Equilíbrio
13/11/2001

Misterioso tour

LUIZ RIVOIRO
colunista da Folha Online

Foi um final de semana de buscas e descobertas, o do último feriado. Pensando no futuro -como se conseguíssemos deixar de pensar nele em algum momento a essa altura- a Mãe e eu passamos o 2 de novembro percorrendo algumas maternidades de São Paulo. A lista incluía cinco, mas só conseguimos conhecer quatro, já que uma delas exigia agendamento prévio.

Fiquei de mau humor, claro. Afinal, havíamos escolhido o feriado para podermos nos deslocar com mais facilidade. E essa maternidade era justamente a mais distante de casa. Por mim, teria desistido, fácil, mas a Mãe insistiu, e me convenceu a voltar ao local durante a semana para uma visita.

Valeu a pena. Ao lado das outras quatro que já havíamos conhecido (sim, porque nenhum dos dois jamais havia pisado em maternidade alguma de São Paulo), conseguimos montar nosso próprio ranking de preferência, aliviando um pouco o pânico que o assunto inspira em pais de primeira viagem como nós. Afinal de contas será ali (espero), em alguma dessas instituições, que o João vai nascer, meudeusdocéu!

A primeira coisa que se nota ao botar os pés em uma maternidade é a presença de algumas pessoas que só existem naquele universo paralelo ao qual me referi na última coluna: as guias de maternidade.

Jamais imaginei que tal ofício existisse, mas, a julgar pela acirrada concorrência entre os hospitais pelo oportunidade de botar crianças no mundo, as garotas precisam dar duro. Lembrem-se de que, sorrisos e cortesias à parte, há dinheiro em jogo: um parto em qualquer uma dessas maternidades não sai por menos de R$ 5.000. É um bom negócio, levando em conta que algumas delas fazem até 30 partos por dia. Faça as contas.

A primeira guia parecia uma metralhadora. Mal nos cumprimentou, já disparou uma lista interminável de preços e informações sobre o que o convênio médico cobria ou não. "Alguma dúvida? Não? Então vamos continuar..." E lá fomos nós. Visitamos um apartamento, os berçários e vimos onde se localizava o centro cirúrgico e a UTI _esse roteiro, por sinal, foi o mesmo em todas. No hall central, TVs mostravam o mais novo habitante do planeta. Na tela sem som, o bebê se contorceu por seis minutos, tempo suficiente para que os parentes assistissem à atração televisiva. Também é possível colocar a foto do bebê no site da instituição (pra quê?). Pagando, claro.

Ainda atordoado pelo alvoroço, ela se volta para mim e dispara: "Se você quiser filmar o parto, tem uma taxa adicional. Se preferir, também mediante pagamento, temos nossa própria equipe credenciada". Não quero, tampouco prefiro. Nada de vídeo. Fomos embora 20 minutos depois confusos, mas, como era a primeira visita, ainda não tínhamos parâmetro algum de comparação.

Nas outras duas, não muito longe dessa, na região da Paulista, fomos atendidos por enfermeiras e de forma mais pessoal. Senti-me mais seguro e relaxado. Afinal minha idéia de parto não passa necessariamente pelo supermercado. Rapidamente essas duas instituições saltaram à frente no ranking. Tínhamos encontrado o tal parâmetro.

Devidamente influenciada pelas opiniões de várias amigas, a Mãe adentrou o saguão da quarta maternidade disposta a gostar. Mas não foi bem assim. Próxima a uma movimentada avenida na zona sul, pegamos um elevador lotado, fomos teleguiados por corredores escuros e visitamos um apartamento _que definitivamente carecia de mais cuidados_ até chegar ao que mais me impressionou: a UTI neo-natal, bem ao lado do bar. Graças a esse arranjo arquitetônico, o visitante tem a oportunidade única de saborear sua coxinha gordurenta enquanto observa o desempenho dos prematuros em sua luta pela vida. Tocante.

A última visita, como disse no início, não aconteceu no feriado, mas na manhã de quarta-feira. Devidamente agendados, e depois de cruzar a cidade em meio a um trânsito inexistente no dia 2, fomos recebidos pela guia. Fiel ao protocolo, ela nos mostrou as modernas instalações do hospital, falou pouco e, diferentemente das demais, não nos deu nenhuma pastinha com material explicativo. A garota parecia cansada. No fim, os 15 minutos que durou a visita não foram suficientes para levá-la ao topo do ranking.

Missão cumprida, maternidade agora, só quando o João decidir.
Luiz Rivoiro é jornalista, editor-chefe do Núcleo de Revistas da Folha e pai "de primeira viagem". Escreve quinzenalmente na Folha Online, às terças-feiras.

E-mail: lrivoiro@uol.com.br

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