Universitários constroem casas em favela

MARIANA BERGEL
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA DE S.PAULO


Jovens de classe média de SP atuam em comunidade em Suzano para construir casas mais dignas para famílias carentes. 120 voluntários se reuniram para construir dez casas de madeira, com 18 metros quadrados cada uma, durante um final de semana.

Nascido em uma tradicional família judaica de Curitiba, David Hertz, 35, passou grande parte da juventude em busca de uma receita para sua vida.

Cresceu acompanhando o pai em sua loja de armarinhos. "Minha família é conservadora, e, o mais provável, era que eu seguisse o mesmo rumo", lembra.

A escola, o movimento juvenil e os eventos sociais da adolescência também eram dentro da comunidade judaica local.

Aos 18 anos, porém, foi para Israel, onde viveu num kibutz. "Tive ali a primeira visão de que havia um mundo maior e de que poderia buscar a minha história, seja lá qual fosse ela."

O que era para ser uma viagem de um ano transformou-se em sete. Entre idas e vindas, visitou Tailândia, China, Vietnã, Índia, Inglaterra e Canadá.

Na Tailândia, fez seu primeiro curso de culinária. Na Índia, descobriu o lado ritualístico da gastronomia e, no contato com os ingredientes, um meio de sentir a essência das pessoas.

Mas foi em Toronto, onde trabalhou como entregador de comida, que pensou pela primeira vez em se tornar chef.

"Aos 25, vi que não estava sendo inteiro. Eu era conhecido como aquele que sempre falava que queria fazer uma coisa, mas nunca fazia. E isso me incomodava. Quando me aceitei, tudo começou a acontecer." Mudou-se para São Paulo, cursou a faculdade de gastronomia e logo tornou-se chef do recém-aberto café Santo Grão.

O sabor que buscava, entretanto, só encontrou em 2004, quando foi convidado a desenhar um projeto de cozinha dentro da favela do Jaguaré.

"Ao pisar na cozinha, vi um novo mundo, no qual descobri ser possível colocar todos os meus aprendizados na prática: superação de desafios, contatos pessoais, olhar positivo e, sobretudo, continuar minha busca pela troca de aprendizado." Surgiu, assim, o Cozinheiro Cidadão, que ensinava gastronomia a jovens do entorno.

Mais fermento

Daí em diante, a receita de sua vida, por anos incerta, ficou mais que definida. Com o tempero da gastronomia, selecionou ingredientes como empreendedorismo, protagonismo juvenil, educação, inclusão.

Em um mês, conheceu a Artemisia, rede de apoio a negócios sociais que impulsionou seu projeto. "Estavam procurando jovens com a ideia de montar um negócio social."

Acompanhado da aprendiz Uridéia Costa, que conhecera no Cozinheiro Cidadão, decidiu, em 2005, criar um bufê-escola com formação profissional na prática, geração de renda e replicação de negócios sociais. Saía do forno a Gastromotiva.

"Pela primeira vez, após procurar tanto o que queria fazer da vida, eu estava muito em paz [com a busca]. As coisas vêm na hora em que têm de acontecer."

Hoje, com uma equipe fixa de dez pessoas e 66 aprendizes formados em dois anos, o incansável David ri quando lembra os "32 nãos" que levou -e que continua ouvindo.

Mas não deixa de focar na autossustentabilidade e em adicionar fermento a seu impacto social. "Adoraria inspirar outros negócios a virarem sociais. Ao ajudar as pessoas a encontrar seu caminho, eu me encontrei. Sinto-me muito empoderado."

Entre casas mal-acabadas de alvenaria e barracos improvisados com sucatas, as casas simples montadas pelos voluntários da ONG Um Teto para Meu país são facilmente avistadas no Jardim Gardênia.

A dona de casa Jucélia Pereira da Silva, 29, mãe de cinco filhos -o mais velho tem 13 anos e, a mais nova, 11 meses- conta que está ajeitando uma coisa a cada dia. "Pintei por dentro e agora já posso deixar minha bebê engatinhar. Antes, ela não ia no chão. Não tinha como evitar que ratos andassem por aqui."

Ela deu R$ 50 de entrada da casa nova e, no dia da visita da Folha de S.Paulo, entregou o restante, R$ 100, em um bolinho de notas de R$ 10. "Paguei muito aluguel e sofri muita humilhação por aí. Não acreditava nessas pessoas até ver eles erguendo a minha casa", diz, emocionada.

De certa forma, impressiona o tratamento entre os voluntários e as famílias. "Senti como se estivesse erguendo a minha casa com a minha família", afirma Sônia Maria da Silva, 50, costureira. "Agora, meus parentes parecem estranhos."

Sônia conta que antes seu barraco balançava com o vento, como as árvores. Era seu "ninho de passarinho".

"Vivo mais de milagre e doação do que outra coisa. Meu piso era de terra batida, quando chovia, saia da cama e já pisava na lama", lembra ela, que orgulha-se de ter vendido suas tranças "canecalon" para produzir sabão e vender, trabalho cuja renda foi investida no pagamento da sua nova moradia.

Jesuíta

Um Teto para Meu País foi criado pelo jesuíta chileno Felipe Berríos em 1997. O Brasil é um dos países em que ONG atua, já são 15, todos na América Latina. Ele percorre esses países e desembarcou no Brasil no dia 7 de agosto para visitar as novas moradias construídas em Suzano.

Berríos conta que aqui as casas são mais precárias e que, além do clima, a maior diferença entre o Brasil e os outros países é a proximidade entre pobres e ricos. "Em quase todos os países, os pobres estão separados", comenta.

Aqui, a entidade é coordenada por seis jovens recém-formados, que trabalham recrutando voluntários em universidades, principalmente de engenharia civil e de arquitetura, fazendo o trabalho de "detecção" das famílias mais necessitadas em favelas, angariando recursos e projetando os trabalhos de intervenção nas comunidades carentes.

"Antes de sermos contratados aqui, fomos voluntários em outros países", conta Larissa.

Chile

O Chile foi o laboratório que deu certo, de acordo com Berríos. Lá, a ONG diz ter mudado o cenário que encontrou há 13 anos. "Eram 135 mil famílias oficialmente vivendo em favelas, hoje, são 20 mil", afirma o sacerdote, que estudou construção civil, teologia e filosofia, e diz ter deixado as missões jesuítas por não lhe agradar ajudar só os católicos.

A ONG chilena financia parte do trabalho feito no Brasil, mas o objetivo é que se mantenha com seus próprios recursos.

Felipe Berríos também é Empreendedor Social de Destaque da Fundação Schwab. À frente da organização Um Teto para o meu País, Berríos venceu o concurso chileno em 2005. Acesse www.untechoparamipais.org e saiba mais sobre o projeto.

Quem é empreendedor Social?

É aquele que descobre falhas do setor público ou privado e busca parcerias e recursos financeiros para colocar em prática idéias que provocam mudanças sociais efetivas para a sociedade.

Qual é o perfil de um empreendedor social?

Empreendedores sociais têm múltiplos perfis. Eles podem ser pessoas físicas ou jurídicas e também podem atuar no setor privado.

Se é uma pessoa física, pode, por exemplo, ter descoberto um produto novo que tenha alcançado grande impacto social.

Em caso de pessoa jurídica, o empreendedor social mais comum é o líder de uma ONG. Como não há restrições a empresas que tenham fins lucrativos, o candidato pode também estar à frente de uma cooperativa ou de uma empresa social, desde que predomine o esforço para a criação de valores sociais e ambientais e que o retorno financeiro seja um meio para esse fim.

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