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O diploma de Lula

Uma das melhores estatísticas para medir a discriminação contra os negros brasileiros está na lista de aprovados da Universidade de São Paulo. É uma lista branca: em 2001, apenas 5,1% dos que entraram nos cursos de biológicas eram negros ou pardos. Para medicina, a média desce para 3,3%. É um pouco abaixo do percentual dos que ingressaram na Faculdade de Direito: 4%.

Em maior ou menor grau, essas restrições acontecem em todo o país nas universidades públicas e estimulam um movimento nacional para a reserva de vagas a alunos pelo critério da cor ou da condição econômica. Seguindo a experiência do Rio, a Universidade do Estado da Bahia (Uneb) anunciou, na semana passada, que 40% das vagas de graduação e pós-graduação (mestrado e doutorado) serão asseguradas para negros e pardos.

Na Bahia, ícone da cultura negra brasileira, nada menos que 98% dos formados nas universidades públicas são brancos, informa a direção da Uneb, ao justificar a política de cotas.

Um dos movimentos sociais mais férteis do Brasil que se espalham pelas periferias das cidades brasileiras são os cursinhos pré-vestibulares gratuitos; uma das experiências mais antigas (e notáveis) é o cursinho criado pelos alunos da Escola Politécnica da USP, com 15 mil vagas.

Com a explosão do ensino médio combinada com as exigências do mercado de trabalho, obter diploma virou um sonho de consumo das camadas populares. Cada vez mais relaciona-se o direito ao emprego e ao bom salário com canudo acadêmico.

A falta de escolaridade é um dos principais obstáculos da candidatura Lula, não apenas por causa das restrições das elites, mas também de amplos setores mais pobres que vinculam desempenho profissional ao nível de escolaridade, simbolizado no diploma. Daí se entende, em parte, o bom desempenho de Ciro Gomes, agora isolado no segundo lugar da disputa presidencial.

Num congresso de agricultores, na semana passada, Lula tentou desmerecer a importância do diploma: "A sabedoria de um homem não está na quantidade de anos que ele passou na escola, mas na sua formação de berço, no caráter e no compromisso com sua família, sua cidade, seu Estado, seu país". No dia anterior, em entrevista à imprensa, afirmou que não se aprende política na escola. "É uma questão de sentimento e de compromisso."

Lula está certo ao valorizar a paixão e a prática. Como mostrou reportagem de capa do Sinapse, suplemento sobre conhecimento lançado na terça-feira passada pela Folha, o fundamental do processo de aprendizado é observação e experimentação. As empresas olham com mais atenção a bagagem de experimentações dos funcionários do que propriamente o diploma.

Raros políticos brasileiros conhecem como Lula tão de perto a miséria brasileira (até porque ele experimentou na carne o sentido da pobreza). Deve-se ao seu partido as melhores soluções contra a pobreza. O PT foi quem primeiro alardeou, no Brasil, a idéia da renda mínima e desenvolveu o bolsa-escola, aplicou o orçamento participativo e promoveu o médico de família antes de virar política nacional.

Lula não conseguiu, entretanto, superar a falta de diploma e de experiências administrativas (nem sequer suportou a vida parlamentar) e preferiu deixar de lado as ofertas para passar um tempo no exterior dedicando-se aos estudos. Está, mais uma vez, pagando caro por essa arrogância de quem confia em excesso no carisma.

Ciro ocupa, em larga medida, esse espaço acadêmico. Apresenta-se como oposição e arrebanha eleitores de Lula. Por ter sido prefeito, governador e ministro, além de professor, vende a imagem de confiável. Na semana passada, ficou ainda mais à frente de José Serra, que tem todos os títulos da vida acadêmica, na qual, como diz Lula, não se aprende política. O candidato oficial ainda não demonstra habilidade de agregação e capacidade de comunicação com as massas.

A afetação privada de Serra é visível na esfera pública, o que faz com que os governistas depositem a esperança redentora no marqueteiro Nizan Guanaes. Se Lula ainda tem de provar experiência e Ciro, maturidade (as brigas que está montando com a imprensa são inequívoco sinal de leviandade e o fazem parecer com Collor), Serra não exibe talento comunicativo -um ingrediente indispensável para um presidente da República.

Qualquer eleito vai ter de mostrar agilidade administrativa, maturidade para enfrentar as pressões de uma sociedade vulnerável econômica e socialmente, além do dom de comunicação permanente com os cidadãos.

PS - Criar cotas na universidade sem oferecer bons programas de reforço para recuperar o tempo perdido do aluno é jogar uma idéia no lixo. Para quem quiser mais dados sobre ensino superior e discriminação, separei uma coletânea de artigos na página do Aprendiz.

 
 
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