Um
grafiteiro suspenso no ar
Em sua
última edição, a revista "Trip"
defendeu a idéia de que a grafitagem, concentrada essencialmente
em São Paulo, é o único movimento organizado
de artes plásticas no Brasil - uma alternativa para
jovens da periferia, tão distantes das galerias, saírem
do anonimato, transformando muros em telas públicas.
Mal a
revista saiu nas bancas, um desses jovens condenados ao esquecimento,
cujo trabalho apareceu na reportagem, morreu. Alexandre Luiz
da Hora, o Nigazz, afogou-se, no dia 1º de maio, na represa
Guarapiranga.
Escapou
do anonimato. Além de deixar sua identidade nas pinturas
que espalhou pela cidade, ajudou a desenhar uma nova profissão:
agente comunitário de artes. "O Nigazz falava
muito em morte, mas, ao mesmo tempo, falava muito no futuro",
conta a amiga Natália Girassol.
O futuro
se abriu para ele no ano passado, quando começou a
experiência do agente comunitário de artes: recebia
uma bolsa mensal para revitalizar a cidade e educar novos
grafiteiros. Era um projeto piloto para promover jovens da
periferia, dando-lhes renda, perspectiva profissional e complementação
educacional para evitar o círculo vicioso da marginalidade.
Trabalhou
na recuperação de vários muros e praças,
como a Ana Maria Popovic, no Sumaré. Deixou suas marcas
na obra mais polêmica já feita por grafiteiros
na cidade: desenharam de alto a baixo, com cores berrantes,
o aristocrático (e totalmente branco) casarão,
sede de um banco, na avenida Paulista.
Preparava-se
para comercializar suas obras - recebera uma encomenda da
Nike, dos Estados Unidos - e planejava entrar na faculdade.
"Ele estava vivendo uma efervescência em seu aprendizado",
relata o grafiteiro Ciro Schuneman.
Apesar
do progresso, não conseguia esconder a melancolia.
"Quando ficava triste, bebia até cair", conta
Mônica Alves, estudante de arquitetura com quem trabalhava.
Como muitos jovens da periferia, enredou-se, desde menino,
no álcool.
Na madrugada
de 1º de maio, bêbado, pediu que os amigos o deixassem
sozinho. Se escorregou ou se deixou ser levado pelas águas
é um mistério semelhante aos personagens de
seus grafites, que sempre parecem estar despencando, suspensos
no ar. No próximo dia 14, Nigazz faria 21 anos. Não
teve futuro, mas ganhou passado. Amigos vão preparar
uma exposição com suas obras em tela no único
espaço digno de um grafiteiro: a rua.
|
|
|
Subir
|
|
|