02/04/2005
Igreja pode discutir "aposentadoria" do papa após morte de João Paulo 2º
da
Folha Online
Os avanços da medicina e a delicada condição de saúde do papa João Paulo 2º podem colocar a Igreja Católica em meio a um dilema: a impossibilidade de substituir o atual sucessor do apóstolo Pedro numa situação em que ele não possa renunciar de modo próprio, como por exemplo, em estado de coma.
Reuters |
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João Paulo 2º esforça-se para ajoelhar em missa no Vaticano |
Tradicionalmente, a posição é considerada vaga no caso de renúncia expressa do papa e de sua morte física. A perda da razão, no caso de uma doença mental, também é considerada motivo para a vacância do cargo.
Até para ser considerado morto, a Igreja Católica tem uma regra antiga: os cardeais chamam o papa três vezes por seu nome de batismo. Se não houver resposta pela terceira vez, o papa é declarado morto e o posto, vago. Nos tempos modernos, o médico também é chamado para emitir seu pronunciamento oficial.
A "aposentadoria" não existe para o papa. A instituição, caracterizada pelo caráter monárquico e absolutista, mantém ainda o princípio da infabilidade papal.
Papas renunciam, embora não o façam com muita frequência: o último a renunciar por vontade própria foi Celestino 5º, que deixou o posto em 1294. O papa Gregório 12 abdicou a contragosto em 1415, quando havia mais de um papa.
O problema: a medicina moderna criou as condições para que um ser humano permaneça em estado vegetativo por muitos anos, com as faculdades mentais reduzidas ao mínimo. Um estado que impossibilita a instituição da renúncia, somente aceita por expressa vontade do papa.
O cardeal argertino Jorge Mejía, recentemente, sugeriu que a igreja deve esperar por uma iniciativa do papa, um ato de sua própria consciência, para renunciar, caso julgue incapacitado de prosseguir com suas atividades.
A questão é que João Paulo 2º pode julgar essa decisão como algo próprio da esfera divina. Ele sublinhou em seu último livro que é apenas um "servo inútil" de Deus, que suas ações são meras obrigações perante Ele.
Para religiosos, tal situação pode configurar um quadro claro de "crise institucional", que vai forçar a igreja a discutir questões como a duração do mandato papal e as condições em que o titular do cargo pode manter-se na posição. Nesse caso, o tema da "aposentadoria papal" deixaria seu lugar de tabu.
Especial
Leia o que já foi publicado sobre os problemas de saúde de João Paulo 2º