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10/11/2004 - 09h11

Presidente chinês vem pedir apoio na OMC

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CLÁUDIA TREVISAN
da Folha de S.Paulo, em Pequim

O presidente chinês, Hu Jintao, inicia amanhã pelo Brasil sua primeira visita à América Latina, disposto a obter a concessão do estatuto de plena economia de mercado para a China, o que daria impulso ao esforço do país comunista de ser tratado no cenário internacional pelas mesmas regras aplicadas a seus principais parceiros comerciais.

"O reconhecimento, o mais cedo possível, do estatuto de plena economia de mercado da China pelo Brasil ajudará a acelerar o desenvolvimento do comércio bilateral e dos investimentos, favorecendo o aprofundamento da parceria estratégica entre os dois países", declarou Hu em entrevista por escrito à Folha.

A China está em campanha para obter o reconhecimento como uma economia de mercado, que pode ser dado individualmente pelos países. A partir de seu ingresso na OMC (Organização Mundial do Comércio), em 2001, a China poderá ser considerada por 15 anos como uma economia na qual as regras de mercado não prevalecem. Os países que a reconhecem como uma economia de mercado têm mais dificuldades em aplicar medidas antidumping.

A assessoria do presidente chinês limitou o número de perguntas e pediu a substituição de uma questão que não era diretamente relacionada à visita ao Brasil. As respostas foram entregues ontem, véspera de seu embarque. Só uma pergunta não foi respondida: "Que tipo de lições o Brasil pode tirar do modelo de desenvolvimento chinês?".

Hu deve chegar à Brasília às 17h30 de amanhã, para uma visita de cinco dias, passando por São Paulo e Rio. Depois, irá a Argentina, Chile e Cuba.

Presidente desde março de 2003, Hu atribui parte do sucesso econômico de seu país à "inabalável" determinação com que foram realizadas reformas em direção à economia de mercado e à abertura ao exterior. Lembra que o PIB chinês foi de US$ 147,3 bilhões, em 1978, para US$ 1,4 trilhão, em 2003, e ressalta que o objetivo é chegar a US$ 4 trilhões em 2020. A seguir, a íntegra da entrevista à Folha, a primeira concedida por Hu a um meio de comunicação brasileiro.

Folha - Qual é a importância do Brasil na estratégia internacional da China?
Hu Jintao
- O Brasil é um grande país em desenvolvimento e exerce importante influência nos assuntos regionais e internacionais. A China e o Brasil estabeleceram uma parceria estratégica nos anos 1990, e em 2004 foram comemorados os 30 anos de relações diplomáticas entre os dois países. Durante esse período, com esforços convergentes dos dois lados, as relações bilaterais tiveram pleno desenvolvimento, com efetiva cooperação em todas as áreas.

A parceria estratégica entre a China e o Brasil é um relacionamento de cooperação sincera, baseado na igualdade e benefício mútuos. Ela não corresponde apenas aos interesses fundamentais dos dois países e dos dois povos, mas também favorece a paz e o desenvolvimento mundiais.
Estou na expectativa de me encontrar outra vez com o presidente Lula, para trocar opiniões sobre o aprofundamento da parceria estratégica entre os dois países, e tenho plena confiança em um futuro ainda mais promissor para as relações sino-brasileiras.

Folha - O sr. espera que, durante sua visita, o Brasil anuncie a concessão à China do estatuto de plena economia de mercado?

Hu
- No fim da década de 1970, a China iniciou uma reforma completa em sua estrutura econômica, promovendo constantemente os mecanismos de mercado.

Em 1992, nós anunciamos o objetivo de estabelecer o sistema econômico de mercado, promovendo reformas nessa direção. Em 1993, o desenvolvimento da economia de mercado passou a fazer parte da Constituição chinesa. E, em 2001, a China ingressou na Organização Mundial do Comércio, o que marcou uma nova fase do seu processo de abertura ao exterior e de construção do sistema econômico de mercado.

Nesses 26 anos, a China dedicou todos os esforços para impulsionar a reforma e a abertura, persistindo na direção do sistema econômico de mercado. Atualmente, sob critérios amplamente aceitos pela comunidade internacional, o sistema econômico de mercado já está estabelecido na China.

Existe uma grande complementaridade econômica entre a China e o Brasil, e, portanto, uma grande potencialidade para a cooperação econômico-comercial. O reconhecimento, o mais cedo possível, do estatuto de plena economia de mercado da China pelo Brasil ajudará a acelerar o desenvolvimento do comércio bilateral e dos investimentos, favorecendo o aprofundamento da parceria estratégica entre os dois países.

Folha - Depois da visita do presidente Lula à China, em maio, criou-se no Brasil uma grande expectativa em relação ao aumento de investimentos chineses, mas até agora houve poucos avanços concretos nessa área. A quanto podem chegar os investimentos chineses no Brasil e em que áreas eles se concentrariam?

Hu
- A visita de Estado do presidente Lula à China impulsionou a cooperação econômico-comercial bilateral. Depois dela, empresas dos dois lados laçaram projetos conjuntos nas áreas de ferrovias, siderurgia e energia elétrica, entre outras.

O Brasil é o maior parceiro comercial e um dos principais destinos dos investimentos da China na América Latina. O governo chinês apoia a cooperação econômico-comercial entre empresas dos dois lados, com base nos princípios de igualdade, benefício mútuo e ganhos compartilhados, e encoraja empresas chinesas a investirem no Brasil, instalando fábricas no país.

Acredito que, com o apoio dos dois governos e a participação das empresas, a cooperação mutuamente benéfica entre a China e o Brasil no âmbito de investimentos terá uma nova perspectiva.

Folha - Alguns integrantes do governo brasileiro estão preocupados com o fato de que o comércio entre o Brasil e a China reproduz um padrão similar à relação Norte-Sul, com o Brasil exportando bens primários para a China e a China exportando bens industrializados para o Brasil. É possível mudar esse padrão, considerando o fato de que a China quer do Brasil justamente produtos primários?

Hu
- A China e o Brasil são ambos países em desenvolvimento. A cooperação econômico-comercial entre os dois países já alcançou resultados notáveis e ainda há uma enorme potencialidade a ser explorada.

A contínua ampliação do comércio bilateral e dos investimentos mútuos favorece o desenvolvimento dos dois países. Vemos com satisfação que produtos brasileiros de alto valor agregado, como aviões regionais e autopeças, já entram no mercado chinês.

Em conseqüência do desenvolvimento econômico da China e do Brasil, o comércio bilateral tem boa perspectiva de crescimento e sua pauta tende a se diversificar, com a inclusão de número cada vez maior de produtos.

Folha - A China apóia a pretensão do Brasil de se tornar membro permanente do Conselho de Segurança da Organização das Nações Unidas?

Hu
- A China apóia uma reforma nas Nações Unidas e considera o aumento da representatividade dos países em desenvolvimento prioritário na ampliação do Conselho de Segurança.

O Brasil é um grande país em desenvolvimento e desempenha um importante papel nos assuntos regionais e internacionais. O governo da China valoriza a atuação do Brasil e é favorável a que o país desempenhe um papel ainda mais relevante nas organizações multilaterais, entre as quais as Nações Unidas.

Folha - Quais são as principais razões do desenvolvimento econômicos da China nos últimos 26 anos?

Hu
- Nesses 26 anos, a China promoveu a reforma e a abertura com determinação inabalável. Seu sistema econômico de mercado já está estabelecido em uma fase inicial; uma economia aberta já tomou forma; a força produtiva social e o poderio integral do país vêm aumentando; os empreendimentos sociais avançaram em todas as direções, e a vida do povo em geral deu um salto histórico, passando de um nível no qual havia o suficiente apenas para comer e vestir a um patamar modestamente confortável.

De 1978 a 2003, o PIB da China passou de US$ 147,3 bilhões para US$ 1,4 trilhão, com crescimento anual médio de 9,4%. O comércio exterior saltou de US$ 20,6 bilhões para US$ 851,2 bilhões, um crescimento médio de 16,1% ao ano. Em 2004, a economia está mantendo a tendência de crescimento. Nos primeiros nove meses do ano, o PIB teve expansão de 9,5%, e o valor total do comércio exterior, expansão de 36,7%.

O principal motivo do rápido e sustentado crescimento econômico é que, na busca do desenvolvimento, sempre persistimos nos seguintes princípios: 1) Ter o crescimento econômico como o ponto central e resolver os problemas que surgem em nosso caminho sem interromper o processo de desenvolvimento. 2) Seguir o conceito de desenvolvimento científico, estimulando o desenvolvimento econômico-social abrangente e coordenado. 3) Orientar as reformas para o sistema econômico de mercado socialista, injetando incessantemente energia e vigor no desenvolvimento. 4) Promover a abertura da economia, aproveitando bem os recursos e mercados doméstico e externos. 5) Tratar corretamente a relação entre reformas e desenvolvimento, de um lado, e a estabilidade, do outro, impulsionando as reformas e o desenvolvimento em um ambiente de estabilidade social e, simultaneamente, fortalecendo a estabilidade social por meio das reformas e do desenvolvimento. 6) Sempre considerar o ser humano como o ponto primordial e tomar como objetivo final do desenvolvimento a satisfação das crescentes necessidades materiais e culturais do povo. Procurar constantemente concretizar, defender e desenvolver os interesses fundamentais do povo, encorajando e mobilizando a energia, o espírito de iniciativa e a criatividade da população em geral.

Folha - Quais os principais desafios que a China enfrentará em seu desenvolvimento nas próximas décadas e que tipo de potência o país será no futuro?

Hu
- Nos primeiros 20 anos deste século vamos construir, em todos os campos, uma sociedade razoavelmente confortável, com um nível ainda mais alto, que trará benefícios para o mais de 1 bilhão de cidadãos chineses.

Em termos econômicos, o nosso principal objetivo é quadruplicar o PIB da China em vinte anos, de 2000 a 2020, chegando a US$ 4 trilhões, com um PIB per capita de US$ 3.000. Concluída essa fase, e com trabalho árduo de mais algumas décadas, vamos realizar a modernização até meados deste século, tornando a China um país socialista próspero, democrático e civilizado.

A China vai erguer a bandeira da paz, do desenvolvimento e da cooperação, persistir no caminho do desenvolvimento pacífico e aproveitar os ganhos da cooperação internacional, contribuindo para a paz e o desenvolvimento do mundo. O desenvolvimento econômico-social da China está em boa situação, mas temos consciência de que ele enfrenta alguns problemas, entre os quais a desigualdade entre os setores urbano e rural e entre diferentes regiões do país; a cada vez mais grave falta de recursos naturais e a pressão para a proteção do meio ambiente; a persistência do problema de desemprego, etc.

Diante desse cenário, temos de continuar a dedicar esforços aos ajustes da estrutura econômica, à transformação do modelo de crescimento, à proteção do meio ambiente, à criação de novos empregos e à diminuição das diferenças entre as regiões e entre os setores urbano e rural.

Ao mesmo tempo, temos de nos esforçar para aumentar a competitividade da economia e ampliar a cooperação internacional. Vamos persistir no conceito de desenvolvimento científico, que considera o ser humano como primordial e busca um desenvolvimento abrangente, coordenado e sustentável. Também continuaremos a adotar políticas e medidas efetivas visando a aprofundar as reformas, ampliar a abertura e coordenar todos os setores da sociedade, para impulsionar o rápido e bom desenvolvimento econômico-social do país.

O desenvolvimento da China não corresponde apenas aos interesses fundamentais do povo chinês, mas também favorece a paz e o desenvolvimento do mundo.

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