A
galinha, o veado e o futuro
O estudante universitário Manuel Bonduki
conseguiu, nesta semana, o direito de ser lembrado daqui a
cem anos, mais precisamente em 11 de agosto de 2103.
Animados por goles de cerveja em um bar da Vila Madalena,
integrantes do Centro Acadêmico XI de Agosto, entre
os quais Manuel, discutiam idéias para as comemorações
do centenário do grêmio, iniciadas na segunda-feira
passada.
Queriam algo que fosse além dos discursos
solenes.
Manuel propôs, então, um projeto
que durasse um século. Uma pretensão que inicialmente
foi entendida pela pequena platéia como uma daquelas
obras de inspiração etílica tão
comuns em mesas de bar. Sugeriu que enterrassem no largo São
Francisco, onde está a Faculdade de Direito, uma urna
para ser aberta quando o XI de Agosto comemorasse seu bicentenário.
"Virou uma brincadeira coletiva", diz Manuel.
A urna atiçou a imaginação
criadora não só dos alunos mas dos moradores
e das pessoas que trabalham no centro, especialmente dos advogados.
Velhinhas deixaram cartas para serem abertas por seus familiares;
garçons enviaram os cardápios de seus restaurantes.
Irônicos, alunos depositaram monografias escritas por
professores da faculdade e exigidas por eles próprios
como leitura obrigatória nas provas, para saber se
resistirão ao tempo.
Manuel preferiu tirar fotos dos contrastes
sociais do centro para serem avaliadas na posteridade. "Será
que daqui a cem anos, quando abrirem as urnas e virem as fotos,
vão sentir pena da gente?", especula Manuel.
Se a primeira turma de estudantes do XI de
Agosto tivesse depositado em uma urna as fotos da época
para serem vistas agora, o cenário seria mais elegante,
dificilmente se registrariam imagens de meninos de rua, de
camelôs e de pedintes. Sonhando em ser uma metrópole
de estilo europeu, São Paulo tinha, na época,
240 mil habitantes, e bondes eram puxados por burros pelo
viaduto do Chá, onde era cobrado pedágio. Provavelmente,
nenhum estudante se imaginaria jogando uma galinha numa mulher,
muito menos numa prefeita - e ninguém acreditaria se
alguém contasse ter ouvido um ministro da Justiça,
numa solenidade, usar a palavra "veado" para qualificar
uma ofensa.
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