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18/05/2003 - 08h59

Inspirador de "Bicho de 7 Cabeças" perde ação

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FABIANE LEITE
da Folha de S.Paulo

A história do rapaz de 17 anos que, por ter fumado maconha, foi internado à força pelo pai em manicômios levou 450 mil pessoas ao cinema. O garoto torturado por médicos e enfermeiros rendeu prêmio ao ator Rodrigo Santoro. Se tivesse continuação, o filme de 2001 teria de ser uma história de tribunais, com médicos e advogados nos papéis principais.

A batalha jurídica entre hospitais e médicos e o escritor Austregésilo Carrano, 42, cuja história inspirou o filme "Bicho de Sete Cabeças", de Laís Bodanzky, foi o que pautou os eventos do movimento da luta antimanicomial na última semana.

Em 17 de março deste ano, despacho do juiz Marco Antônio de Moraes Leite, do Tribunal de Alçada do Paraná, determinou que Carrano pague R$ 60 mil em honorários aos advogados do Hospital Espírita de Psiquiatria Bom Retiro e do Hospital San Julian, onde esteve internado, e ao defensor do espólio do psiquiatra Alô Ticoulat Guimarães, ex-responsável pelo Bom Retiro.

No próximo dia 23, acontece em Curitiba a primeira audiência de instrução da "ação inibitória", em que o hospital Bom Retiro, a Federação Espírita do Paraná e o psiquiatra Alexandre Sech, atual diretor do hospital, pedem que a Justiça proíba Carrano de mencionar esses nomes em palestras e entrevistas sobre o que viveu na instituição, sob ameaça de pagamento de multa diária.

As vendas do primeiro livro de Carrano, "Canto dos Malditos", que levou Bodanzky a fazer o filme e cujos direitos de publicação foram comprados pela Editora Rocco, continuam proibidas pela Justiça do Paraná.

Sem dinheiro

Passado o sucesso do filme, que levou ao menos 40 prêmios, Carrano diz ter ganho R$ 18,6 mil -a maior parte, segundo ele, gasta com advogados. Como o livro, sua principal fonte de renda, está proibido, ele vive na casa da mãe, na periferia de Curitiba.

"Não sou eu que estou sendo julgado, mas toda pessoa que busca a liberdade de expressão. Coloquei toda a emoção. Escrevi para descrever um sistema cruel, em que os médicos são coniventes", disse Carrano na semana passada, quando foi convidado de vários eventos em São Paulo.

"Estou anestesiado com algo tão vil. É a mesma coisa que alguém ser estuprado e não poder dizer o nome de quem estuprou", afirma.

Em 1998 Carrano entrou com ação indenizatória na Justiça do Paraná para que os dois hospitais, a federação e os dois psiquiatras lhe pagassem R$ 10 milhões de indenização em razão de supostos erros de diagnósticos médicos que o levaram às internações.

Pedido prescrito

A Justiça do Paraná considerou que o pedido de Carrano estaria prescrito, usando o argumento jurídico de que direitos pessoais não podem ser reivindicados passados mais de 20 anos dos fatos que motivam a cobrança. Também entendeu que o prazo deveria ser contado a partir de 1976, quando o pai de Carrano o emancipou. Os honorários de R$ 60 mil são cobrados porque Carrano perdeu a ação.

A defesa do escritor argumenta que, como Carrano estava internado, foi emancipado à sua revelia, num período em que estava sob guarda das instituições e não poderia ser considerado capaz. Defende ainda que o prazo deveria ser contado a partir do momento em que Carrano se
estabilizou e conseguiu publicar o livro, em 1989.

"O que mais nos surpreendeu é que ele tenha sido internado em um hospital de adultos sendo que por lei, desde 1934, menores com indicação de tratamento nessa área psíquica só podem ser internados em estabelecimentos a eles destinados", afirma a advogada Suzana Angélica Paim Figueiredo, que, com o advogado e deputado federal Luiz Eduardo Greenhalgh (PT), assumiu o caso recentemente.
 

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