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Para
socialite, "uma bananinha" mata a fome do brasileiro
Cristina
Veiga
Equipe GD
''Um país
em que qualquer um pode comer uma bananinha, um arrozinho...
Não existe fome. Aqui não sabem o que é
fome''. Não, não, não estão falando
da Suécia. É do Brasil mesmo. Só que
de um Brasil muito distante daquele vivido pela dona da infeliz
declaração: Josephina Jordan, que nasceu no
Egito e faz parte da alta sociedade carioca. Para ela, ''não
existe fome no Brasil'', conforme afirmou com seu sotaque
afrancesado.
Se depender
dela e de outras socialites cariocas será preciso um
segundo turno para aprovar a proposta petista de criar uma
gorjeta de 5% para acabar com a fome no país. Como
fazem toda semana, as nove senhoras da alta sociedade almoçaram
em um dos mais caros restaurantes do Rio e divergiram sobre
o combate à miséria. Antes de pagar R$ 540 pelo
almoço, elas discutiram a proposta do presidenciável
Luiz Inácio Lula da Silva.
A embaixatriz
Ieda Assumpção, por exemplo, discordou frontalmente
da idéia: é ''demagógica e desnecessária'',
acha. Detalhe: ela viveu anos na Índia, um dos países
com maior índice de miséria do mundo, acompanhando
o marido embaixador. A fazendeira Kiki Almeida Braga já
disse que ''ficaria até muito contente'' em dar a gorjeta
maior, embora prefira continuar ajudando um asilo. Ao final
do almoço, a mesa dividiu-se em quatro votos a favor
da proposta, quatro contra e uma abstenção.
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'Não
há fome no Brasil'
A polêmica
proposta do presidenciável Luiz Inácio Lula
da Silva de criar gorjeta de 5% para ajudar a acabar com a
fome no país rachou o Antiquarius. No almoço
de ontem no restaurante do Leblon, um dos mais sofisticados
do Rio, a mesa mais estrelada, enfeitada por nove representantes
da alta sociedade carioca, dividiu-se em quatro votos a favor
da proposta, quatro contra e uma abstenção.
Nada que chegasse a estragar a digestão das socialites,
que há seis anos, lideradas por Evinha Monteiro de
Carvalho, reúnem-se uma vez por semana em algum restaurante
caro da cidade.
Falar
em fome soa deslocado no Antiquarius, onde quem quiser saborear
um bom Petrus 92 (safra que nem é das mais brilhantes)
tem que desembolsar R$ 3.500, sem contar a gorjeta. O valor
equivale à conta de 3.500 refeições no
restaurante popular da Central do Brasil, ou a 44 cestas básicas.
Pontuadas com críticas ao ex-ministro da Fazenda Ciro
Gomes (PPS), ao governador Anthony Garotinho (PSB) e, é
claro, a Lula, a discussão que começou após
a degustação de toucinhos do céu e barrigas
de freira revelou posições inconciliáveis,
mas ninguém falou em trocar o Rio por Miami.
A disputa
precisaria de um segundo turno. Entre as socialites que se
arrepiaram só de ouvir a idéia de pagar 5% a
mais em cada almoço ou jantar fora estavam Evinha Monteiro
de Carvalho, leia-se grupo Monteiro Aranha (um dos mais poderosos
do país), Ieda Assumpção (''o-de-io quando
escrevem sem o P''), Teresinha Noronha e Josephina Jordan.
Aplaudiram a proposta a fazendeira Kiki Almeida Braga, Gilda
Sarmanho, Ruth Cohn e Perla Matteson. Quem daria o voto de
minerva se esquivou da tarefa alegando razões de bom
gosto. ''Isso é conversa séria. Não é
para falar no almoço, tomando vinho'', reclamou Maria
Roberto, viúva do arquiteto Maurício Roberto.
Não
houve consenso sequer sobre a importância de um debate
sobre a fome. Nascida no Egito, a socialite Josephina Jordan
questionou o destaque dado à questão. Para ela,
há assuntos mais importantes a serem discutidos por
aqui, como saúde e educação. ''Não
existe fome no Brasil'', declarou, enfática, com seu
característico sotaque afrancesado. ''Um país
em que qualquer um pode comer uma bananinha, um arrozinho...
Não existe fome. Aqui não sabem o que é
fome'', enfatizou. ''E não sabem o que é frio
também. Basta um short'', acrescentou, antecipando-se
a uma possível campanha do agasalho.
Casada
com um importante empresário que tem negócios
nos setores bancário e de mineração,
Ruth Cohn vociferou contra o candidato petista, mas, curiosamente,
não poupou elogios à idéia da ''CPMF
da fome''. ''Eu sou contra o Lula, mas 5% eu topo. Tudo o
que o rico puder dar para o pobre eu acho bom'', concedeu.
Outra socialite, Perla Mattison, que se apresentou como ''aposentada'',
também aprovou a gorjeta compulsória. ''Se for
para elevar o nível dessas pessoas e aumentar a dignidade
dessa gente, dou com prazer'', afirmou, antes de filosofar:
''Temos que fazer o que for possível para melhorar
a condição humana''.
A embaixatriz
Ieda Assumpção discorda frontalmente. Para ela,
a proposta é ''demagógica e desnecessária''.
Deve saber do que fala: viveu anos na Índia, país
associado à miséria, acompanhando o marido embaixador.
''É preciso fazer tudo para ajudar os pobres, mas o
caminho não é esse'', concordou Teresinha Noronha,
casada com um executivo e autodenominada ''dona-de-casa lúcida''.
Ela profetiza mais uma derrota de Lula em eleição
presidencial se continuar com ''idéias como essa''.
''Sou cristã, precisamos ajudar na recuperação
dessa gente'', diz, mas sem explicar como faria isso. Teresinha
só elogia a proposta de Lula de aumentar os impostos
sobre bens supérfluos como cigarros e bebidas alcóolicas
a fim de compor um fundo contra a miséria. ''Eu não
fumo nem bebo horrores mesmo'', explicou.
Mais altruísta,
a fazendeira Kiki Almeida Braga disse que não teria
problema em desembolsar 5% a mais se o dinheiro servisse efetivamente
para o resultado proposto. ''Ficaria até muito contente'',
disse ela, que pertenceu a uma das famílias mais ricas
e conhecidas do país (Bradesco, Banco Icatu...) e hoje
costuma contribuir para um orfanato e um asilo de irmãs
paulinas em Petrópolis. ''Mas prefiro ajudar o asilo.
As pessoas não ligam para os velhos'', lastimou.
A principal
entusiasta da idéia da ''CPMF da fome'' foi a ex-embaixatriz
Gilda Sarmanho. ''Acho 100% a idéia do 5%'', elogiou.
''É muito bom ajudar os pobres, um prazer até.
Mas o dinheiro tem que ir para eles'', ressaltou, manifestando
uma desconfiança comum ao resto do grupo. Afinal, muitos
dos maridos ausentes têm ou tiveram negócios
com o governo federal.
Foi Gilda,
aliás, quem pagou a conta. Por uma questão de
etiqueta, não revelou o valor. Mas não foi difícil
fazer o cálculo: entrada (caldo verde), prato principal
(bacalhau Antiquarius), sobremesa (doces portugueses) e bebidas
(água mineral, refrigerantes, caipirinha de lima de
pérsia, vinho branco e tinto, ambos portugueses, da
Fundação Eugênio Almeida 99) custaram
cerca de R$ 540. Um preço módico para o PF de
luxo em um dos restaurantes mais caros da cidade. ''É
que teve um desconto'', explicou um funcionário do
Antiquarius.
Ontem,
Lula explicou melhor o projeto. Apesar de ter apresentado
a proposta - que, segundo sua assessoria, representa seu pensamento
- o presidenciável petista faz questão de não
se comprometer totalmente com as idéias do Projeto
Fome Zero. ''O documento do Instituto de Cidadania é
uma proposta de discussão. Estamos abertos às
sugestões da CUT, do MST e de todos as entidades e
pessoas que queiram contribuir para a erradicação
da miséria. Se Olavo Setúbal (banqueiro do Itaú,
que se reuniu com Fernando Henrique Cardoso na semana passada)
tiver contribuições a oferecer, elas serão
analisadas sem preconceito. Depois das discussões,
será feito um documento definitivo, que será
aprofundado e votado numa convenção do PT. E
eu só o defenderei, a partir de 16 de outubro, se concordar
com ele.''
Lula rebateu
críticas como a do dono do Quadrifoglio, Gustavo Werneck,
vice-presidente da Associação Brasileira de
Proprietários de Restaurantes no Rio, que acha que
nos restaurantes mais baratos o problema seria ainda maior,
pois a margem de lucro é menor. ''É óbvio
que a pessoa que toma uma média com pão com
manteiga no balcão de um bar não terá
de pagar 5% a mais'', diferenciou. ''Pelo que entendo da proposta,
ela só se aplica para restaurantes que dão nota
fiscal, os mais caros. De minha parte, quando comer um camarão
à provençal, ficarei satisfeito que 5% do que
eu pagar seja destinado aos pobres. E minha satisfação
aumentará se o camarão estiver gostoso.''
(Jornal
do Brasil)
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