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26/10/2003 - 09h01

Solteira precisa reaprender a encontrar par

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CLÁUDIA TREVISAN
da Folha de S.Paulo

Os percalços que as mulheres bem-sucedidas próximas dos 30 anos enfrentam para encontrar um parceiro com quem viver e ter filhos refletem a falência dos sistemas tradicionais de corte amorosa e a ausência de um novo modelo que os substituam. A tese é defendida pela norte-americana Barbara Dafoe Whitehead, 58, que há quase três décadas se dedica ao estudo da família e dos relacionamentos entre os dois sexos.

Perdidas em uma busca solitária, sem regras e instituições que as orientem, mulheres solteiras repetem em todas as grandes cidades do Ocidente: "Não há mais homens". O lamento serviu de inspiração ao livro "Porque Não Sobraram Homens Bons", de Whitehead, que acaba de ser lançado no Brasil.

Apesar do título, a autora conclui que eles existem, mas não podem ser encontrados da mesma maneira que as mães das atuais solteiras encontraram seus maridos. As três instituições que tinham destaque na aproximação entre homens e mulheres --escola, família e igreja-- perderam importância nesse terreno e não surgiu nada no lugar.

"A difícil situação amorosa da nova mulher solteira de hoje em dia é resultado da crise contemporânea no mundo dos encontros e das uniões", diz o livro. A saída é o uso de novas tecnologias, como a internet, e de serviços de aproximação de solteiros.

Autora de livros sobre família e divórcio e diretora do centro de pesquisa "Projeto Nacional do Casamento", Whitehead deu entrevista por telefone à Folha:

Folha - Não sobraram bons homens ou as mulheres não sabem onde encontrá-los?

Barbara Dafoe Whitehead
- A segunda afirmação é mais correta, mas as mulheres expressam sua frustração em relação à impossibilidade de encontrar um parceiro dizendo "eu desisto, não sobraram homens bons". É uma idéia popular. Não é verdade que não sobraram homens bons. O problema é encontrar o homem certo no momento certo da vida. E isso se mostra muito difícil para mulheres jovens, instruídas, simpáticas e atraentes.

Folha - E há alguma saída?

Whitehead
- Há novas abordagens para encontrar o marido perfeito. Um dos caminhos é usar a tecnologia moderna e serviços comerciais para buscar um parceiro. Uma das coisas importantes que aconteceu no mundo da corte amorosa é que as três grandes instituições que antes ajudavam homens e mulheres a se encontrar com o objetivo de se casar e ter filhos eram a família, a escola e igrejas. E nenhuma dessas instituições têm um papel importante hoje em ajudar as pessoas a encontrar parceiros adequados.

Mulheres estão olhando para a tecnologia e novos serviços que estão no mercado, tentando novas abordagens, mas não há uma grande resposta que vá funcionar de maneira efetiva. Estamos em um período de transição.

Folha - A internet pode ser a nova instituição para o encontro?

Whitehead
- Eu tenho um pouco de dúvidas. A internet já se institucionalizou como opção para expandir as possibilidades de encontro entre homens e mulheres. Mas sou cética porque é algo sujeito a muita decepção. As pessoas não dizem a verdade sobre quem elas são e como se parecem. Elas normalmente se apresentam com mais cabelo e menos peso do que têm, e também como sendo mais jovens. Homens também se dizem disponíveis e algumas vezes são casados ou já têm um relacionamento com outra mulher.

Em sistemas anteriores, era possível conhecer mais sobre uma pessoa por meio de amigos, vizinhos, a comunidade. As pessoas são deixadas sozinhas na tarefa de encontrar alguém com quem ter uma corte amorosa. Não há muitas instituições envolvidas nisso. É um processo solitário e isolado.

Folha - A sociedade deveria ter um papel mais importante?

Whitehead
- Todas as sociedades têm um papel em proporcionar o encontro entre pessoas tendo em vista o casamento e filhos. Todas as sociedades têm o que podemos chamar de "sistema de acasalamento". Acho que seria muito inusual uma sociedade dizer que não se importa com isso ou que homens e mulheres devem cuidar disso completamente sozinhos.

Folha - O que diferencia a mulher solteira com educação superior da do passado?

Whitehead
- Em primeiro lugar, ela tem uma educação mais sofisticada que à das solteiras do passado. É capaz de trabalhar e ganhar dinheiro sozinha e, por isso, pode ficar longe de sua família, se assim quiser. Ela se vê como sexualmente liberada, tem amantes, pode decidir viver com um namorado e não depende do casamento para seu bem-estar econômico.
Algumas pessoas acham que esse é um retrato negativo, mas as mulheres que eu entrevistei e que se encaixam nesse perfil são charmosas, dedicadas, muito atraentes, com grandes conquistas e, ao mesmo tempo, boas e doces. Não é um retrato ruim como às vezes aparece na mídia popular.

Folha - E por que essas mulheres não conseguem encontrar um homem para estar com elas?

Whitehead
- Temos de olhar isso de uma perspectiva histórica e entender que mudou o que as mulheres esperam de um companheiro para o casamento. Passou do perfil de um bom provedor econômico para um homem que tenha mais qualidades emocionais, seja capaz de se comunicar e tenha profunda empatia emocional com a mulher.

De certa maneira, as mulheres precisam do que os homens sempre quiseram, que é um parceiro que as apóie. Algumas dessas características são as que os homens buscam em uma esposa. E mulheres estão procurando por esse tipo de apoio emocional, além de fidelidade na relação. E eles não foram necessariamente socializados para dar essas coisas. Então há um choque entre o que as mulheres esperam para ser felizes em um casamento e o que os homens são capazes de dar.

Folha - Não é uma ironia que no pós-feminismo mulheres que conseguiram tudo o que as mulheres queriam se sintam frustradas porque não têm um homem?

Whitehead
- É uma consequência não planejada do esforço das mulheres de terem igualdade com os homens no mundo público e do trabalho. Ninguém realmente esperava que as mulheres iriam sentir falta de algumas das coisas mais tradicionais.

Eu cresci durante o movimento de liberação feminina e me lembro que a idéia era que as mulheres deveriam renegar o casamento e não ter filhos para ter sucesso nos estudos e no trabalho. Querer casar e ter filhos era considerado uma falta de ambição.

Hoje eu vejo mulheres bastante ambiciosas que querem intimidade, romance, casamento e filhos. É uma mudança de gerações. As mulheres que conquistaram carreiras, que era o sonho que suas mães nem sempre puderam realizar, estão agora olhando para o que suas mães tiveram.

As mulheres estão percebendo que ao lado de se dedicar a estudar e iniciar suas carreiras aos 20 anos, elas não podem se esquecer do outro objetivo, que é encontrar alguém com quem dividir a vida.

Não é possível achar que o amor vai aparecer em um momento mágico, porque não é assim que as coisas acontecem.

Folha - No livro a sra. parece mais otimista em relação à internet.

Whitehead
- Sou otimista porque é um das inovações que responde às tendências que eu descobri. É uma tecnologia que se adequa bem ao padrão de trabalho e vida ocupada que as pessoas têm. Independentemente de eu achar que vai funcionar ou não, estou convencida de que terá um papel importante. Mas outras coisas vão surgir. O movimento global é uma mudança de família, escola, igreja e comunidade para o mercado e novas tecnologias.

Folha - Além da internet, que outras tecnologias podem ser úteis?

Whitehead
- Há todas as formas de inovações que estão sendo lançadas comercialmente. Pessoas que trabalham como consultores de corte amorosa, que cobram preços altos por seus serviços e treinam pessoas para se apresentar, como flertar, como atrair o sexo oposto, onde ir para encontrar essas pessoas.

Há clubes de encontro e eventos sociais que tentam aproximar pessoas solteiras. E há livros, colunas, jornais, revistas que dizem a pessoas solteiras onde devem ir para encontrar outras pessoas solteiras, há muita coisa sobre estratégias. Há uma explosão de livros de aconselhamento e de autores que têm estratégias profissionais de conquista, sistemas que pessoas podem adotar com o objetivo de encontrar um parceiro.

Folha - Quanto tempo vai durar essa transição?

Whitehead
- Pode levar uma geração. As mulheres que eu descrevo são parte de uma mudança generacional. Os que estão crescendo na geração mais jovem, atrás dos jovens adultos de hoje, devem ter algo mais sólido e seguro ou pelo menos mais consciência de como as coisas mudaram.

Não sei o quanto as mulheres bem-sucedidas que entrevistei assumiram que, apesar de serem muito diferentes de suas mães na vida profissional, teriam o mesmo padrão de corte amorosa que elas, e achariam o homem de seus sonhos quando decidissem casar. O que estão vendo é que isso não funciona. Meninos e meninas de hoje talvez tenham mais consciência disso no futuro.

Folha - Homens solteiros não enfrentam os mesmos problemas?

Whitehead
- Os homens dizem que sim. Uma das respostas populares de homens ao livro tem sido dizer "eu quero casar e não sobraram boas mulheres". Mas há uma diferença: os homens podem adiar o casamento e ter parceiras diferentes por mais tempo sem se preocupar em ter filhos.

Folha - Que conselho a sra. daria a mulheres bem-sucedidas que querem encontrar alguém?

Whitehead
- O livro não é sobre conselhos, mas todos me pedem. Repetiria o que digo a minhas filhas. A maioria das mulheres vai encontrar alguém com quem queiram casar. É importante não desanimar e não levar a uma nova relação desapontamentos de um relacionamento fracassado. Seja otimista, sociável, aproveite a vida e não entre em pânico sobre encontrar ou não um homem bom.
 

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