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20/09/2001 - 08h29

Tudo mudou agora? Sim e não

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PAUL KRUGMAN
Colunista do ''The New York Times''

Tudo mudou agora? Sim e não. A atrocidade da semana passada nos abalou e reordenou nossas prioridades. Mas muitas coisas continuam iguais, entre elas o impasse básico da política econômica americana, que de forma alguma desapareceu. Simplesmente se tornou mais tenso.

E se os nossos líderes ignorarem esse dilema ou, o que seria pior, se em retrospectiva parecerem ter tirado benefício político de nosso trauma nacional , pagaremos um alto preço, não apenas economicamente mas em termos de unidade nacional.

O ataque terrorista suspendeu temporariamente o debate a respeito do orçamento que dominava a política apenas dez dias atrás. Ninguém hoje pensa que devemos nos preocupar em equilibrar o orçamento que não envolve a Seguridade Social neste ano ou no próximo.

Mas a verdadeira preocupação nos dias que antecederam o atentado não era o orçamento deste ano ou do próximo. Era a verdade que finalmente se tornou quase impossível de negar, embora alguns tenham tentado argumentar que o corte fiscal provocou o caos em nossas perspectivas fiscais de longo prazo.

Estava ficando claro que não poderíamos pagar programas essenciais do governo e ao mesmo tempo aumentar as reservas financeiras necessárias para pagar benefícios aos futuros aposentados do país.

E o ataque não mudou essa verdade. De fato, a perspectiva fiscal de longo prazo hoje parece bem pior que antes. Um ponto que os mercados de títulos não deixaram de notar, e desde o ataque aumentaram acentuadamente as taxas de juros de longo prazo. A guerra, seja qual for a forma adotada, é uma proposta muito cara.

Então o que devemos fazer especialmente diante da pressão para fazer algo já para reanimar a economia norte-americana?

Primeiro, não devemos causar danos. Se foi irresponsável propor novos cortes de impostos a longo prazo antes da atual crise _e foi_, é ainda mais irresponsável fazê-lo agora.

Mas a economia não precisa de um estímulo? Sim, precisa. Mas precisa do estímulo agora, e não daqui a cinco anos. Deveríamos nos concentrar em medidas que ajudem a economia atual, sem hipotecar ainda mais nosso futuro.

E um corte de impostos temporário? Francamente, é difícil acreditar que esse corte produza muitos gastos adicionais, sobretudo se for principalmente para os bolsos de consumidores afluentes, cujos gastos não são limitados pela falta de dinheiro líquido.

Um corte fiscal para as famílias menos afluentes, como uma redução temporária do imposto sobre salários, poderia ser mais eficaz. Mas, basicamente, devemos nos livrar da idéia de que os cortes fiscais sejam a resposta para todos os problemas.

A melhor maneira de ajudar a economia neste momento é com um grande aumento temporário nos gastos do governo. Esses gastos criariam empregos já, quando precisamos deles, ao contrário de cortes fiscais cujos maiores efeitos surgiriam em 2005 e depois.

E os eventos da última semana deixam claro como gastar o dinheiro. Precisamos reconstruir Nova York. Precisamos de um rápido reforço da defesa nacional, amplamente definido, muito além das questões militares tradicionais, pois certamente a lista de coisas que foram perigosamente negligenciadas não pára na segurança dos aeroportos. E este não é o momento para se debater muito sobre ajudar uma indústria em crise; as companhias aéreas precisam urgentemente de ajuda.

Infelizmente, os líderes do Congresso parecem fixados numa idéia verdadeiramente terrível: um corte permanente nos impostos sobre ganhos de capital.

O impacto econômico dessa medida seria no mínimo incerto. Seu efeito mais óbvio seria incentivar as pessoas a vender ações, fazendo os mercados cair ainda mais. Poderia haver um aumento temporário de rendimentos, enquanto as pessoas vendem ativos, mas no longo prazo o Tesouro perderia grandes somas.

E o simbolismo? Na semana passada o presidente Bush elogiou o país por seu espírito de "sacrifício e patriotismo". Deveria uma das primeiras grandes medidas tomadas em nome do sacrifício nacional compartilhado ser um corte fiscal de valor econômico dúbio, que oferece 80% de seus benefícios diretos aos 2% mais ricos da população?

Poucas pessoas ousariam denunciar isso como oportunismo, numa época em que qualquer um que questione nossa liderança sobre qualquer assunto será acusado de falta de patriotismo.

Mas nos próximos anos, quando o arrocho fiscal piorar, a sensação de que alguns políticos se aproveitaram de nosso trauma para forçar essa medida não ajudará nosso novo sentido de unidade nacional.

Bush pode e deve parar essa idéia desastrosa já. Ele deveria dizer ao Congresso para se concentrar no que o país precisa, e não no que uma minoria rica quer.

*Paul Krugman, economista, é professor da Universidade Princeton

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