20/02/2005
Ciências da saúde: Vantagem de acadêmico é escapar de repetição
Colaboração para a
Folha
Embora mestrado acadêmico e doutorado foquem a carreira de ensino e pesquisa, na área da saú de essas necessidades não se restringem mais às universidades. O Estado e as empresas privadas também precisam hoje de capacitadores e pesquisadores.
Por isso a pós-graduação stricto sensu tem ferrenhos defensores, mesmo em medicina. "Ou o médico acompanha as pesquisas de ponta ou ele vai apenas receitar o que os laboratórios indicam e repetir os tratamentos que aprendeu com outras pessoas", diz Luiz Fernando Lima Reis, diretor da pós-graduação do Hospital do Câncer e membro do Instituto Ludwig de Pesquisa do Câncer. "No hospital, nossa pesquisa é focada em como o paciente pode ser beneficiado o mais rapidamente possível pelo conhecimento gerado lá dentro", afirma ele.
Ainda não há, no entanto, unanimidade sobre o assunto. Para Mário Saad, coordenador do comitê de medicina do CNPQ, não vale a pena, para quem quer trabalhar em consultório ou hospital, enveredar para o stricto sensu. "A residência [especialização], nesse caso, é suficiente", diz.
"Mais de 90% dos formados são absorvidos nas instituições de ensino superior públicas. O segundo grande campo são os institutos de pesquisa e depois vêm os laboratórios e a indústria. A pós não é voltada para a área clínica", diz Nestor Schor, professor titular de medicina e pró-reitor de pós-graduação e pesquisa da Unifesp.
Já quem pretende ir para a indústria farmacêutica, diz ele, fica mais competitivo com um doutorado. "Hoje é muito importante formar doutores para oferecer à indústria e favorecer a inovação."
A administração hospitalar também exige conhecimento cada vez mais sofisticado, afirma
Fernando Carneiro, presidente da consultoria de RH Spencer Stuart. "Um hospital tem de ser ao mesmo tempo centro de socorro e hotel, com atendimento de qualidade. Nos últimos anos foi crescente a preferência por gestores com mestrado e doutorado", diz.
Multidisciplinar
Cada vez mais multidisciplinar, o campo da saúde pode encampar também uma gama de outras carreiras. O programa de oncologia do Hospital do Câncer, por exemplo (que obteve, ao lado da neurologia da USP de Ribeirão Preto, a primeira nota 7 concedida pela Capes na subárea de medicina), admite alunos não médicos.
"O câncer não pode ser abordado de maneira específica. A fonoaudiologia é importante para quem teve câncer na boca, por exemplo. Nosso objetivo não é tratar o câncer, mas o paciente." Por isso, diz ele, existe um campo enorme de profissionais que podem gravitar em torno do programa (psicólogos, fonoaudiólogos, e enfermeiros, por exemplo).
O professor Carlos Alberto Tomáz, coordenador da Secretaria de Pós-Graduação em Ciências da Saúde da UnB (Universidade de Brasília), é da mesma opinião. Para ele, é necessário haver profissionais das mais variadas áreas do saber no ramo. "Até engenheiro pode atuar na área de saúde. Mas só em universidades grandes, principalmente as públicas, os programas de pós contemplam essa diversidade", critica.
Segundo ele, nesses programas os alunos aprendem a ter uma visão mais multidisciplinar. Exemplo: o odontólogo recebe noções sobre epidemiologia.
Polêmica
Apesar da polêmica sobre a vantagem de um título de mestre ou doutor na área, quem tem necessidade de trocar idéias, volta às aulas mesmo assim. A dentista Priscila Corraini, 24, está fazendo mestrado em periodontia na USP.
No início, seu principal objetivo era se aprofundar na área. Logo começou a dar aulas e tomou gosto pela docência. "Agora pretendo fazer doutorado", conta a dentista, que diz ter encontrado, na volta às salas de aula, uma maneira de evitar ficar presa apenas ao consultório. "Na universidade, você tem oportunidade de trocar idéias. Além disso, a especialização é boa para o currículo", avalia.
Produção científica
Maior entre as grandes áreas avaliadas pela Capes, com 19,8% dos programas (360), o campo das ciências da saúde é hoje tam bém o de maior expressão no Brasil em número de artigos publicados em veículos internacionais, segundo o ranking do ISI (sigla, em inglês, do Instituto para a Informação Científica), que indexa as revistas e periódicos científicos mais importantes do mundo.
"A produção científica brasileira vai muito bem", comemora o médico Jair Mari, um dos representantes da área na Capes. A avaliação, no entanto, está entre as mais rigorosas, conta Mari.
Dos programas de excelência, apenas três obtiveram 7 no último triênio, todos em São Paulo (oncologia no Hospital do Câncer, neurologia na USP de Ribeirão Preto e odontologia na USP).
"O 7 na saúde é difícil de ser atingido porque exigimos cada vez mais empenho dos programas, para que eles fiquem próximos dos internacionais."