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REFLEXÃO


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urbanidade
04/05/2005
Presente inédito no Dia das Mães

O corretor de seguros Mário Pedro Lagus descobriu um jeito de tornar mais agradável o congestionado trajeto entre sua casa, na Cidade Jardim, e o escritório, em Higienópolis: adotou um pedaço da paisagem. Desde o início deste ano, ele resolveu preservar três praças públicas em seu caminho entre a casa e o trabalho, um percurso de ida e volta que, por causa do trânsito, pode levar mais de duas horas.

Estavam sujas e o mato se espalhava, alto, por todos os lados. Depois de acertar uma parceria com a prefeitura, passou a mantê-las limpas, auxiliado por um jardineiro. "Todos os dias, dou uma espiada para saber se tudo está em ordem." A adoção deu-lhe um inusitado prazer visual. "É como se eu pertencesse à paisagem."
Não é apenas uma questão estética. Tem a ver também com uma sensação de dívida pessoal. Seus pais -Edgar e Gerda- vieram ao Brasil fugidos da Alemanha e enfrentaram, durante 17 dias em alto-mar, o pior trajeto de suas vidas, metidos no porão de um navio.

Quando desembarcaram em Santos, não tinham dinheiro e desconheciam a língua portuguesa. O casal prosperou. Edgar conseguiu um bom emprego, comprou casa e assegurou boa educação aos filhos, mas morreu cedo, quando Mário ainda era adolescente. "Não pude fazer faculdade. Tive de trabalhar."

Ao decidir tomar conta das praças, lembrou-se dos pais, desesperados, fugidos do nazismo. "Como muitos imigrantes e migrantes, sinto uma dívida com o Brasil no geral e com São Paulo, onde nasci, em particular."

Apesar de a lei permitir, Mário tinha decidido não colocar nem seu nome nem o de sua empresa como patrocinadora da preservação de locais públicos. Bastava-lhe o prazer íntimo de ver todos os dias um espaço bonito. Ontem, mudou de idéia e resolveu fazer uma homenagem. Numa das praças, colocará, discretamente, na placa destinada ao patrocinador, dois nomes: Edgar e Gerda Lagus. "É um jeito de mantê-los vivos nesta cidade em que encontraram abrigo durante a guerra."

Para Gerda não será uma homenagem póstuma. Vivíssima em seus 90 anos, terá um privilégio especial neste mês: é a primeira mulher de que se tem noticia na cidade a ter nome em praça pública como presente no Dia das Mães. E por apenas R$ 150 por mês, isso é o que custa manter cada praça.

Coluna originalmente publicada na Folha de S. Paulo, na editoria Cotidiano.

   
 
 
 

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