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06/07/2003 - 04h51

Arte-terapia ajuda a superar doenças

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FABIANE LEITE
BERTA MARCHIORI

da Folha de S.Paulo

A arte é "uma fada que transmuta", escreveu Manuel Bandeira, "e transfigura o mau destino." A capacidade transformadora e terapêutica da pintura, escrita, música, dança e outras são propagadas também na medicina e psicologia. Mas faltava base científica para sustentar o discurso.

O assunto foi acolhido no último Congresso Mundial de Psiquiatria, em 2002, e estudos mais amplos já o investigam.

Os primeiros resultados de uma pesquisa inédita realizada pelo projeto de arte-terapia do Instituto de Psiquiatria (IPq) do Hospital das Clínicas de São Paulo, por exemplo, dão força à mensagem do poeta. "A arte-terapia trouxe a melhora de sintomas", relata a psiquiatra e arte-terapeuta Carmen Lúcia Albuquerque de Santana, coordenadora do projeto de arte-terapia do IPq. "Houve transformação do conceito que as pessoas tinham delas mesmas. Uma mudança de identidade."

Os dados são da avaliação dos 60 pacientes por semana atendidos no serviço, criado há seis anos. Os mais antigos foram acompanhados por cinco anos pela equipe. A análise final foi realizada por meio de entrevistas.

O estudo, tese de doutorado de Santana, só termina no próximo ano. Mas já é possível dizer que por meio da arte pacientes contornaram dificuldades de comunicação, diminuíram a ansiedade e aumentaram a autoconfiança. "Minha timidez diminuiu e meu relacionamento social melhorou. Estou mais calmo e brigo menos, respondo menos. Eu não abria a boca e agora consigo conversar, até aconselho meus colegas", relatou um dos adolescentes de 13 a 17 anos avaliados em outro estudo qualitativo feito no IPq, com 16 pacientes depressivos, coordenado pela psicóloga Marilia Yokota.

Segundo ela, todos recebiam medicação havia dois anos, mas a melhora não era suficiente -sobravam sintomas e sua adaptação social era considerada insatisfatória até começarem a arte-terapia. "Não há paciente que não se beneficie", afirma Santana.

"Sinto tudo de feliz", diz Michelli Aparecida Pereira, 12, que faz arte-terapia na AACD (Associação de Assistência à Criança Deficiente) de São Paulo.

A idéia e a prática não são novas. Freud estabeleceu as bases da arte-terapia no início do século passado, ao ver na arte uma forma de expressão do inconsciente. Jung iniciou a aplicação da arte como terapia. No Brasil, Osório César, no Hospital do Juqueri, de São Paulo, e Nise da Silveira, no Centro Psiquiátrico D. Pedro II, no Rio, desenvolveram uma série de experiências com pacientes psiquiátricos, como explica o livro "A Arte Cura?", coordenado pela psicóloga Maria Margarida de Carvalho.

Terapeuta é essencial

"Pessoas com problemas emocionais muitas vezes não têm palavras para expressá-los. A expressão artística provê essa possibilidade. Se fazem um desenho, conseguem comunicar um estado da alma. É um fio que ajuda a entrar em contato", explica a psicóloga e arte-terapeuta Selma Ciornai, fundadora e coordenadora do curso de especialização em arte-terapia do Instituto Sedes Sapientiae de São Paulo.

A arte é o mediador que coloca em contato paciente e psicoterapeuta. É esse profissional a essência dessa prática terapêutica. Ajudará quem sofre a decodificar símbolos, gestos, palavras. A linguagem artística é uma ferramenta no processo, portanto.

Diferentemente da arte-educação, na arte-terapia não há preocupação específica com a técnica, estética e conhecimento de movimentos artísticos. Arte-terapia também não tem nada a ver com terapia ocupacional --em que a atividade em si é o foco: por exemplo, um determinado trabalho manual que favoreça a recuperação do membro.

Ciornai explica possíveis desdobramentos do processo criativo. "Quem sofre de depressão tem a sensação de que não há saída. Na hora em que cria, há uma repercussão: quem cria na arte, cria na vida", afirma. "Expressão artística não serve só para liberar o que está doendo, mas também para soltar fantasias e utopias, a possibilidade de uma vida diferente."

A psicóloga e arte-terapeuta Mônica Guttmann, 40, estimula seus pacientes a criar histórias. Por meio da maneira como ele constrói a narrativa e segundo os símbolos usados é possível conhecê-lo, diz. É na história que surgem indicações de caminhos para resolver o problema.
 

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