O
arquiteto da "cracolândia"
A "cracolândia"
se tornou o melhor símbolo da degradação
paulistana. Foi nesse cenário que o arquiteto Paulo
Bastos, responsável pela reforma da catedral da Sé,
desenhou uma revolução urbana.
Nascida
nas imediações de onde, no passado, morava a
aristocracia, instalada nos bairros da Luz e dos Campos Elíseos,
a "cracolândia" ganhou, no imaginário
da cidade, o status de nação independente. Na
década de 90, crianças consumiam-se no crack
pelas calçadas ao mesmo tempo em que hotéis
se prestavam a escritórios clandestinos para os mais
diversos tipos de delinquência -do tráfico de
drogas e da exploração da prostituição
infantil até o contrabando destinado aos camelôs.
A degradação
que afasta a maioria das pessoas é o que encanta Paulo
Bastos. Criado entre judeus e italianos numa vila operária
do Brás, ele vê na "cracolândia"
a oportunidade de fazer aquilo de que mais gosta. "Sou
rato da cidade", define-se. "Adoro vasculhar o passado
esquecido em nossas ruas, casas, prédios."
A pedido
da prefeitura, ele elaborou um projeto para remodelar a região.
Os casarões antigos, agora cortiços, seriam
recuperados e, com menos apartamentos por andar, seriam entregues
à população de baixa renda. Prédios
comerciais e residenciais seriam reformados e, depois, vendidos
com financiamento mais generoso.
Pelo projeto,
imóveis seriam demolidos. No lugar, surgiriam duas
grandes praças, cada uma do tamanho aproximado de dois
campos de futebol. Essas áreas de lazer e convivência
se ligariam à Sala São Paulo, ao Dops, à
Universidade Livre de Música, ao jardim da Luz, à
estação da Luz (futuro Memorial da Língua
Portuguesa) e à Pinacoteca do Estado. Já é
plano da prefeitura unir por meio de calçadão
todas essas instalações, integrando-as como
se fossem um só parque cultural.
Para quem
o considera sonhador, talvez alucinado como aquelas crianças
que habitam a "cracolândia", ele responde
que o projeto tem viabilidade econômica, a exemplo de
experiências em várias cidades do mundo. Lembra
que o entorno da região ainda tem um comércio
próspero, mais especificamente o da rua Santa Ifigênia
e o do Bom Retiro. "Muita gente quer viver perto de onde
trabalha." Não falta transporte público
e ainda vai ficar melhor -a estação da Luz será,
com a entrega da linha 4, o principal ponto de confluência
do metrô na cidade.
Não
é desvario, segundo ele, viajar no tempo e imaginar
que, se, no passado, era o café que movimentava o bairro
e, depois, foram droga e contrabando, no futuro, quem sabe,
poderá ser a cultura.
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