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13/03/2008 - 09h03

Congestionamentos podem causar estresse, varizes, dor na coluna e problemas respiratórios

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IARA BIDERMAN
Colaboração para a Folha de S.Paulo

Chegamos à marca de 6 milhões de veículos na cidade de São Paulo. No mundo, já há um bilhão, segundo dado divulgado pela Organização Mundial da Indústria Automobilística na quinta-feira passada, 6/3. Onde vamos parar? Já paramos. Logo após a indústria automobilística anunciar a chegada à casa do bilhão, a cidade de São Paulo vivia o sétimo recorde de congestionamento em 15 dias: na terça-feira, 11/3, foram registrados 186 km de vias congestionadas.

Enquanto isso, entre a primeira e a segunda marcha e vários minutos com o câmbio no ponto morto, o corpo sofre os efeitos do caos urbano. Mas nem sempre os motoristas percebem todas as conseqüências das horas passadas em congestionamentos.

Sergio Luis Horta, 41, convive com o trânsito desde os 13 anos -quando começou a ajudar seus pais no trabalho com transporte escolar. Ao tirar a carteira de habilitação, ele assumiu o posto no volante e, até hoje, segue uma rotina que começa às 5h, quando sai de casa com sua moto para pegar o veículo escolar na garagem, e termina por volta das 20h, depois de entregar a última criança em casa. Ele sabe que as 15 horas rodando pelas ruas de São Paulo afetam de diferentes maneiras seu organismo, mas os efeitos do trânsito ainda podem pegá-lo de surpresa.

"Comecei a sentir dores no joelho, mas levei seis meses para descobrir que elas eram causadas por ficar muitas horas sentado no carro", conta Sergio, que descobriu o motivo de suas dores na época das férias escolares -foi só parar de enfrentar o trânsito diário que elas sumiram. Para driblar o problema, ele adaptou o modo de sentar e evita fazer movimentos bruscos com as pernas.

Mas nem tudo é contornável. "Estou sempre com o pescoço e os ombros retesados e doloridos. Já fiz acupuntura, fisioterapia, mas não adianta. Já aprendi a conviver [com a dor]." A tensão na base do pescoço também causa dores de cabeça, outro sintoma crônico.

Por causa de sua profissão, Sergio é quase uma bula dos efeitos colaterais do trânsito. Além das dores musculares, nas articulações e na cabeça, é comum ficar com os olhos irritados, principalmente nos dias mais poluídos. E, de um ano para cá, começou a sentir irritação na garganta.

O efeito do trânsito que Sergio consegue driblar melhor é o estresse. Apesar das dores de cabeça e nas costas, ele dá um jeito de manter a calma mesmo nos dias mais críticos, ignorando xingamentos, buzinas e outras "delicadezas" comuns entre os motoristas da cidade. Para conseguir isso, pratica uma atividade esportiva regular, o futebol. E, sempre que chega do trabalho, fica pelo menos cinco minutos sozinho, em total silêncio, no seu quarto. Outra medida adotada foi esquecer o carro nos fins de semana: "Só uso a moto ou vou de ônibus. Mesmo se preciso ir a algum lugar com toda a família, minha mulher e minha filha vão de carro e eu me encontro com elas depois".

Momentos de pânico

Nem todo mundo administra bem o estresse. "Vendi meu carro! Não suporto o trânsito", dispara a publicitária Yeda Timerman, 31. A história de ódio começou em 2004, quando Yeda ficou presa em um congestionamento na zona sul de São Paulo e teve uma crise de pânico. "Comecei a sentir falta de ar, secura na boca, o cinto de segurança me sufocava", lembra a publicitária, que teve de descer do automóvel e pedir ajuda na primeira loja que viu. O peculiar, no caso de Yeda, é que ela só tem as crises de pânico nas situações em que está dentro de um carro, parada por causa do famoso "excesso de veículos".

Yeda afirma que as pressões do trabalho não a afetam e que não tem medo de dirigir. "Se for para viajar, pegando uma estrada vazia, está tudo ótimo." Para ela, a única solução para o seu problema é não dirigir em locais com muito trânsito. Como precisa se deslocar do Pacaembu, zona oeste de São Paulo, onde mora, até a Vila Olímpia, na zona sul, onde fica o seu trabalho, procura horários alternativos e vai de carona ou de táxi --uma forma de se distrair, conversando ou lendo algo. Mesmo assim, em uma ocasião em que estava em um táxi e o tráfego estava especialmente ruim, sentiu a crise se aproximar.

Ao sair do trabalho, Yeda caminha até a estação ferroviária Berrini e vai de trem até a estação Hebraica-Rebouças, próxima ao clube onde ela pratica natação. As horas na piscina diminuem o estresse e permitem que Yeda só volte para casa (de carona) quando o trânsito já está fluindo.

O estresse crônico é o mais citado efeito do trânsito na saúde. "Presa no trânsito, a pessoa sofre um desgaste emocional muito grande. Isso pode se manifestar sob a forma de violência, o que, além do risco de causar danos a terceiros e à própria pessoa, cria mais um fator de tensão", diz Dirceu Rodrigues Alves Jr., chefe do departamento de medicina ocupacional da Abramet (Associação Brasileira de Medicina de Tráfego). Além de fomentar o aumento da violência, a equação trânsito/estresse pode ser o gatilho de distúrbios variados.

O mestre-de-obras Gilberto Alves, 56, não tem dúvidas sobre a causa de seu diabetes, diagnosticado há alguns anos. "É o trânsito da cidade que está acabando com a minha saúde." Apesar de o diabetes ser uma doença multifatorial, Gilberto diz que o médico avaliou que a origem de seu problema foi o estresse emocional. E, para Gilberto, estresse é igual a trânsito. "É a [estrada] M'Boi Mirim, [avenida] 23 de Maio, Washington Luiz, Radial Leste, tudo parado, motoqueiro berrando, um carro colado no outro. Demoro pelo menos duas horas, às vezes até mais de três, para voltar para casa."

Gilberto também se queixa de dores na coluna e cãibras na perna. Diz não ter tempo nem ânimo para praticar uma atividade física e só pensa na hora em que poderá se mudar. "Se Deus me ajudar, vou sair de São Paulo e arranjar emprego em outra cidade. É a única solução para melhorar a minha saúde."

As dores nas costas e nas pernas de Gilberto são outros efeitos comuns do trânsito. Além do fato de o motorista ficar sentado por muito tempo, os movimentos repetitivos causam fadiga muscular e desgaste das articulações. Quem não dispõe de direção hidráulica corre mais risco de ter problemas na coluna. "A direção mecânica gera um esforço muito grande e pode causar danos às regiões lombar e cervical da coluna, além de afetar ombros e braços", diz Alves Jr., da Abramet.

A direção hidráulica, que exige menos dos músculos, pode ajudar, mas não evita todos os problemas. "Os movimentos repetitivos para mudar de marcha, por exemplo, podem causar lesões tendinosas nos punhos, nos cotovelos e até nos ombros", diz Alves Jr.

A farmacêutica Gildete Oliveira, 34, sabe bem do que o médico está falando. Ela gasta cerca de duas horas para ir ao trabalho e outras duas para voltar para casa. "Depois de um ano fazendo esse trajeto, desenvolvi uma bursite (inflamação na região dos ombros). Fora a tendinite, que é propiciada pelas atividades que exerço, mas que piora ao dirigir por muitas horas."

Por causa desses problemas, Gildete agora vai de ônibus fretado para o trabalho. O tempo passado dentro do ônibus, no trânsito, continua o mesmo, mas nos ombros a diferença é notável. "Sem dirigir, não sinto nada. Mas, se guio por dois ou três dias consecutivos, tenho de tomar antiinflamatório."

Nos membros inferiores, os movimentos de frear, acelerar e pressionar a embreagem podem desgastar as articulações dos tornozelos. Nessa área do corpo, porém, os efeitos mais notáveis são os problemas circulatórios.

"As pernas podem inchar, ficar doloridas. A posição também piora os efeitos das varizes", diz Walter Campos Jr., angiologista e cirurgião vascular do HC (Hospital das Clínicas) da USP (Universidade de São Paulo) e do Instituto H. Ellis, de São Paulo. A utilização de meias elásticas atenua o problema.

Procurar sair do carro e movimentar as pernas também é recomendado, especialmente quando a perspectiva é ficar muito tempo parado. Campos Jr. lembra que ficar sentado com as pernas encolhidas por mais de cinco horas é arriscado. "Em algumas pessoas, pode até levar à trombose venosa profunda", diz.

Poluições

Um problema que atinge tanto os motoristas quanto os pedestres é a poluição sonora causada pela combinação dos ruídos de motores e do uso insistente e excessivo das buzinas. "Hoje, considera-se como limite a exposição a até 85 decibéis por oito horas. No horário de pico, chega-se facilmente a 90 decibéis. Parece pouco, mas, a cada cinco decibéis, a quantidade de pressão sonora dobra", diz Ektor Onishi, coordenador da campanha nacional de saúde auditiva da Sociedade Brasileira de Otologia.

A exposição a níveis excessivos de ruído pode levar à perda auditiva. Também causa sintomas como o zumbido no ouvido. "Como efeito do excesso de ruído, os sintomas mais comuns são dor de cabeça crônica, pressão alta, insônia e problemas gastrointestinais", enumera Onishi.

Como usar protetores auriculares é proibido pela legislação de trânsito, fechar as janelas do carro é o que resta para os motoristas.

Janelas fechadas também diminuem a exposição à poluição atmosférica, outra fonte de problemas de saúde que tem relação direta com o números de carros nas ruas. Nesse caso, os pedestres são os mais atingidos. A poluição gerada pelos veículos causa uma série de problemas no aparelho respiratório, como sinusite e bronquite asmática, além de irritação nos olhos e nas mucosas.

Um alerta de Alves Jr., da Abramet, é que o recurso de fechar as janelas pode levar a um outro problema. "A maioria das pessoas se esquece de fazer a limpeza e a manutenção do ar-condicionado, que costuma ser acionado quando o carro está todo fechado. Sem limpeza periódica, os condutos do aparelho servem como meio de cultura de microorganismos, como vírus e bactérias, que podem causar infecções e alergias respiratórias", diz o médico, que recomenda manutenção e limpeza do aparelho a cada três meses.

 

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