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07/11/2001 - 10h47

Bin Laden pode fazer livre comércio avançar

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GUY DE JONQUIÈRES
do ''Financial Times''

Enquanto ministros e funcionários dos mais de 140 países-membros da OMC (Organização Mundial do Comércio) se preparam para sua reunião de cinco dias em Doha, Qatar, no golfo Pérsico, muitos deles se deixam assustar pelo espectro de um forasteiro nada bem-vindo: Osama bin Laden.

Há muita ansiedade quanto à possibilidade de que o encontro, que começa sexta, seja alvo de um ataque terrorista.

No entanto Bin Laden também fez um grande favor, inadvertidamente, à OMC. Os danos econômicos causados pelo ataque de 11 de setembro elevaram os esforços por lançar uma rodada mundial de negociações de comércio _a tal ponto que muitos diplomatas acreditam que um acordo possa ser fechado em Doha.

O novo ímpeto deriva basicamente do medo. Os proponentes de uma rodada argumentam que as negociações globais impediriam surtos de protecionismo _que causam risco para todo o sistema mundial de comércio. Eles também se preocupam com a possibilidade de que um fracasso em Doha seja devastador para a OMC, depois do colapso de sua reunião de Seattle, em 1999.

Uma campanha renovada pela liberalização poderia resultar em ganhos imensos. Um estudo da Universidade de Michigan prevê que a renda mundial subiria em US$ 612 bilhões se as barreiras comerciais fossem reduzidas em um terço. O Banco Mundial estima que o aumento poderia chegar a US$ 2,8 trilhões caso todas as barreiras sejam eliminadas.

Mas identificar barreiras é uma coisa; desmantelá-las, outra. Mesmo que uma nova rodada seja lançada, os muitos obstáculos com que ela irá se deparar tornam o sucesso longe de seguro.

As esperanças de progresso estão em três áreas: agricultura, tarifas industriais e serviços.

Ainda que os subsídios à exportação tenham caído desde o acordo da Rodada Uruguai, em 1994, a OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico) diz que o apoio total dos países ricos à agricultura chegou a US$ 372 bilhões no ano passado, ou 34% da receita agrícola bruta _pouco abaixo da proporção que reinava na metade dos anos 80. E, embora membros da OMC tenham reduzido suas tarifas, muitas delas continuam elevadas, às vezes superando os 500%.

Reduzir essas distorções vai resultar em resistência da parte da UE e do Japão. Além disso, até exportadores de produtos agrícolas supostamente liberais como os EUA e o Canadá discriminam determinadas importações.

Outro problema é que mesmo que as barreiras existente sejam removidas elas podem ser substituídas por novos obstáculos, erigidos em nome dos consumidores, em lugar dos produtores. O risco cresceu pela sucessão de ondas de medo quanto a alimentos contaminados e pelas suspeitas públicas a respeito dos alimentos geneticamente modificados.

As tarifas industriais, alvo principal das rodadas passadas, oferecem muitas oportunidades de corte. Ainda que as tarifas fiquem em uma média de 4% nos países ricos e 15% nos pobres, os tributos sobre determinados produtos são muito mais elevados.

Além disso, embora muitos países tentem impor tarifas baixas sobre matérias-primas como madeira, as tarifas aplicadas a produtos fabricados com elas, como móveis, são muito mais altas.

É possível que uma ameaça ainda maior ao comércio internacional sejam as medidas antidumping, que podem estrangular completamente as importações de determinados produtos. Elas proliferaram desde a crise asiática de 1997, particularmente entre os países em desenvolvimento.

Os serviços _atividade de crescimento rápido na maior parte das economias_ parecem oferecer os maiores ganhos em caso de liberalização. Remover barreiras pode servir também para compensar os aumentos no custo do comércio internacional causados pelos ataques de 11 de setembro.

Mas o impacto dos ataques pode ser duplo. Ele pode estimular as negociações sobre o comércio eletrônico e as telecomunicações, se os problemas recentes do setor gerarem maior consolidação internacional. No entanto ele pode tornar os EUA e alguns outros países ainda mais relutantes quanto a abrir seus mercados de aviação à contratação de maior número de trabalhadores estrangeiros habilitados.

Alguns observadores questionam até que ponto uma rodada poderia contribuir, alegando que os governos até agora não mostraram disposição para liberalizar os mercados de serviços da OMC em ritmo mais rápido do que o planejado originalmente.

De qualquer forma, promessas de liberalização realizarão pouco, a menos que sejam assistidas por regulamentação efetiva que garanta competição leal e mercados internacionais transparentes.

Em termos mais gerais, uma nova rodada teria também de enfrentar pelo menos duas outras fontes de incerteza. Uma delas deriva da forte cisão entre o Norte e o Sul na OMC, cristalizada nas repetidas queixas dos países pobres no sentido de que só os ricos se beneficiaram da liberalização.

Na verdade, são alegações imprecisas. Na última década, as fatias da Europa Ocidental e do Japão no mercado mundial de exportação de produtos caíram bastante em termos de valor, as dos Sudeste Asiático e América Latina subiram e a do México subiu muito mais rápido do que a dos EUA ou a do Canadá. As únicas regiões no geral pobres a perder terreno foram a África e o Oriente Médio.

Mas a determinação dos países em desenvolvimento de expressar suas queixas é um sinal de seu papel crescente na OMC. Eles respondem pela maioria do quadro de membros e estão cada vez mais conscientes do seu poder de barganha e prontos a exercê-lo.

Outra questão envolve o papel da campanha contra a globalização e dos grupos de pressão hostis à OMC. Ainda que o anticapitalismo e o anti-americanismo que embasam boa parte de seus protestos tenham perdido parte de seu apelo popular depois de 11 de setembro, eles continuam a exercer influência política, particularmente nos Legislativos nacionais.

A recente aceleração dos esforços para dar início a uma nova rodada sugere que muitas autoridades estão, pelo menos por enquanto, ignorando os oponentes do livre comércio. Isso cria uma janela de oportunidade em Doha. Mas, se as negociações mundiais se iniciarem, lançar a rodada pode em breve parecer a parte mais fácil do processo.
* Tradução de Paulo Migliacci

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