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REFLEXÃO


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urbanidade
23/03/2005
A pizza acabou em filme

Pela primeira no Brasil, a pizza transforma-se em protagonista de um filme. Seu cenário como não poderia deixar de ser- é São Paulo, onde, no final do século 19, começou a ser vendida de madrugada, na rua, para operários italianos até virar a estrela popular da culinária paulistana.

Por trás desse projeto, há um personagem tão identificado com a cidade quanto a pizza. É Ugo Giorgetti, descendente de italianos, apaixonado por cinema, São Paulo e pizza. Em quase todos os seus filmes e documentários ("Sábado", "O Príncipe" e "Boleiros", por exemplo), a cidade é sempre um misto de cenário com personagem.

Na infância em Santana, onde nasceu na década de 40, fazia das ruas, então povoadas por judeus, espanhóis, italianos e poloneses, a extensão de sua casa, com suas brigas e brincadeiras. Jovem, andava de madrugada pelo centro, conversando com os amigos. "Em geral, discutíamos cinema." Não havia a preocupação com os assaltos.

Desaparecia o aconchego provinciano à medida que a cidade se fragmentava, rumo à periferia, em uma infinidade de pedaços desconexos, tomados pelos carros e murados pela violência. Mas Giorgetti não desistiu das caminhadas. "Sou andarilho, sempre ando pelas ruas. Só assim consigo sentir de verdade a cidade."

No ano passado, ele percorreu a trilha da pizza, formada de conexões por toda a cidade. Visitou pizzarias nos mais diferentes bairros, do Jardim Ângela ao Brás, passando pelos Jardins. Seguiu motoqueiros fazendo entregas nas mansões do Jardim Europa e nas casas sem número de uma favela. Documentou as correrias dos "valets". Entrevistou pizzaiolos, nenhum deles italiano. "Quase todos são nordestinos." Percebeu que, num aspecto, todos se parecem. "Sempre juram, do Jardim Ângela ao Jardim Europa, que usam os melhores ingredientes."

No final das gravações para o documentário, a ser exibido neste ano, Giorgetti tinha ganhado alguns quilos -"impossível ficar sem comer a especialidade da casa" -e a sensação de que, nesta cidade fragmentada e murada, o prazer de degustar uma pizza é um dos poucos elos entre os habitantes. É como se essa conexão gastronômica trouxesse de novo o gosto da Província -e com cheiro de mozarela.

Coluna originalmente publicada na Folha de S. Paulo, na editoria Cotidiano.

   
 
 
 

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