14/04/2005

Nigeriano apóia diálogo entre religiões e pode ser 1º papa comprovadamente negro

CLARICE SPITZ
da Folha Online

Jerry Lampen/Reuters

Francis Arinze: cardeal nigeriano, líder da Igreja na África

O cardeal nigeriano Francis Arinze, 72, amigo próximo de João Paulo 2º e influente na hierarquia da Igreja Católica, pode se tornar o primeiro papa comprovadamente negro a chefiar a Santa Sé.

Nascido em 1º de Novembro de 1932 em Eziowelle, leste do Estado de Onitsha, na Nigéria, Arinze foi batizado somente aos nove anos. Filho de um chefe tribal, passou a freqüentar aos 15 anos o seminário em Nuewi. Concluiu os estudos religiosos em 1950, em Enugu. Em 1958, foi ordenado padre em uma cerimônia realizada em Roma.

Especialista em islã, Arinze liderou de 1985 a 2002 o Conselho Pontifício para o Diálogo Inter-religioso, o que o torna um bom candidato para os que acreditam que a igreja deva continuar o trabalho de João Paulo 2º, que foi o primeiro papa a entrar numa mesquita e numa sinagoga.

Para alguns analistas, a exemplo do polonês, que enfrentou o comunismo, Arinze seria um papa com condições de enfrentar a expansão do islamismo, a religião que mais cresce no mundo.

Rápida ascensão

Na Nigéria, de 1961 a 1962, Arinze lecionava liturgia e filosofia no Seminário de Enugu quando foi nomeado secretário regional para a educação Católica na região oriental da Nigéria. No ano seguinte, foi transferido para Londres, onde se formou em pedagogia em 1964.

Em 1965, ele foi escolhido padre titular da igreja de Fissiana e nomeado bispo-auxiliar da Arquidiocese de Onitsha. No mesmo ano foi consagrado bispo da arquidiocese. Somente dois anos depois Arinze já era arcebispo. No ano de 1982, foi eleito vice-presidente para União da Sociedade Bíblica da África .Sua rápida ascensão foi consolidada em 1985, quando foi nomeado por João Paulo 2º o mais jovem cardeal no mundo.

Considerado cordial, é conhecido por circular com desenvoltura pela Cúria Romana. Conservador, apoiou João Paulo 2º em suas posições contra o aborto, os anticoncepcionais e a ordenação de mulheres. Atualmente é prefeito da Congregação para o Culto Divino e a Disciplina dos Sacramentos do Vaticano.

Críticas ao aborto

Em 2004, durante as eleições presidenciais, o cardeal nigeriano disse que a comunhão deveria ser negada a políticos católicos que são a favor do aborto. A declaração teve como objetivo atingir o então pré-candidato democrata à presidência dos Estados Unidos John Kerry, que havia se manifestado a favor da intervenção.

Ao ser questionado se um padre deveria recusar a comunhão a Kerry, por causa de sua posição favorável à interrupção da gravidez, Arinze disse ‘sim‘.

‘Merecemos um presidente que entenda que os direitos das mulheres não são armas políticas‘, rebateu Kerry durante um comício.

Caso seja eleito, Arinze não será o primeiro papa africano. Segundo os registros do Vaticano, três africanos ocuparam a posição: Vitor 1º (189-199), Melquíades ou Militiades (311-314) e Gelásio (492-496), que nasceu em Roma, mas tinha ascendência africana.

No entanto, a Igreja Católica não tem registros sobre a raça dos mais de 200 papas que já comandaram o posto máximo desde Pedro e não se pode afirmar com segurança se houve papas negros.

Mário Sérgio Cortella, 51, professor titular de Teologia da PUC-SP, diz acreditar na existência de papas negros. ‘O cristianismo nasce numa região de não-brancos, a Palestina. Jesus de Nazaré não era branquinho de olhos azuis como afirmam nos filmes de Hollywood‘, afirma.