Brasil
vira provão de Lula
A passeata
de servidores públicos contra a reforma previdenciária
foi uma farsa -e a prova disso está em uma pesquisa
do IBGE divulgada no dia seguinte ao protesto.
Durante
a manifestação realizada na quarta-feira passada
em Brasília, os servidores atacaram o PT, acusando-o
de estar a serviço dos poderosos e contra os direitos
dos trabalhadores. Tentaram vender a idéia de que os
servidores representam o bem na guerra contra o mal do mercado.
Desfaz-se
rapidamente essa farsa, embalada pelos radicais do PT, com
a leitura da pesquisa do IBGE, que mostra que, sai governo,
entra governo, o nível de distribuição
de renda permanece igual. No topo da pirâmide, de acordo
com a pesquisa, aparecem -e não poderia ser diferente-
os patrões.
Mas, em
segundo lugar, estão os servidores civis e militares,
beneficiados por um rendimento bem superior à média
salarial dos trabalhadores. Apenas uma minoria deles será
obrigada a descontar o valor de suas aposentadorias caso a
reforma seja aprovada, corrigindo um óbvio absurdo:
o de viver, na aposentadoria, com um valor maior do que aquele
de que dispunha na ativa.
Além
de estarem no topo da pirâmide de renda, eles se aposentam
mais cedo, com o valor do salário integral, e aí
já não descontam mais imposto. De resto, vivem
uma estabilidade no emprego paradisíaca diante da insegurança
geral. O custo desse indiscutível privilégio
são os bilionários buracos no Orçamento
bancados pelo contribuinte.
Na sexta-feira,
soubemos que, apesar da "paradeira" econômica,
a arrecadação de impostos federais bateu um
recorde. Atingiu, em maio, R$ 22,1 bilhões. Não
é necessário ser um expert em questões
fiscais para suspeitar de que algo esteja doente em um país
em que os empresários lucram menos e se atolam em dívidas
e os trabalhadores ganham menos e perdem empregos, enquanto
o governo arrecada mais.
Nunca
a sociedade, onde estão aqueles que vivem a insegurança
do desemprego e da violência, transferiu tanto dinheiro
para seus governantes -essa é, de longe, a principal
questão política brasileira, e só não
explode por acomodação ou por ignorância
da classe média.
A combinação
da escassez de possibilidades com a abundância de expectativas
sociais deixará cada vez mais acuados tanto os grupos
empresariais que são ajudados com facilidades fiscais
e os segmentos financeiros que ganham dinheiro fácil
na crise como o próprio governo, incansável
sugador de recursos.
Novidade
mesmo é que essa descoberta venha sendo realizada,
no Brasil, pela esquerda, que começa a perceber que
rombos orçamentários para manter privilégios
públicos são tão graves para o bolso
do trabalhador como a taxa de juros.
Mais:
o que se imagina ser um direito nem sempre é a melhor
proteção do trabalhador. E acaba não
dando direito a nada. Assessores próximos do presidente
Lula admitem, ainda que reservadamente, que manter a inflexibilidade
dos direitos trabalhistas talvez não seja o melhor
caminho para gerar empregos e enfrentar a falta de recursos
da Previdência.
Tal dúvida
é reforçada pela pesquisa do IBGE: 54% da população
ocupada não contribuiu para a Previdência. Significa,
no presente, menos dinheiro arrecadado e, no futuro, milhões
de pessoas sem nenhuma proteção. Muitas vezes,
os sindicatos representam apenas os trabalhadores de carteira
assinada, a elite dos trabalhadores.
Políticos
e intelectuais que se imaginam de esquerda, talvez saudosos
de bandeiras transgressoras, talvez incomodados com a falta
de charme do situacionismo, acreditam estar defendendo os
trabalhadores. No entanto, como mostram os números,
somente dão sustentação ideológica
a privilégios da elite.
Há muita gente que já deve estar percebendo
(e temendo) uma nova regra. Na busca de recursos para investimentos
sociais, o trâmite de recursos será cada vez
mais transparente. E os embates por recursos, cada vez mais
duros.
Simplificar,
dividir o mundo entre bons e maus, faz parte do mundo das
bravatas, porém a realidade fora dos palanques é
complexa e cheia de nuances. Lula que o diga: "As coisas
são muito mais difíceis do que a gente imaginava".
PS - Quando
eu questionava neste espaço se Lula estava adequadamente
preparado para governar -não pela falta de diploma,
mas por não mostrar conhecimento sobre a complexa realidade
que enfrentaria-, diziam que se tratava de preconceito. Ele
está pagando por esse despreparo: acreditava de verdade
que bastaria vontade política para que o Brasil voltasse
a crescer e a distribuir renda. Nem sequer conseguiram implementar
direito o programa contra a fome, mas vamos reconhecer que
o aprendizado dele é rápido e para bem melhor.
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