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14/02/2002 - 08h57

Presentes nos alimentos, fitoquímicos podem prevenir doenças

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GABRIELA SCHEINBERG
free-lance para a Folha

O conceito proferido pelo pai da medicina há 2.500 anos e relegado ao esquecimento por um bom tempo agora retorna fortalecido. "Permita que o alimento seja o seu medicamento e que o medicamento seja o seu alimento", disse o filósofo grego Hipócrates (460-322 a.C.).

Duas descobertas trouxeram esse conceito à tona. A primeira foi a des-coberta das vitaminas, por volta de 1900. A segunda, e recente, foi a constatação de que muitos alimentos possuem substâncias, batizadas de fitoquímicos, que são capazes de prevenir doenças como câncer e problemas cardiovasculares.

"Descobriu-se que consumir os nutrientes já estudados pela ciência não é o suficiente. É preciso algo mais, algo que existe em abundância em quase todos os vegetais e que é importante para a regulação do equilíbrio do organismo", diz a professora-doutora em nutrição Rebeca C. de Angelis, que lança no próximo mês o livro "Importância de Alimentos Vegetais na Proteção da Saúde" (ed. Atheneu).

"Estamos vivendo a segunda era de ouro da nutrição", diz Claudia Juzwiak, nutricionista da Universidade Federal de São Paulo. O conceito de prevenir doenças por meio da alimentação deu até origem a uma nova linha de estudo que os pesquisadores chamam de nutracêutica. Sua tarefa é avaliar a ação dos fitoquímicos, que engloba redução de risco de doenças, melhoria da saúde e aumento do bem-estar do indivíduo.

Matar a fome oculta
"Os fitoquímicos defendem as células do corpo, as quais estão constantemente sofrendo ataques, seja do meio ambiente, da alimentação inadequada ou da própria genética", explica De Angelis. A essa necessidade do organismo em receber proteção contra doenças por meio dos fitoquímicos a nutricionista chama de fome oculta (título de um de seus livros). É uma fome que você não sente, por isso oculta, mas de algo de que o corpo precisa, explica ela.

"Está provado. Quando as pessoas comem esses alimentos, a incidência e a prevalência das doenças degenerativas caem", diz De Angelis. E mais: com a "vantagem de não apresentarem efeitos colaterais e de terem um baixo risco de toxidade em altas doses", diz Elizabeth Torres, engenheira agrônoma da Faculdade de Saúde Pública da USP e co-autora do livro "Alimentos em Questão" (ed. Ponto Crítico).

O benefício dos fitoquímicos é consequência, em grande parte, de sua ação antioxidante no organismo, bloqueando o excesso de radicais livres, compostos que podem danificar as células e acelerar o envelhecimento.

Poder da framboesa
A nutracêutica possibilitou descobrir quais alimentos ajudam a prevenir quais doenças. Hoje sabe-se, por exemplo, que a fruta que possui a maior ação antioxidante é a framboesa, pois contém altas taxas de fenol, fitoquímico que ajuda a evitar doenças como câncer, derrame e problemas cardíacos. E os temperos, afirmam os cientistas, possuem uma ação antioxidante maior do que frutas e verduras. Orégano é o campeão deles.

Segundo estudo de janeiro passado, feito pelo Departamento de Agricultura dos Estados Unidos, o orégano tem uma ação 42 vezes maior que a da maçã. Uma colher de chá da erva já apresenta ação protetora no organismo. Se combinada com óleo, é ainda mais potencializada, o que só confirma que uma bela pizza regada a azeite é uma boa pedida.

Apesar de sua ação antioxidante ser inferior a do orégano, a maçã não deve ser abandonada da dieta. Seus fitoquímicos reduzem a taxa de LDL, o colesterol ruim, que acumula gordura nos vasos sanguíneos, podendo causar infarto. Os benefícios do consumo diário de duas maçãs ou 340 g de seu suco foi observado apenas seis semanas após a sua adoção na dieta, segundo estudo da Universidade da Califórnia em Davis, nos EUA.

Outros fitoquímicos, como as catequinas, encontradas no chá preto, ajudam a reduzir a incidência de doenças cardíacas, segundo um estudo holandês que acompanhou os pacientes durante dez anos. Consumidores vorazes de chá preto apresentavam metade do risco de morrer de um problema cardíaco do que homens que não ingeriam a bebida.

Comparar a dieta de populações de diferentes partes do planeta com a incidência de doenças também indica a estreita relação entre cardápio e saúde.

Os franceses, por exemplo, apresentam baixa incidência de problemas cardíacos, apesar da dieta rica em gorduras e carboidratos. Após intensas pesquisas na região, descobriu-se que o consumo de vinho tinto, cujas uvas contêm poderosos fitoquímicos, é responsável pela proteção da saúde da população francesa.

Outra constatação: o chá verde ajuda a prevenir doenças cardíacas, conforme estudos que indicam a baixa incidência desse problema em países como o Japão e a China, onde a bebida é consumida em larga escala. Outro aliado dos orientais é o "wasabi" (raiz-forte), que previne a formação de coágulos sanguíneos e até asma. Recentemente, descobriu-se que o condimento também evita cárie, graças a um fitoquímico chamado isotiocianato, que interfere na aderência da bactéria no dente.

Carne e câncer
A nutracêutica identifica também malefícios de certos alimentos. Dietas ricas em carne vermelha dobram o risco de câncer de estômago e elevam em 3,6 vezes o aparecimento de câncer no esôfago. Outro produto que pode prejudicar o organismo é a batata. Segundo nutricionistas da Universidade Harvard, nos EUA, quando uma pessoa consome batata, o amido, por meio de uma série de reações, reduz a taxa de colesterol bom, o HDL, o que é capaz de aumentar o risco de problemas cardíacos.

Muitos alimentos ricos em fitoquímicos já fazem parte da dieta de pessoas que sequer desconfiam dos seus efeitos benéficos. No entanto outros precisam ser incluídos. Uma informação que pode ajudar a identificar fitoquímicos ausentes do cardápio é a de que eles, muitas vezes, são responsáveis pelo gosto amargo ou azedo de certos alimentos, como repolho, mostarda, espinafre, chocolate amargo e vinho tinto. "Nesse caso, o truque", diz Adam Drewnowski, da Universidade de Washington, nos EUA, "é adotar os padrões da dieta mediterrânea, valendo-se de sal e azeite para reduzir o gosto amargo". Mas há alimentos ricos em fitoquímicos, como tomate, cenoura e frutas, que não têm o gosto afetado, acrescenta a nutricionista Juzwiak.

Carrinho colorido
Outra garantia de que, durante as compras, você está colocando fitoquímicos no carrinho: observe a cor dos alimentos, diz Andrea Galante, diretora da Associação Paulista de Nutrição. A maior parte dos fitoquímicos são responsáveis pelo colorido. Um exemplo: o licopeno, fitoquímico associado à prevenção do câncer de próstata, é responsável pela cor avermelhada do tomate, da cenoura e da abóbora. Já a luteína é um fitoquímico que confere aos vegetais a cor verde.

Outra recomendação: priorize alimentos in natura, em detrimento dos industrializados e dos suplementos alimentares -em ambos os casos, a ação protetora do fitoquímico pode ser afetada. Cozinhar demasiadamente um alimento também pode prejudicar os efeitos, especialmente no caso do alho e do brócolis.

Descobrir os que possuem ação preventiva é apenas parte do trabalho da nutracêutica. A dosagem ideal de consumo está sendo calculada. Afinal as recomendações em vigor atualmente levam em consideração a deficiência do nutriente no corpo, mas não a sua ação protetora.

"Novas recomendações estão sendo estipuladas por comitês norte-americanos", afirma Juzwiak.

Algumas orientações já são conhecidas. Por exemplo: ingerir quatro colheres de sopa de soja três vezes por semana já ajuda a prevenir doenças como o câncer de mama. O ômega 3, ácido graxo que ajuda a reduzir a incidência de problemas cardíacos, pode ser obtido comendo peixes como salmão duas a três vezes por semana. Já a quantidade ideal do consumo de leites acrescidos de ômega 3 beira o inviável: "Só apresentam ação protetora se forem consumidos de um a dois litros por dia", diz Galante.

Tantas pesquisas e tantos estudos comprovam o que os avós sempre disseram cheios de convicção: "É preciso comer de tudo". E com moderação.

Leia mais:

  • Dieta protege contra doenças e pode definir comportamentos

  • Conheça as propriedades de alguns alimentos


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