinos
na Cisjordânia. A Cruz Vermelha Internacional, numa
primeira estimativa, afirmou que cerca de 800 das entre duas
mil e três mil residências do campo foram destruídas,
muitas delas demolidas por motoniveladoras. Moradores do campo
ontem procuravam parentes desaparecidos sob os escombros das
casas. Organizações de direitos humanos falam
em 300 mortos.
"É
como se tivesse havido um terremoto. É inaceitável,
um horror que supera o entendimento humano", criticou
Roed-Larsen. O enviado da ONU atacou duramente o governo de
Israel por não ter permitido a entrada das equipes
de socorro humanitário dias após o fim dos combates
no campo de Jenin. "É moralmente repugnante",
lamentou ele.
Os Estados
Unidos avisaram que vetarão qualquer tentativa na ONU
de aprovar uma resolução pedindo uma investigação
sobre o que ocorreu em Jenin. O presidente dos EUA, George
W. Bush, voltou a chamar o premier israelense, Ariel Sharon,
de "homem de paz", ao mesmo tempo em que pedia ação
contra o terrorismo ao líder palestino, Yasser Arafat.
Em tom dissonante com Washington, o chanceler da Grã-Bretanha,
Jack Straw, pediu um inquérito internacional para investigar
o que chamou de "uso desproporcional e excessivo da força"
por Israel em Jenin.
"Israel
tem o direito de se defender e os atentados suicidas aterrorizaram
seu povo, mas a ação deve ser proporcional",
disse ele.
O Exército
de Israel afirma que apenas umas cem casas foram destruídas
e alega que não deixou ninguém entrar no campo
por causa do risco de ainda haver explosivos nos cadáveres
soterrados. Os palestinos afirmam que houve um massacre em
Jenin com centenas de mortos - a maior parte civis - mas os
israelenses negam a acusação, tachando-a de
propaganda palestina.
Segundo
o Exército, as baixas palestinas não chegam
a cem, e o ministro da Defesa, Benjamin Ben-Eliezer, assegurou
que 45 dos 48 corpos de palestinos recuperados até
ontem portavam a insígnia do grupo extremista Jihad
Islâmica.
"As
investigações só começaram, mas
quando estiverem concluídas, mostrarão acima
de qualquer dúvida que não houve tal massacre",
disse o general Eial Shlain, comandante das forças
israelenses em Jenin.
Ontem,
o Exército começou a retirar-se de Nablus, partes
de Ramallah e de Jenin, mas vai manter tropas ao redor desta
última cidade, controlando suas vias de acesso, e no
campo de refugiados. As organizações humanitárias
começaram a remover escombros no campo de Jenin e,
segundo fontes palestinas, recolheram 14 corpos ontem. Em
Nablus, outros 35 foram enterrados.
Na França,
cerca de 250 cientistas e intelectuais fizeram um apelo pedindo
moratória nas relações culturais e científicas
com Israel até que o país inicie negociações
de paz e se submeta às resoluções da
ONU.
(O
Globo - 19/04/02)
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