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03/03/2008

São Paulo sem ar

Poluição atmosférica volta a crescer na região metropolitana, enquanto o poder público adia as medidas mais urgentes


Com 6 milhões de veículos rodando na cidade e 2,4 habitantes por carro, não chega a surpreender que a poluição do ar tenha aumentado em São Paulo. Mais preocupante é a reversão da tendência de queda nos índices, que se observava há cinco anos: de 167 medições de ar inadequado na cidade em 2006, registraram-se 257 em 2007. Um acréscimo, portanto, de 54%.

O controle é feito de modo contínuo pela Cetesb (Companhia de Tecnologia de Saneamento Ambiental) em 24 estações da região metropolitana. Vários compostos tóxicos são monitorados. Ponderados, resultam numa escala de cinco graus de qualidade do ar (boa, regular, inadequada, má e péssima).

Quando a qualidade é regular, apenas pessoas de grupos sensíveis, como idosos e crianças, sofrem problemas de saúde. Se é inadequada, toda a população pode apresentar sintomas. Estudo do Laboratório de Poluição Atmosférica Experimental da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo estima que a poluição do ar na região metropolitana cause 3.000 mortes prematuras por ano.

A poluição aumenta por vários fatores, além do simples incremento da frota. Dos cerca de 800 novos veículos emplacados em São Paulo a cada dia, mais de 200 são motocicletas, que lançam até seis vezes mais poluentes na atmosfera do que os automóveis. Há 650 mil motocicletas trafegando pela cidade. Mais mobilidade para poucos e mais contaminação para todos.

Outro fator importante são os veículos a diesel, responsáveis por cerca de metade das emissões de partículas finas, uma das maiores ameaças à saúde. A Petrobras distribui no país um dos piores óleos diesel do mundo, com alto teor de enxofre. São 500 partes por milhão (ppm) em 237 cidades grandes e absurdas 2.000 ppm noutras localidades. Nos EUA, toleram-se 15 ppm.

Resolução de 2002 do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama) estipulava que, em janeiro de 2009, esse combustível deveria ter no máximo 50 ppm de enxofre. A Petrobras diz que não poderá cumpri-la. Assim se enfrentam, como é comum no Brasil, problemas de saúde pública tão graves quanto esse, que afeta a vida de mais de 18 milhões de pessoas.

Outra ferramenta crucial para combater a poluição do ar em São Paulo é a inspeção veicular, que inclui verificação da regulagem dos motores. Deveria ser implantada na cidade neste ano, mas a prefeitura adiou para 2009 a inspeção de veículos leves. Em 2008, a medida só vale para motores a diesel, ou 400 mil veículos. Aplicada a toda a frota, estima-se que reduziria em 35% a 40% a emissão de poluentes.

De omissão em omissão, de adiamento em adiamento, a poluição do ar paulistano e as mortes por ela induzidas vão se acumulando. Como o país deverá continuar a crescer, e também os congestionamentos, um dia São Paulo terá de encarar medidas muito mais drásticas, a exemplo da cobrança de pedágio urbano, como uma questão, literalmente, de sobrevivência.

Editorial
Folha de S.Paulo